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Crítica

Katie Dey

: "Forever Music"

Ano: 2022

Selo: Independente

Gênero: Indie, Bedroom Pop

Para quem gosta de: Ian Sweet e Black Dresses

Ouça: Real Love e Happy Girl

7.0
7.0

Katie Dey: “Forever Music”

Ano: 2022

Selo: Independente

Gênero: Indie, Bedroom Pop

Para quem gosta de: Ian Sweet e Black Dresses

Ouça: Real Love e Happy Girl

/ Por: Cleber Facchi 18/02/2022

Desde o início da carreira, a música de Katie Dey sempre funcionou como a passagem para um território bastante particular da cantora e compositora australiana. São canções produzidas e gravadas de forma totalmente caseira, no estúdio improvisado que a artista de Melbourne montou dentro do próprio quarto. E isso fica bastante evidente nas canções de Forever Music (2022, Independente). Mais recente álbum de inéditas da musicista, o registro de dez faixas ganha forma em meio a ambientações reducionistas e parcos instrumentos, porém, potencializa o lirismo intimista e doloroso que há tempos tem sido explorado por Dey.

Cicatrizes reabrindo / Sangue derramando / E depois se transformando / Em cicatrizes novamente“, canta logo nos primeiros minutos da obra, em Unfurl, música que evidencia a completa vulnerabilidade e entrega de Dey durante toda a execução da obra. É como um doloroso exercício criativo que parte das inseguranças, medos e conflitos vividos pela artista australiana durante o período de isolamento social, direcionamento que embala a experiência do ouvinte até a canção de encerramento do trabalho, Rot With Me, faixa que se espalha em meio a versos confessionais e arranjos melancólicos, por vezes sufocantes.

Nesse sentido, Forever Music funciona como um contraponto ao material apresentado no último registro de inéditas produzido por Dey, Mydata (2020). Enquanto o trabalho entregue há dois anos encantava pelo maior refinamento dado aos arranjos e evidente força explícita nos versos, com o presente disco, a artista australiana parece encolher. É como se cada composição fosse montada a partir da sobreposição sutil das batidas, sintetizadores econômicos e vozes quase esfareladas, sempre carregadas de efeitos. São retalhos instrumentais e poéticos que se revelam ao público em uma medida própria de tempo, sem pressa.

E isso fica bastante evidente em Impossible. Enquanto a letra da canção parece pensada para estimular o ouvinte – “mais um passo / sejam valentes, meninas” –, batidas secas ganham forma em meio a guitarras e sintetizadores ocasionais, como um complemento aos versos detalhados por Dey. Mesmo o inusitado uso de outros instrumentos, como o violino em Happy Girl, parece administrado em pequenas doses. É como uma fuga do material entregue nos primeiros registros da cantora, os experimentais Asdfasdf (2015) e Flood Network (2016), onde diferentes blocos de ruídos, batidas e vozes granuladas se cruzavam a todo instante.

Se por um lado esse maior reducionismo no processo de montagem do trabalho favorece a melancolia explícita durante a construção dos versos, por outro, torna a audição de Forever Music bastante arrastada. Salve exceções, como Real Love e Fuckboy, Dey rompe significativamente com o glitch pop que havia acertado no disco anterior, onde parte expressiva das canções pareciam pensadas para estreitar a relação com o ouvinte. E isso fica ainda mais evidente na segunda metade do registro, quando tudo gira em torno de um limitado conjunto de ideias e experiências sentimentais que pouco avançam criativamente.

Embora arrastado e pouco indicado para quem ainda não tenha se aventurado pelos antigos trabalhos de Dey, Forever Music está longe de parecer uma obra ruim. Observado de maneira atenta, poucas vezes antes a artista australiana pareceu tão exposta, íntima do ouvinte. Do momento em que tem início, na já citada Unfurl, cada mínimo fragmento do álbum gira em torno de sentimentos bastante particulares, ainda que dotados de uma linguagem universal. É como se a cantora transportasse para dentro de estúdio tudo aquilo que ela e outros indivíduos têm vivido desde que a pandemia de Covid-19 limitou nossas possibilidades.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.