Cozinhando Discografias: The Smiths

/ Por: Cleber Facchi 04/03/2013

Por: Bruno Leonel e Cleber Facchi

The Smiths

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A seção Cozinhando Discografias consiste basicamente em falar de todos os álbuns de um artista ignorando a ordem cronológica dos lançamentos. E qual o critério usado então? A resposta é simples, mas o método não: a qualidade. Dentro desse parâmetro temos uma série de fatores determinantes envolvidos, que vão da recepção crítica do disco no mercado fonográfico, além, claro, dentro da própria trajetória do grupo e seus anteriores projetos. Vale ressaltar que além da equipe do Miojo Indie, outros blogs parceiros foram convidados para suas específicas opiniões sobre cada um dos trabalhos, tornando o resultado da lista muito mais democrático e pontual.

Na segunda edição de 2013, voltamos diretamente para meados da década de 1980, resgatando toda a discografia de estúdio do grupo inglês The Smiths. Com apenas quatro discos, a banda coleciona um riquíssimo acervo em coletâneas lançadas posteriormente ao fim do grupo. Entretanto, como a proposta do nosso especial se concentra em analisar apenas os trabalhos oficiais de estúdio, alguns registros como Hatful Of Hollow (1984), Louder Than Bombs (1987) e Singles (1995) ficaram de fora.

Aviso: Não concordou com a ordem dos discos? Simples, mantenha a calma e use os comentários. Aproveite para indicar qual banda você gostaria que estivesse na próxima seção.

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#04. Meat is Murder
(1985, Rough Trade)

Depois de um número impressionante de shows no circuito independente e vários singles lançados, os Smiths pareciam finalmente ter superado sua inexperiência inicial e isso se refletiu em Meat is Murder, segundo disco lançado em fevereiro de 1985. Mostrando uma maior criatividade musical e trabalhando com temáticas mais politizadas do que na estreia – há desde críticas à monarquia inglesa em Nowhere fast até canções em prol dos direitos dos animais como a faixa título -, o disco apresenta maior ecletismo musical da banda, experimentando novas sonoridades e estruturas em suas canções. Foi também o momento no qual a banda passou a soar mais coletiva, apresentando performances inspiradas de cada um de seus integrantes. O disco abre com a poderosa The Headmaster ritual segundo o próprio Marr, uma das faixas que a banda mais levou tempo para finalizar. Aparecem referências de Rockabilly em Rusholme Ruffians além do rock enérgico de What She said com um bom desempenho do baterista Mike Joyce. Há uma levada de funk na contagiante Barbarism Begins at Home na qual o baixista Andy Rourke é responsável por um dos grandes momentos do disco. That joke isn’t funny Anymore uma das mais belas canções já gravadas pelo grupo apresenta diversas camadas sonoras e guitarras sobrepostas à violões criando uma verdadeira parede sonora. A produção da faixa parece algo à frente de seu tempo, e sem dúvida, inspirou uma verdadeira escola de outras bandas que viriam nos anos seguintes.

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The Smiths

#03. The Smiths
(1984, Rough Trade)

O disco lançado em 1984, e que apresentou ao mundo a parceria Johnny Marr e Morrissey, trazia um apanhado de canções emocionais e envolventes. As letras de Moz desde o começo foram um caso a parte, surgia ali um compositor que deixava de lado os vencedores e glórias heróicas para falar sobre histórias de perda, solidão e mágoa que tanto povoavam a vida de pessoas comuns. O álbum traz desde clássicos como Hand in Glove até estruturas musicais sofisticadas como Pretty Girls Make Graves. A gravação do álbum foi conflituosa. De início, foram registradas 14 faixas com o produtor Troy Tate, e a banda ficou empolgada com o resultado. Entretanto, com o passar do tempo, e também devido a sugestões do produtor John Porter, acharam o disco inadequado para o lançamento. Logo, descartaram o material todo e gravaram-no novamente sobre o comando de Porter, o que resultou em uma sonoridade mais cristalina. Após as gravações com Porter, Morrissey continuou descontente com o resultado. No entanto, devido às despesas com a produção do disco, não houve volta, e a gravadora afirmou que o mesmo seria lançado. Mesmo com todas as dificuldades de uma produção conturbada e a aparente falta de confiança do grupo em algumas faixas, a estreia já mostrava um banda com grande potencial artístico, sendo que seu devido reconhecimento parecia ser apenas questão de tempo.

