Image
Crítica

Bríi

: "Corpos Transparentes"

Ano: 2022

Selo: Independente

Gênero: Experimental, Black Metal

Para quem gosta de: Kaatayra e Papangu

Ouça: Corpos Transparentes

7.8
7.8

Bríi: “Corpos Transparentes”

Ano: 2022

Selo: Independente

Gênero: Experimental, Black Metal

Para quem gosta de: Kaatayra e Papangu

Ouça: Corpos Transparentes

/ Por: Cleber Facchi 14/07/2022

De todos os registros e diferentes identidades criativas adotadas pelo multi-instrumentista Caio Lemos, Bríi segue como um dos mais interessantes e provocativos. Próximo e ao mesmo tempo distante de tudo aquilo que o músico brasiliense tem explorado como Kaatayra e Vauruvã, o projeto carrega no inusitado diálogo com a produção eletrônica um precioso componente de distanciamento conceitual dos demais trabalhos apresentados pelo artista. São composições essencialmente longas e imersivas, proposta que fica ainda mais evidente no curioso direcionamento adotado em Corpos Transparentes (2022, Independente).

Sequência ao material entregue pelo artista no ainda recente Sem Propósito (2021), trabalho em que contou com as vozes de Thiago Satyr e Bruno Augusto Ribeiro, o novo disco ganha forma nos pequenos desdobramentos de uma extensa composição que se espalha em um intervalo de quase 40 minutos de duração. Trata-se de uma delicada reflexão de Lemos sobre a morte, conceito que acaba se refletindo não apenas na construção dos versos, sempre consumidos por lembranças dolorosas (“Lamento por não ter vivido mais contigo“), como na densa tapeçaria instrumental que cobre toda a superfície do registro.

A exemplo do que havia testado no trabalho anterior, Lemos se concentra na formação de um material regido pela urgência das batidas, porém, completo pelo minucioso tratamento dado aos arranjos que ganham forma ao longo da canção. São guitarras labirínticas, camadas de sintetizadores e texturas que mudam de direção a todo instante, garantindo maior profundidade ao registro. E isso fica bastante evidente nos primeiros sete minutos da composição, quando o instrumentista, apresentado pelo nome de Serafim, revela parte dos elementos que serão incorporados até os momentos finais de Corpos Transparentes.

Passado esse turbulento exercício de apresentação que marca o bloco inicial do trabalho, Lemos abre passagem para o lado atmosférico da obra. Enquanto as batidas apontam para a produção eletrônica dos anos 1990, lembrando as criações de Squarepusher, sintetizadores atmosféricos utilizam de uma abordagem essencialmente etérea, indicando uma fuga do restante da obra. É como um preparativo para um dos momentos de maior angústia do álbum, quando a saudade toma conta dos versos (“Não vá agora / Não vá embora“), batidas crescem e o uso melancólico dos pianos reforça a essência dolorosa do registro.

A partir desse ponto, Corpos Transparentes fica cada vez mais imprevisível, com atos menos espaçados e pontuados por momentos de maior experimentação. Mesmo a voz de Pedrito Hildebrando, parceiro do multi-instrumentista durante toda a execução do trabalho, se projeta com maior destaque. O problema é que mesmo nesse delirante cruzamento de informações, algumas estruturas apresentadas pelo artista parecem se repetir. São batidas ritualísticas e ambientações eletrônicas que pouco avançam em relação ao material entregue minutos antes, na porção inicial do disco, tornando exaustiva a experiência do ouvinte.

Entretanto, ao se aproximar dos momentos finais da registro, o trabalho mais uma vez ganha novo fôlego, cresce e passa a utilizar de uma abordagem quase transcendental. É como um complemento sutil aos versos que abandonam o tom fúnebre do restante da obra para celebrar os reencontros no além-vida – “E sobre nuvens / Recebido com tantos abraços, sorrisos e recordações / Encontrei corpos transparentes / Seguimos em caravana“. Instantes em que o músico brasiliense oferece um contraponto esperançoso ao material entregue no registro anterior, sempre regido pela crueza dos elementos e forte temática niilista.

Ouça também:

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.