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Crítica

Arooj Aftab

: "Vulture Prince"

Ano: 2021

Selo: New Amsterdam

Gênero: Jazz, Pós-Rock, Folk

Para quem gosta de: Sufjan Stevens e Sigur Rós

Ouça: Mohabbat e Saans Lo

8.0
8.0

Arooj Aftab: “Vulture Prince”

Ano: 2021

Selo: New Amsterdam

Gênero: Jazz, Pós-Rock, Folk

Para quem gosta de: Sufjan Stevens e Sigur Rós

Ouça: Mohabbat e Saans Lo

/ Por: Cleber Facchi 20/05/2021

Feche os olhos por alguns segundos e deixe que Arooj Aftab conduza sua experiência. Cantora e compositora que nasceu no Paquistão, mas hoje reside na região do Brooklyn, em Nova Iorque, a multi-instrumentista faz de cada fragmento da atmosférica Baghon Main, composição de abertura em Vulture Prince (2021, New Amsterdam), um precioso exercício de apresentação e domínio criativo. São incontáveis camadas instrumentais que ora transportam o ouvinte para o ambiente à meia-luz de um clube de jazz, efeito direto de contrabaixo destacado de Petros Klampanis, ora apontam para um território de essência transcendental, produto direto das orquestrações pontuadas por motivos orientais e paisagens minimalistas que se revelam ao público em uma medida própria de tempo.

É partindo desse mesmo direcionamento estético que Aftab, dona de outros dois ótimos trabalhos de estúdio, Bird Under Water (2014) e Siren Islands (2018), conduz a experiência do ouvinte até o fechamento da obra. E isso fica ainda mais evidente na segunda composição do disco, Diya Hai. Acompanhada do dedilhado labiríntico de Badi Assad, proposta que faz lembrar de nomes como Yasmin Williams e William Tyler, a canção adota uma atmosfera essencialmente densa e poucas vezes antes vista nos antigos registros da artista. São movimentos instrumentais que surgem e desaparecem durante toda a execução da faixa, sempre acompanhados pelos versos cantados em urdu, como uma ponte entre as vivências recentes da musicista e a própria herança cultural e familiar.

Nada que se compare ao preciosismo explícito em Inayaat. Faixa mais extensa do disco, a canção de quase oito minutos nasce como uma combinação de tudo aquilo que existe de mais interessante no som produzido por Aftab. Sem necessariamente mergulhar em um gênero específico, a artista vai do jazz ao pós-rock, da música oriental ao neoclássico em uma estrutura sempre detalhista e mágica, valorizando cada colaborador que surge em momentos estratégicos ao longo da faixa. É o caso da harpista Maeve Gilchrist, personagem central da composição que ainda se abre para o violino de Darian Donovan Thomas, parceiro da artista na já citada Baghon Main, o piano torto de Klampanis e as ondas volumosas que são sopradas pelo flugelhorn da australiana Nadje Noordhuis.

Interessante perceber em Last Night, quarta faixa do disco, uma propositada fuga do restante do álbum. Mesmo partindo de uma abordagem íntima do bloco inicial do registro, a canção estabelece no diálogo com elementos do reggae um importante componente de ruptura. Tudo gira em torno da combinação entre a guitarra de Bhrigu Sahni, o baixo de Mario Carrillio e a bateria espaçada de Jorn Bielfeldt. Instantes em que Aftab garante ao trabalho um importante respiro, como um aquecimento para o material entregue minutos à frente, na já conhecida Mohabbat. Pouco menos de oito minutos em que a musicista paquistanesa convida o ouvinte a mergulhar em um universo de ambientações psicodélicas e quebras instrumentais que se completam pela percussão de Jamey Haddad.

Essa mesma riqueza de detalhes, porém, partindo de uma orientação ainda mais contida, acaba se refletindo na música seguinte, Saans Lo. Com letra de Annie Ali Khan (1980 – 2018), escritora paquistanesa e amiga de Aftab, a canção de essência melancólica transporta o álbum para um novo território criativo. São ambientações contidas que se completam pelo uso das guitarras atmosféricas de Kenji Herbert e sintetizadores de Shahzad Ismaily, componentes que potencializam a voz densa da artista. Difícil não lembrar do som produzido pelo Sigur Rós, em Ágætis Byrjun (1999), produto direto das maquinações pontuais de Herbert e uso instrumental das vozes, proposta que não apenas envolve, como conforta o ouvinte em uma nuvem de sons deliciosamente acolhedores.

Posicionada no fechamento do disco, Suroor funciona como uma síntese conceitual de tudo aquilo que a artista busca desenvolver ao longo da obra. Partindo da mesma fluidez rítmica impressa em Last Night, porém, utilizando dos temas orquestrais que definem o restante do álbum, a canção mostra a capacidade de Aftab em transitar por entre estilos, mesmo preservando a própria identidade criativa. São fragmentos instrumentais e poéticos que incorporam de maneira ainda mais detalhista tudo aquilo que a cantora busca desenvolver desde a introdutória Baghon Main. Instantes em que a musicista paquistanesa não apenas resgata parte da atmosfera e temas incorporados durante a produção de Bird Under Water e Siren Islands, como deixa o caminho aberto para os futuros registros.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.