Image
Crítica

Beth Gibbons

: "Lives Outgrown"

Ano: 2024

Selo: Domino

Gênero: Art Pop

Para quem gosta de: Beth Orton e PJ Harvey

Ouça: Reaching Out e Floating on a Moment

8.5
8.5

Beth Gibbons: “Lives Outgrown”

Ano: 2024

Selo: Domino

Gênero: Art Pop

Para quem gosta de: Beth Orton e PJ Harvey

Ouça: Reaching Out e Floating on a Moment

/ Por: Cleber Facchi 24/05/2024

Seja como integrante do Portishead ou nas raríssimas empreitadas em carreira solo, Beth Gibbons sempre pareceu seguir em uma medida própria de tempo. São aparições pontuais, a cada nova década, como no colaborativo Out of Season (2002), junto do multi-instrumentista Paul Webb, ou com a Orquestra Sinfônica da Rádio Nacional Polonesa, com quem trabalhou no espetáculo ao vivo Henryk Górecki: Symphony No. 3 (Symphony of Sorrowful Songs), sob a regência do maestro e compositor polonês Krzysztof Penderecki.

Vem justamente dessa ausência de pressa o estímulo para o delicado repertório de Lives Outgrown (2024, Domino). Concebido em parceria com o baterista Lee Harris, ex-integrante do Talk Talk, em um intervalo de mais de uma década, e finalizado com o suporte do produtor James Ford, o registro de dez faixas chama a atenção pela forma como cada componente se revela em pequenas doses. São pinceladas instrumentais e poéticas que contrastam com a urgência explícita na temática central do trabalho: a relação com a morte.

Eu percebi como a vida era sem esperança”, disse a artista, totalmente incapaz de mudar o futuro e tendo que lidar com as limitações do próprio corpo, no texto de apresentação do material. E essa predominante melancolia não se dá por acaso. No decorrer da última década, Gibbons viu grande parte dos familiares e amigos próximos perderem suas vidas, tema potencializado com o avanço da pandemia de Covid-19 e toda uma série de transformações políticas e pessoais que desembocaram nas composições Lives Outgrown.

Entretanto, como indicado há três décadas, quando se envolveu na produção de Dummy (1994), primeiro álbum de estúdio do Portishead, é nos momentos de maior angústia que a poesia de Gibbons ganha forma e cresce. “O fardo da vida simplesmente não nos deixa em paz / E o momento nunca é certo quando estamos trocando a alma“, canta em Burden of Life, música que avança aos poucos, sem pressa, destacando a poesia dilacerante que parte de observações sobre o cenário ao redor para mergulhar nos tormentos da cantora.

São composições que alternam entre a ausência de certeza e a necessidade de seguir em frente, como um mergulho na mente de Gibbons. “Além da vida / Diante de mim / Um passageiro / Em uma jornada nada comum“, detalha em Floating On A Moment, música que não apenas destaca a riqueza dos versos, como o meticuloso tratamento dado aos arranjos e uso de elementos percussivos que concedem ritmo ao material. É como um jogo de pequenos acréscimos que resulta em faixas como Lost Changes e Reaching Out, essa última, marcada pela bateria ritualística que faz lembrar o Radiohead em canções como There There.

De ritmo lento, conceito reforçado logo nos minutos iniciais do trabalho, em Tell Me Who You Are Today, Lives Outgrown estabelece nesse avanço cadenciado sua principal virtude e fraqueza. Passada a fluidez explícita em Reaching Out, Gibbons mergulha em uma sequência de canções que se arrastam de forma vagarosa até a derradeira Whispering Love, comprometendo parte da experiência do material. Canções talvez difíceis de serem absorvidas, porém, consistentes com a densidade dos temas que a todo momento destacam a capacidade da compositora em convidar o ouvinte a refletir sobre a transitoriedade da vida.

Ouça também:

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.