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Crítica

Helado Negro

: "Phasor"

Ano: 2024

Selo: 4AD

Gênero: Art Pop

Para quem gosta de: Buscabulla e Devendra Banhart

Ouça: Best For You and Me e LFO (Lupe Finds Oliveros)

8.2
8.2

Helado Negro: “Phasor”

Ano: 2024

Selo: 4AD

Gênero: Art Pop

Para quem gosta de: Buscabulla e Devendra Banhart

Ouça: Best For You and Me e LFO (Lupe Finds Oliveros)

/ Por: Cleber Facchi 14/02/2024

Roberto Carlos Lange vive hoje sua melhor fase. Em um contínuo processo de amadurecimento criativo que teve início com o lançamento de Private Energy (2016), passa pelo refinamento de This Is How You Smile (2019) e segue até Far In (2021), cada novo trabalho de estúdio destaca o sempre meticuloso processo de criação do músico que encontrou na identidade de Helado Negro o estímulo para um repertório marcado pela sensibilidade dos temas. São composições reducionistas, porém, profundamente complexas, como um indicativo do caráter processual e uso de pequenos acréscimos que orientam os registros do compositor.

Mais recente trabalho de estúdio do músico, Phasor (2024, 4AD) funciona como uma boa representação desse resultado. Concebido após uma viagem de Lange à Universidade de Illinois, onde foi apresentado ao sintetizador Sal-Mar, uma complexa máquina desenvolvida pelo compositor Salvatore Martirano para criar um número infinito de sequências sonoras, o álbum de nove faixas é uma desses registros que se revelam ao público em pequenas doses, sem pressa. Ainda que a introdutória LFO (Lupe Finds Oliveros) evidencie uma urgência poucas vezes antes vista na obra de Helado Negro, cada movimento do instrumentista abre passagem para um universo de novas possibilidades, diferentes ritmos e curiosas mudanças de percurso.

Embora posicionada próxima ao encerramento do trabalho, Wish You Could Be Here funciona como uma boa representação desse resultado. Enquanto os versos alternam entre o inglês e o espanhol, destacando o lirismo confessional de Lange, fragmento eletrônicos, microambientações e batidas reducionistas assumem diferentes percursos, ampliando os limites da composição. É como se diferentes faixas fossem aos poucos desenvolvidas, fragmentadas e remontadas em um desenho abstrato, conceito que dialoga com a própria imagem de capa do disco, com suas formas flutuantes, linhas e inserções discretas, sempre minimalistas.

Tamanha sutileza no processo de construção do trabalho resulta na entrega de uma obra talvez difícil de ser absorvida logo em uma primeira audição, mas que encanta a cada novo regresso do ouvinte. Parte desse resultado vem do esforço de Lange em combinar momentos de maior experimentação com versos sempre marcados pela força dos sentimentos. “Luz tranquila / Forçando demais, tudo acabou / Mamãe está dormindo / Papai não está em casa, é o que há de errado“, canta em Best For You And Me, delicada criação em que reflete sobre o período durante a juventude em que teve de lidar com o divórcio dos próprios pais.

Em geral, são histórias simples, como fragmentos extraídos do cotidiano de Lange, mas que ganham novo significado ao serem trabalhadas em uma base de sintetizadores etéreos, quebras e batidas que transitam por diferentes estilos de forma sempre imprevisível. Exemplo disso pode ser percebido no romantismo de I Just Want To Wake Up With You, canção que destaca a capacidade do músico em jogar com os instante, porém preservando a sensibilidade dos versos. “Porque tudo que eu quero fazer / É ouvir você dizer meu nome de novo / E tudo que eu quero fazer / É cantar sua música de novo e de novo“, confessa o artista.

Tão delicado quanto musicalmente instigante, Phasor mais uma vez evidencia o esforço do artista em se desafiar criativamente. Mesmo que parte dos conceitos explorados ao longo da obra pareçam dialogar de forma bastante similar com os arranjos e temas incorporados em This Is How You Smile e Far In, Lange estabelece na permanente desconstrução dos elementos o estímulo para a formação de um material que oferece diferentes interpretações e muda de direção sem necessariamente parecer inconsistente. São movimentações sutis que utilizam de uma abordagem talvez discreta em uma audição inicial, mas que acabam revelando suas nuances à medida que nos aventuramos pelo repertório proposto pelo músico.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.