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Ano: 2022

Selo: Balaclava Records

Gênero: Indie Rock, Shoegaze

Para quem gosta de: eliminadorzinho e Ventre

Ouça: Enterro dos Ossos, Crista e Arão

8.2
8.2

gorduratrans: “Zera”

Ano: 2022

Selo: Balaclava Records

Gênero: Indie Rock, Shoegaze

Para quem gosta de: eliminadorzinho e Ventre

Ouça: Enterro dos Ossos, Crista e Arão

/ Por: Cleber Facchi 04/07/2022

Os minutos iniciais de Crista, música de abertura de Zera (2022, Balaclava Records), são essenciais para entender a direção seguida pelos integrantes da gorduratrans no terceiro e mais recente trabalho de estúdio da banda fluminense. Atravessando a base de sintetizadores enevoados, como um tecido fino, quase transparente, o ouvinte é prontamente confrontado com uma sequência de guitarras, batidas e blocos colossais de ruídos. Uma contrastante combinação de elementos que preserva, perverte e amplia tudo aquilo que Felipe Aguiar (guitarra e voz) e Luiz Felipe Marinho (bateria e voz) haviam testado nos dois primeiros registros de inéditas, Repertório Infindável de Dolorosas Piadas (2015) e Paroxismos (2017).

Dividido entre momentos de calmaria e caos, o registro que conta com produção do pernambucano Roberto Kramer (RØKR) e o músico paulistano Fernando Dotta (Single Parents), faz de cada composição um objeto precioso. Passada a labiríntica canção de abertura, Enterro dos Ossos, já conhecida criação da dupla, evidencia o que há de mais intenso no som produzido pela banda. Enquanto os versos tratam sobre a degradação dos elementos (“Destroços jogados no mar / O peso, o pernoite / Tudo acaba uma hora“), camadas de guitarras encolhem e crescem a todo instante, sempre de maneira intensa e imprevisível.

Essa mesma crueza no processo de criação fica ainda mais evidente com a chegada de Cortisol. Pouco menos de três minutos em que somos soterrados em meio a guitarras e batidas rápidas, reforçando o existencialismo angustiado expresso nos versos. “Acorrentado em mim / Até o entardecer / Procurando entender / Como sobreviver“, canta. É somente com a chegada de Nem Sempre Foi Assim, quarta faixa do disco, que o ouvinte é novamente autorizado a respirar. São ambientações sutis que transportam o trabalho para um novo território criativo. Mesmo a letra da composição, consumida por memórias de um passado ainda recente, potencializa esse resultado. “Era assim / Nem sempre foi / Jamais será outra vez“, detalha.

Com a chegada de Alquimistas, logo em sequência, o trabalho ganha novo fôlego e traz de volta a urgência explícita no bloco inicial. A diferença está no caráter melódico dado às guitarras, como um complemento natural aos versos regidos pela força dos sentimentos (“Faz um tempo / Que sem teu olhar não sei viver“). Nada que prejudique a construção de faixas marcadas pela aspereza dos elementos. É o caso de Arão, composição adornada por referências ao time do Flamengo e fragmentos extraídos da obra de Nelson Rodrigues, porém, imersa em camadas de ruídos e batidas que tensionam a experiência do ouvinte.

Tamanha potência faz com que Jaco, vinda logo em sequência, seja praticamente engolida. E não poderia ser diferente. Trata-se de uma parcial fuga do restante da obra. Instantes em que a percussão de Marinho é trabalhada de forma quase ritualística, sempre acompanhada pelas texturas geradas pela guitarra cíclica de Aguiar. É como um exercício de transição para o material entregue pela na música de encerramento do disco, Caveira, composição que evoca as canções do grupo paulistano E A Terra Nunca Me Pareceu Tão Distante, mesmo preservando o acabamento ruidoso que parece típico das criações da banda fluminense.

Próximo e ao mesmo tempo distante de tudo aquilo que Aguiar e Marinho havia explorado anteriormente, Zera encanta pela capacidade dos dois artistas em preservar a crueza explícita em Repertório Infindável de Dolorosas Piadas e Paroxismos, porém, partindo de um evidente exercício de amadurecimento estético e busca por novas possibilidades em estúdio. Dessa forma, mesmo canções que orbitam temáticas bastante similares, ancoradas em crises existenciais, medos e relacionamentos conturbados, ecoam de forma transformada, conduzindo com naturalidade a experiência do ouvinte durante toda a execução da obra.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.