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The Smiths

#02. Strangeways, Here We Come
(1987, Rough Trade)

Último registro em estúdio antes do dissolvimento da banda, Strangeways, Here We Come continua de maneira coesa com o que o grupo havia aprimorado um ano antes durante o lançamento de The Queen Is Dead (1986). Ainda que recheado por composições essencialmente sombrias e encaixes instrumentais que passeavam pela música Folk, Pós-Punk e demais referências musicais da época, com o quarto disco os Smiths pareciam cada vez mais interessados em lidar com o pop. Registro mais comercial de toda a carreira da banda, o álbum tem suas marcas bem estabelecidas não apenas dentro do universo do grupo inglês, mas em outros registros mundo afora, entre eles If You’re Feeling Sinister (Belle and Sebastian) e Boxes (The National). Por se afastar parcialmente da proposta firmada no trabalho que o precede, SHWC possibilita ao quarteto inglês a chance de experimentar instrumentalmente. Dessa forma, Johnny Marr adere os exageros da década de 1980 de forma cuidadosa em Paint A Vulgar Picture, sobrecarrega de forma assertiva Death Of A Disco Dancer com sintetizadores, e preenche Last Night I Dreamt That Somebody Loved Me com arranjos de cordas e climatizações dolorosas capazes de transportar Morrissey para o grupo dos grandes cantores da década de 1960. Ainda hoje definida como a obra mais “exótica” da banda, o álbum – ilustrado pela foto de Richard Davalos – parece encerrar a carreira do grupo, bem como toda a produção musical da década de 1980.

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The Smiths

#01. The Queen Is Dead
(1986, Rough Trade)

A dor habita cada instante do terceiro registro em estúdio do quarteto inglês. Menos “político” e raivoso que o antecessor Meat Is Murder (1985), The Queen Is Dead parece concentrar tudo o que o grupo havia testado desde o debut em 1984: um ambiente à meia luz que cresce de acordo com as melancolias e confissões amargas de Morrissey. Se por um lado os vocais sombrios e a sonoridade abafada construída por Johnny Marr servserviram para dar vida a clássicos como There Is A Light That Never Goes Out e I Know It’s Over, por outro lado o uso exato de guitarras pop e o encaixe brando dos temas possibilitaram o crescimento de novas tendências dentro do registro. Caso de The Boy With The Thorn In His Side (uma das composições mais copiadas no rock indie da década de 1990) e a inteligente Frankly Mr Shankly, uma crítica bem humorada ao dono da Rough Trade (gravadora da banda), Geoff Travis.

Longe dos exageros e cores neon que predominavam na música da época, com o terceiro álbum os Smiths assumem um direcionamento ainda mais sóbrio do que o testado nos primeiros discos. Cada faixa parece abastecer o que será utilizado na composição seguinte, resultando em um composto musical de forte proximidade, porém, de nítidas especificidades e marcas sonoras. Enquanto Bigmouth Strikes Again (com uma letra que ataca a imprensa britânica) lida com um peso maior nas guitarras, a bem humorada Vicar In A Tutu reforça a incorporação da música de raíz, preferência posteriormente aprimorada em  Strangeways, Here We Come (1987). Tão atual quanto na época do lançamento, The Queen is Dead é ainda hoje a maior obra já lançada pelo grupo, além de ser uma dos registros mais influentes de toda a história da música. Sombrio e “preditivo” – vide a teoria que Morrissey teria anunciado a morte da Princesa Diana anos antes -, o disco marca o ápice da produção inglesa nos anos 1980, sendo o princípio da invasão britânica que tomaria conta do mundo logo no início da década seguinte.     

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.