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Crítica

Nill

: "O Resgate do Maestro"

Ano: 2023

Selo: SoundFood Gang

Gênero: Rap

Para quem gosta de: Young Buda e Ogi

Ouça: Meia Milha, 3.0 e City Hunters

7.7
7.7

Nill: “O Resgate do Maestro”

Ano: 2023

Selo: SoundFood Gang

Gênero: Rap

Para quem gosta de: Young Buda e Ogi

Ouça: Meia Milha, 3.0 e City Hunters

/ Por: Cleber Facchi 10/07/2023

O Resgate do Maestro (2023, SoundFood Gang) talvez seja o trabalho menos imediato já produzido por Nill. E não poderia ser diferente. Conceitualmente inspirado pela história de um robô que chega à Terra para explorar e estudar as emoções humanas, o registro funciona como um reflexo do período de reabertura pós-pandemia de Covid-19, quando tivemos de reaprender antigos processos e experiências simples de convivência. São composições que partem de pequenas observações sobre o nosso cotidiano, estreitam laços com novos parceiros criativos e ainda buscam ressignificar temas e conceitos há muito consolidados.

Era encontrar meus pedaços, juntar e voltar pra arena / Desse filme que só tem uma cena“, reflete logo nos minutos iniciais, em 3.0, composição que evidencia a sensação de recomeço presente durante toda a execução do trabalho, abre passagem para o rapper Amiri e ainda ressalta a fina tapeçaria instrumental que tem direção assinada em parceria com CESRV, também responsável pela mixagem e masterização do material. Fragmentos poéticos que se revelam ao público em pequenas doses, como se Nill, mais do que garantir possíveis respostas ao ouvinte, levantasse novas perguntas, diferentes tormentos e inquietações.

Por conta desse forte caráter exploratório dado ao álbum, cada canção parece seguir uma abordagem bastante característica. Enquanto músicas como O que seria de nós? destacam o lirismo sentimental do rapper (“Eu passei um tempo procurando alguém / Que entendesse que não temos final“), outras, como Manga&Maçã, se aprofundam em experiências simples do cotidiano (“Talvez mais tarde ficaremos à sós / Só pra falar sobre nós“). Nada que pareça prejudicar o caráter político e olhar minucioso de Nill sobre diferentes aspectos da nossa sociedade, conceito que embala algumas das principais faixas do disco.

É o caso de Meia Milha, oitava faixa do disco. Enquanto a base da canção destaca a produção minuciosa da dupla Deekapz, versos divididos com MC Luanna se aprofundam em questões raciais e de gênero. “Mesmo sendo a mina chave, algumas portas se fecharam / Rodar a cidade no caos me fez ser paz em outro estado“, rima a convidada. Esse mesmo direcionamento volta a se repetir de forma ainda mais impactante com a chegada de City Hunters, composição que se completa pela participação dos rappers Jamés Ventura e Jota Ghetto, que logo dispara: “Sou milionésimo caso isolado de situações diversas que você viu sentado“.

Vem justamente desse forte caráter político o estímulo para uma das composições mais interessantes do trabalho, Sol. Diferente de tudo que Nill apresenta no restante do álbum, a música chama a atenção pela maneira como o artista emula a estrutura de um repente enquanto se aprofunda em versos que tratam de forma metafórica sobre o avanço do conservadorismo e a ascensão de Jair Bolsonaro. Mesmo quando se aprofunda em canções marcadas pelo forte aspecto pessoal, como em PS1, há sempre um elemento que tensiona politicamente a poesia do rapper, conceito que tem sido aprimorado desde o ótimo Lógos (2019).

Mesmo marcado pelo lirismo provocativo que orienta e amarra parte expressiva das canções, O Resgate do Maestro apresenta pequenas inconsistências durante toda sua execução. Por conta do forte caráter exploratório adotado pelo artista, algumas das faixas parecem deslocadas do restante da obra. É o caso da derradeira Simples, música que é praticamente engolida pela antecessora City Hunters. Já outras, como a instrumental Zero Zero 7, mesmo bem executada, soa muito mais como um esboço criativo do que parte fundamental do registro. É como um acumulo natural das experiências, sejam elas necessárias ou não, que a criatura robótica interpretada pelo rapper busca entender e se relacionar no decorrer do trabalho.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.