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Críticas

James Blake

: "Assume Form"

Ano: 2019

Selo: Polydor

Gênero: R&B, Soul, Eletrônica

Para quem gosta de: Sampha e Jamie XX

Ouça: I'll Come Too, Power On e Don't Miss It

8.5
8.5

Crítica: “Assume Form”, James Blake

Ano: 2019

Selo: Polydor

Gênero: R&B, Soul, Eletrônica

Para quem gosta de: Sampha e Jamie XX

Ouça: I'll Come Too, Power On e Don't Miss It

/ Por: Cleber Facchi 23/01/2019

“Você está apaixonado?”, pergunta James Blake em um dos momentos de maior entrega e confissão romântica em Assume Form (2019, Polydor). Ainda que o questionamento pareça dialogar com os sentimentos e experiências do próprio ouvinte, do momento em que tem início, na autointitulada música de abertura (“Quando você me toca, eu me pergunto: ‘o que você quer comigo?’“), até alcançar a derradeira Lullaby For My Insomniac (“Vou ficar acordado também / Eu prefiro ver tudo como um borrão amanhã“), declarada homenagem à namorada Jameela Jamil, atriz em The Good Place, cada elemento do presente álbum se relaciona diretamente com as principais emoções e vivências recentes do produtor britânico.

A principal diferença em relação aos últimos trabalhos do cantor, principalmente o extenso The Colour in Anything (2016), está no sutil distanciamento da poesia melancólica que há tempos parecia orientar as canções do músico inglês. “Eu pensei que poderia estar melhor morto, mas eu estava errado / Eu pensei que tudo poderia desaparecer, mas eu estava errado / Eu pensei que nunca encontraria o meu lugar, mas eu estava errado … Vamos para casa falar merda sobre todo mundo / Vamos para casa, finalmente“, canta de forma libertadora em Power On, composição que celebra a força transformadora de um novo relacionamento de forma positiva, quase sorridente.

De fato, cada nova composição em Assume Form revela ao público um artista transformado, como uma criativa desconstrução da imagem triste que vem sendo projetada por Blake desde o início da carreira. “Vou dizer o que precisar / Se isso for a última coisa que eu tiver que fazer / Eu aceito, eu aceito, eu aceito … Não tenho nada a perder / Com você, com você, com você / Eu estou nesse tipo de humor“, se entrega em I’ll Come To, um exercício de pura confissão em que aceita deixar tudo para trás para se manter junto da mulher amada. Instante em que o músico inglês resgata a essência poética e exageradamente romântica do R&B produzido nos anos 1960, porém, em uma linguagem reformulada, quase futurística, vide Can’t Believe the Way We Flow.

Mesmo nos poucos momentos em que se permite desabar emocionalmente, como na já conhecida Don’t Miss It, Blake mantém firme a consistência e sobriedade na composição dos versos. “Quando você sai com a sua pessoa favorita todos os dias / Quando a dor maçante vai embora / Não perca / Quando você deixa de ser um fantasma em uma concha / E todo mundo continua dizendo que você parece bem / Não perca / Como eu fiz“, aconselha em uma amarga reflexão sobre o peso de um relacionamento fracassado. É como se o músico britânico deixasse para trás velhos tormentos, abrindo passagem para a trilha romântica que se revela logo na faixa de abertura do álbum — “Agora você pode sentir tudo / Não ficou mais claro?“.

A própria decisão de Blake em estreitar a relação com diferentes nomes do (novo) pop/R&B sintetiza parte da transformação em torno da obra. São nomes como Travis Scott e Metro Boomin, na climática Mile High; a voz forte de Moses Sumney, em Tell Them; André 3000 (Outkast) e a poesia delirante que invade Where’s the Catch?. Mesmo Barefoot in the Park, colaboração com Rosalía que mais parece uma sobra de El Mal Querer (2018), está longe de desagradar. A própria produção do disco se abre a todo momento para a breve interferência de nomes como Allen Ritter (Kanye West, Drake), Dre Moon (Beyoncé, Future) e Dominic Maker (Mount Kimbie) alguns dos principais articuladores da música negra e eletrônica inglesa.

Evidente ponto de transformação na carreira do cantor, Assume Form aproxima o som produzido pelo músico britânico de um universo de novas possibilidades e temas acessíveis, por vezes comerciais, proposta que em nenhum momento interfere no permanente amadurecimento poético e instrumental do artista. Trata-se de uma obra menos complexa, porém, tão sensível e expressiva quanto qualquer outro registro entregue pelo músico nos últimos anos – como o excelente Overgrown (2013). Uma inesperada ode ao amor e frações de breve sorriso que durante tanto tempo foram sufocados por James Blake.


Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.