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Ano: 2021

Selo: Secretly Canadian

Gênero: Neo-Soul, R&B, Art Pop

Para quem gosta de: Moses Sumney, ANOHNI e Arca

Ouça: Same Size Shoe e Fellowship

7.5
7.5

Serpentwithfeet: “Deacon”

Ano: 2021

Selo: Secretly Canadian

Gênero: Neo-Soul, R&B, Art Pop

Para quem gosta de: Moses Sumney, ANOHNI e Arca

Ouça: Same Size Shoe e Fellowship

/ Por: Cleber Facchi 02/04/2021

Segundo e mais recente trabalho de estúdio de Josiah Wise, o Serpentwithfeet, Deacon (2021, Secretly Canadian) é uma celebração ao amor. Partindo de discussões sobre afetividade preta, masculinidade e acolhimento, o cantor e compositor norte-americano potencializa tudo aquilo que havia testado durante o lançamento de Soil (2018), obra que revelou músicas como Cherubim e Seedless. São canções que partem de acontecimentos recentes na vida do artista, porém, estabelecem no forte caráter intimista e universalidade dos versos um importante componente de diálogo com o ouvinte, direcionamento que embala a experiência do público até a música de encerramento do trabalho, a colaborativa Fellowship, bem-sucedido encontro com Sampha e Lil Silva.

Ainda que a imagem de capa do disco funcione como uma representação visual de tudo aquilo que Wise busca explorar ao longo da obra, sobrevive na atmosférica Hyacinth, música de abertura do disco, uma passagem direta para os temas incorporados pelo compositor que já colaborou com nomes como Björk e Kelela. “Não me diga que o universo não está ouvindo / Eu fui para a cama solteiro, agora estou beijando“, confessa em meio versos marcados pela força dos sentimentos. São instantes de doce vulnerabilidade e celebração, como uma fuga do lirismo melancólico que embala as criações do cantor de desde os primeiros registros autorais, caso de Blisters (2016), obra em que parecia consumido pela depressão explícita em composições como Flickering e Penance.

Mesmo a base instrumental do disco segue um caminho parcialmente distinto em relação os antigos trabalhos de Wise. Sem necessariamente perverter o soul etéreo que marca as canções de Soil, Serpentwithfeet se permite provar de uma sonoridade cada vez mais acessível, tratamento que vai do uso dos sintetizadores ao movimento destacado das batidas. São composições que apontam para o mesmo campo criativo de FKA Twigs e Duval Timothy, utilizam de elementos do R&B, mas que a todo momento regressam a um território próprio do cantor. Exemplo disso acontece no pop torto de Woody, música que parte do uso fragmentado das batidas como importante componente para o fortalecimento das vozes e texturas que surgem ao longo da faixa.

A própria relação de Wise com o seleto time de colaboradores ao longo da obra parece contribuir para esse efeito. Perfeita representação desse resultado acontece na já citada Fellowship, canção que evoca Blood Orange e Yves Tumor, porém, cresce no minucioso jogo de palavras que movimentam a construção da faixa. “Sou grato pelo amor que compartilho com meus amigos“, celebra em meio a coros de vozes e batidas que sutilmente convidam o ouvinte a dançar. Esse mesmo direcionamento acessível acaba se refletindo em Heart Storm, parceria com a cantora NAO e um dos momentos mais sensíveis da obra. Da construção dos arranjos ao uso instrumental das vozes, tudo parece pensado para confortar o ouvinte, como uma extensão do material entregue em Saturn (2018).

Claro que essa busca por novas possibilidades não interfere na produção de faixas ainda íntimas de tudo aquilo que Serpentwithfeet havia testado nos trabalhos anteriores. É o caso da sequência composta por Berrick’s Beard e Old & Fine. São pouco menos de cinco minutos em que Wise passeia em meio a vocalizações arrastadas e melodias atmosféricas, como uma interpretação ampliada do repertório entregue em Soil. A própria canção de abertura do disco, mesmo regida pela poesia romântica do músico estadunidense, segue exatamente de onde o cantor parou há três anos. São camadas de sintetizadores e texturas que se conectam diretamente ao uso das vozes, indicativo de uma obra essencialmente orgânica, como fragmentos que se entrelaçam em uma medida própria de tempo.

A principal diferença em relação aos antigos trabalhos do cantor, principalmente o introdutório Blisters, está no desenvolvimento e curta duração de grande parte das faixas. Longe do aspecto dramático e evidente entrega explícita em composições como Bless Ur Heart e Whisper, Wise investe na formação de músicas cada vez mais simples e curtas, como esboços conceituais. São registros de um a dois minutos que refletem uma sensação de incompletude, direcionamento reforçado em canções como Malik e Sailor’s Superstition. Mesmo preciosidades como Same Size Shoe parecem encerrar de forma precoce, proposta que encanta pela forma como o artista discute uma série de temas importantes ao longo do álbum, mas que se distanciam de um maior aprofundamento.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.