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Crítica

Luiza Lian

: "7 Estrelas | Quem Arrancou O Céu?"

Ano: 2023

Selo: Risco / ZZK Records

Gênero: Art Pop, MPB, Experimental

Para quem gosta de: Céu e Xênia França

Ouça: Eu Estou Aqui, Desabriga e Deságua

8.8
8.8

Luiza Lian: “7 Estrelas / Quem Arrancou O Céu?”

Ano: 2023

Selo: Risco / ZZK Records

Gênero: Art Pop, MPB, Experimental

Para quem gosta de: Céu e Xênia França

Ouça: Eu Estou Aqui, Desabriga e Deságua

/ Por: Cleber Facchi 02/08/2023

Do solo lamacento de um cenário consumido pelas incertezas e o caos urbano, floresce o repertório de 7 Estrelas | Quem Arrancou O Céu? (2023, Risco / ZZK Records). Quarto e mais recente álbum de estúdio de Luiza Lian, o registro que teve suas músicas compostas ainda em 2019, antes do período pandêmico, pinta um retrato sombrio do Brasil em seus anos mais recentes, profetiza o óbvio diante de um governo vil e perverso (“Todo mundo morto / Todo mundo morto“), porém, estabelece na força dos sentimentos uma importante ferramenta de transformação poética que acolhe, envolve e conduz a experiência do ouvinte.

Sequência ao material entregue em Azul Moderno (2018), o registro produzido e composto em parceria com Charles Tixier funciona tanto como uma crônica da época em que vivemos, como um mergulho na mente e nas inquietações de Lian. “Pode ser que eu esteja aqui por todos os motivos errados / Mas eu estou aqui“, reflete na já conhecida Eu Estou Aqui, música que levanta uma série de questões (“Onde é o fim do mundo? / Que horas chega o futuro? / Qual altura desse muro?“), porém, segue firme em suas convicções (“Por mais fundo que seja o fundo do mar o mar tem fundo“). Um misto de insegurança e necessidade de seguir em frente, dualidade que fatia o disco em duas metades, mesmo preservando sua homogeneidade.

Partindo dessa abordagem, Lian reserva ao primeiro bloco de canções uma crueza poucas vezes antes vista em suas obras. São composições que passeiam em meio a cenas descritivas, transbordam conflitos pessoais e mergulham em temas políticos com a exaustão de quem assiste com incredulidade ao absurdo. Mesmo quando estreita laços com outros colaboradores, como Céu, em Tecnicolor, ou se aprofunda em temas sentimentais, caso de Homenagem, há sempre um elemento de desconforto e ruptura, tensionando a experiência do ouvinte. Ideias e atravessamentos de informações que mudam de direção a todo instante.

Vem justamente dessa delirante combinação de elementos que orienta a formação dos versos o estímulo para o som retorcido que Tixier busca desenvolver ao longo da obra. É como um imenso pano de fundo abstrato em que texturas, filtros e batidas sempre fragmentadas surgem e desaparecem a todo instante, tornando impossível prever qualquer movimento da dupla. A própria voz de Lian, sempre carregada de efeitos, acaba se transformando em um instrumento ruidoso nas mãos do produtor, conceito reforçado no som industrial de Forca e Cobras Na Sua Mesa, dobradinha que pontua a primeira metade do trabalho.

Passado esse momento de maior inquietação, como um remix torto de tudo aquilo que Lian e Tixier têm explorado desde Oyá Tempo (2017), Viajante abre passagem para a porção seguinte do trabalho. Ainda que a faixa em questão pareça incapaz de replicar a mesma riqueza de detalhes e potência do material entregue minutos antes, esbarrando em pequenas repetições estruturais, o que se revela em sequência é uma sucessão de pequenos acertos. São melodias tão radiantes quanto distorcidas, estímulo para a formação de músicas que ora esbarram em temas existenciais, ora resgatam o romantismo agridoce do disco anterior. Exemplo disso pode ser percebido no afoxé desconstruído de Desabriga. “Eu não cheguei aqui sozinha / Não quer brigar / Não desabriga“, canta em uma delicada reflexão sobre cumplicidade amorosa, evidenciando a busca por aproximação frente ao distanciamento espelhado em Homenagem.

É como se a artista partisse de um ambiente soturno em direção à luz, fazendo da sequência de faixas um respiro aliviado após a jornada poética e emocional que se inicia com o convite da introdutória A Minha Música É (“Pra você entrar / E fazer sua viagem“). O próprio fechamento dado ao disco, com a ascensão cósmica de 7 Estrelas, seguida pelo pagodão baiano e tom festivo de Deságua, parece contribuir ainda mais para esse resultado. Uma lenta transição que parte dos sentimentos, dores e angústias vividas pela cantora na época em que o trabalho foi composto, mas que busca e encontra um espaço particular de libertação.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.