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Crítica

Vauruvã

: "Mar da Deriva"

Ano: 2025

Selo: Independente

Gênero: Rock, Black Metal

Para quem gosta de: Kaatayra e Bríi

Ouça: Legado e Os Caçadores

8.0
8.0

Vauruvã: “Mar Da Deriva”

Ano: 2025

Selo: Independente

Gênero: Rock, Black Metal

Para quem gosta de: Kaatayra e Bríi

Ouça: Legado e Os Caçadores

/ Por: Cleber Facchi 30/06/2025

Uma travessia poética entre a ancestralidade, o tempo e a transcendência. Assim tem sido a obra de Caio Lemos e Bruno Augusto Ribeiro no Vauruvã. Desde a estreia com Manso Queimor Dacordado (2021), cada novo trabalho de estúdio nos convida a mergulhar em narrativas existenciais que combinam a ferocidade do black metal atmosférico com elementos que incorporam a música brasileira de forma sempre particular.

Terceiro e mais recente álbum de estúdio da dupla, Mar Da Deriva (2025, Independente) segue essa mesma cartilha, contudo livre de qualquer traço de previsibilidade ou estrutura formulaica. Sequência ao material entregue em Por Nós da Ventania (2022), o disco mais uma vez destaca a capacidade dos dois artistas em jogar com os instantes, arremessando o ouvinte de um canto a outro da obra que cresce de forma colossal.

Estruturado como um cântico iniciático e ritualístico, em que a voz da sabedoria antiga se faz presente para invocar uma escuta profunda, Mar da Deriva revela parte da sua potência logo na introdutória Legado. São pouco mais de nove minutos em que somos arrastados por uma intensa corredeira de sons que sustentam nos versos o esforço em preservar o conhecimento ancestral em uma sociedade moderna e negligenciada.

Dado esse primeiro passo dentro do disco, que ainda se encerra de maneira inesperada em um samba, Os Caçadores, vinda logo em sequência, destaca o lado contemplativo da obra. Com maior destaque dado aos sintetizadores, a faixa estabelece nos versos um espaço simbólico de transição, onde o passado e o futuro se encontram em suspenso. Uma espécie de tempo mítico, anterior ao nascimento físico, como se o eu lírico buscasse reencontrar uma essência primitiva esquecida, ampliando os conceitos existenciais do material.

Inaugurada e completa de forma paisagística, a canção ainda abre passagem para a derradeira As Selvas Vermelhas no Planeta dos Eminentes. Enquanto a base da canção atravessa o black metal para desembocar na música caipira, a letra densa amplia o escopo simbólico da obra, levando a jornada ao plano cósmico-mitológico. Uma utopia poética escondida entre os véus da linguagem, da memória e da natureza, como se a trajetória iniciada em Legado se encerrasse de maneira transcendental no interior do próprio indivíduo.

Nesse sentido, o grande mérito de Mar Da Deriva não está apenas na fusão entre diferentes estilos ou no domínio técnico de seus criadores, mas na forma como constrói uma cosmologia própria, onde palavra, som e silêncio dialogam em um nível simbólico e emocional. Ainda que corra o risco de parecer hermético demais para ouvidos mais desatentos, é nessa recusa à simplificação que o Vauruvã afirma sua relevância.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.