Image
Crítica

Sufjan Stevens

: "Javelin"

Ano: 2023

Selo: Asthmatic Kitty

Gênero: Indie, Folk, Pop de Câmara

Para quem gosta de: Bon Iver e Fleet Foxes

Ouça: So You Are Tired e Will Anybody Ever Love Me?

9.0
9.0

Sufjan Stevens: “Javelin”

Ano: 2023

Selo: Asthmatic Kitty

Gênero: Indie, Folk, Pop de Câmara

Para quem gosta de: Bon Iver e Fleet Foxes

Ouça: So You Are Tired e Will Anybody Ever Love Me?

/ Por: Cleber Facchi 13/10/2023

Os últimos tempos não foram nada agradáveis para o cantor e compositor Sufjan Stevens. Além de sofrer com a morte do próprio pai, Rasjid, e passar por um período de hospitalização para lidar com a síndrome de Guillain–Barré, uma doença rara que ataca os nervos, em abril deste ano, o músico norte-americano se despediu do parceiro de longa data, Evans Richardson. Vem justamente desse doloroso processo vivido pelo artista o estímulo para o fino repertório de Javelin (2023, Asthmatic Kitty), trabalho que contrasta a melancolia explícita nos versos com uma instrumentação suntuosa que se projeta de forma transcendental.

Consumido pela dor, porém, movido pela necessidade de seguir em frente, Stevens se aprofunda em um repertório tão particular quanto íntimo do ouvinte. “Adeus, Evergreen / Você sabe que eu te amo / Mas tudo que o céu enviou / Deve queimar no final“, canta na introdutória Goodbye Evergreen, música que resgata uma série de elementos bastante característicos do artista, como a forte religiosidade e a dor da partida. É como uma extensão do mesmo lirismo entristecido que marca os versos de Carrie & Lowell (2015), porém, substituindo memórias empoeiradas do passado por recordações ainda recentes e dolorosamente frescas.

São pequenas observações sobre a vida a dois e fragmentos simples do cotidiano que se engrandecem pela escrita sempre atenciosa de Stevens. “No futuro haverá um custo terrível / Por tudo o que deixamos por fazer… Eu sempre amarei você / Mas não posso viver com você“, canta em Shit Talk, música em que transforma o banal em algo grandioso. Parte desse resultado vem da fina tapeçaria instrumental, vozes sobrepostas e ambientações sintéticas que trazem de volta uma série de elementos testados em registros como o delicado The Age of Adz (2010), porém, partindo de um abordagem ainda mais sensível e intimista.

Exemplo disso pode ser percebido nas inquietações de Will Anybody Ever Love Me?. Enquanto os versos funcionam como um passeio pela mente e os sentimentos de Stevens (“Alguém algum dia me amará? / Por boas razões / Sem queixas, não por esporte“), arranjos cuidadosamente trabalhados em estúdio partem de uma abordagem contida para resultar em um fechamento totalmente catártico. São diálogos com o soul e elementos que atravessam o pop de câmara em uma extensão daquilo que foi apresentado pelo compositor em Illinois (2005), direcionamento reforçado em preciosidades como So You Are Tired e A Running Start.

Nada que prejudique a entrega de faixas marcadas pelo reducionismo dos elementos e busca do artista por diferentes temáticas. É o caso de My Red Little Fox, composição que evoca o folk bucólico de Vashti Bunnyan e ainda carrega nos versos o romantismo metafórico de Stevens. A própria canção-título, com seus arranjos acústicos, traz de volta a mesma atmosfera explícita em trabalhos como Michigan (2003). É como se diferentes fases e propostas criativas incorporadas pelo músico ao longo da carreira fossem combinadas dentro de uma única obra, conceito reforçado nas colagens que ilustram a imagem de capa.

Entretanto, mais do que um simples apanhado de ideias e experiências acumuladas em mais de duas décadas de carreira, Javelin se revela como um novo e importante capítulo na obra de Stevens. São diferentes perspectivas sobre temas há muito explorados pelo cantor. Uma dolorosa combinação de sentimentos que passa pelo amor, morte e isolamento vivido após um período de grandes perdas e forte instabilidade emocional. Canções que funcionam como frestas para a vida pessoal do músico, mas que em nenhum momento deixam de dialogar com ouvinte, afinal, não estamos falando de um mero compositor, mas de um dos maiores especialistas em traduzir e musicar o que se esconde dentro de cada indivíduo.

Ouça também:

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.