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Crítica

BaianaSystem

: "OxeAxeExu"

Ano: 2021

Selo: Máquina De Louco

Gênero: Dub, MPB, Reggae

Para quem gosta de: Curumin, Criolo e Nação Zumbi

Ouça: Reza Forte, Monopólio e Criado Mudou

7.8 / 7.0 / 7.5
7.8 / 7.0 / 7.5

BaianaSystem: “Navio Pirata” / “Recital Instrumental” / “América do Sol”

Ano: 2021

Selo: Máquina De Louco

Gênero: Dub, MPB, Reggae

Para quem gosta de: Curumin, Criolo e Nação Zumbi

Ouça: Reza Forte, Monopólio e Criado Mudou

/ Por: Cleber Facchi 16/04/2021

Em um ano de isolamento, sem Carnaval, ouvir o som produzido pelo BaianaSystem ganha novo significado. Não por acaso, o coletivo baiano decidiu investir em um formato diferente para apresentar ao público o sucessor do elogiado O Futuro Não Demora (2019). Intitulado OxeAxeExu (2021, Máquina De Louco), o registro de 20 faixas e pouco menos de 60 minutos de duração se divide em três atos específicos de sabor agridoce. Composições que funcionam como uma fuga breve da realidade, sempre festivas e ensolaradas, mas que a todo momento regressam ao cenário de pandemia, caos político e social. A mesma dualidade explícita nas canções de Duas Cidades (2016), grande obra do grupo de Salvador, porém, partindo de uma abordagem completamente distinta.

Sem a pandemia, esse álbum não existiria“, comentou Russo Passapusso, vocalista da banda, em entrevista ao Correio Braziliense. “São reflexões sobre coletividade e o que podemos fazer para sair da situação que vivemos hoje“, completa. E isso se percebe logo na primeira leva apresentada pelo BaianaSystem. Partindo da benção nas introdutórias Reza Forte e Raminho, o grupo completo por Roberto Barreto, SekoBass, Junix 11 e o produtor Daniel Ganjaman mergulha na montagem de um repertório essencialmente político, marca do contestador Navio Pirata. Canções regidas pela criativa colagem de ritmos que tradicionalmente definem a obra do coletivo, porém, nunca descartáveis, refinamento bastante evidente no ragga de Monopólio. “Dia de quarentena, ninguém vai na capela / Por favor, me dê / O nome de quem manda na quadrilha pra eu saber“, dispara.

Esse mesmo direcionamento, porém, partindo de uma base soturna, acaba se refletindo no ato seguinte da obra, Recital Instrumental. Enquanto as letras das canções evidenciam a força do discurso do BaianaSystem, como em Criado Mudou (“A cara do criado mudo nego olhando pra você / Será que tem que ter dinheiro pra te convencer / Que o sete palmo é inevitável“), musicalmente o trabalho transporta o ouvinte para um novo território criativo. São batidas densas, pianos e momentos de maior melancolia, conceito reforçado na derradeira Guerra Batalha. Claro que isso não interfere na produção de músicas deliciosamente ensolaradas, como em Rádio África e principalmente da introdutória Tubarão, faixa que resgata o que há de mais acessível no som produzido pelo grupo.

Interessante perceber em América do Sol, terceiro ato do trabalho, uma síntese conceitual de tudo aquilo que o BaianaSystem busca desenvolver ao longo da obra. Musicalmente diverso, o registro chama a atenção pela colorida sobreposição de ritmos e referências que distanciam o coletivo da atmosfera local dos antigos trabalhos. Como o título do material aponta, trata-se de um passeio pela América Latina, direcionamento reforçado nas duas composições assinadas em parceria com Claudia Manzo, Pachamama e Capucha. Mesmo a colaboração com Thiago França, na curtinha Reza Frevo, uma releitura da já citada Reza Forte, reflete a busca do grupo baiano em ampliar os próprios domínios criativos, tratamento bastante explícita nas canções de O Futuro Não Demora.

Tamanha pluralidade de ideias faz de OxeAxeExu um exercício talvez confuso como obra, mas que funciona no isolamento de suas canções. Difícil não se deixar conduzir pela letargia de O Que Não Me Destrói Me Fortalece, música que se abre para a chegada de Céu, ou mesmo na poesia esperançosa de A Vida É Curta Pra Viver Depois, bem-sucedido encontro com Carolaine. São justamente esses diálogos com diferentes colaboradores que tornam a experiência de ouvir o trabalho tão satisfatório. Das rimas de BNegão, em Reza Forte, passando pelo time seleto de instrumentistas que acompanham o coletivo baiano em estúdio, cada composição cresce no compartilhamento de informações e elementos que transitam por diferentes campos da música de forma sempre curiosa.

Com base nessa estrutura, natural pensar em OxeAxeExu como um rito de passagem para os futuros lançamentos da banda. Partindo da fragmentação em três atos específicos, o grupo garante movimento à obra, transitando por entre ritmos, colaboradores e bases instrumentais de forma a incorporar diferentes abordagens criativas. “O três como numeral e simbolismo, além de representar o sagrado, abre a percepção da realidade como um caminho diferente da dualidade, lados opostos, sim e não, que tem sido a tônica dos últimos tempos“, resume o texto de apresentação do trabalho. São ideias que se cruzam a todo instante, como uma soma de tudo aquilo que o coletivo havia testado anteriormente, porém, pontuado por momentos de maior experimentação e busca por novas possibilidades.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.