Disco: “Abraçaço”, Caetano Veloso

/ Por: Cleber Facchi 04/12/2012

Caetano Veloso
Brazilian/Rock/Singer-Songwriter
http://www.caetanoveloso.com.br/

Por: Cleber Facchi

Caetano veloso

Caetano Veloso é pop. Outrora ícone da revolução cultural que tomou conta do Brasil ao final da década de 1960, o hoje senhor de 70 anos e cabelos brancos prova que está longe de encerrar a boa atuação que vem conduzindo há mais de quatro décadas. Convertendo personagens e marcas diversas da cultural “pop” nacional – além de utilizar a si próprio como personagem central desse universo -, o cantor e compositor baiano reinventa a rica trajetória que construiu de forma a soar inédito mesmo aos velhos seguidores. Tendo em mãos o 49º trabalho da carreira, Abraçaço (2012, Universal), Caê se entrega ao rock e aos versos de apelo fácil de forma a esculpir um domínio inóspito, surgindo tão (ou mais) relevante quanto em início de carreira.

Menos raivoso e sofrido do que (2006), nitidamente melhor estabelecido do que Zii e Zie (2009), Abraçaço finaliza com louvor a trilogia construída em parceria com a Banda Cê – Pedro Sá (guitarra), Marcelo Calado (bateria) e Ricardo Dias Gomes (baixo) –, utilizando de tais acertos de forma a reinventar a história do compositor. Tudo é igual ao mesmo tempo em que o resultado final se prolifera diferente em relação aos últimos dois grandes trabalhos de estúdio do cantor. Por mais que falte ao álbum o mesmo ineditismo lírico-instrumental causado há seis anos, o presente registro chega tomado pelo mesmo impacto, trincando dentes logo no ecoar da inaugural A Bossa Nova É Foda.

Com referências a Victor Belford, Anderson Silva e outros grandes nomes do MMA, a homenagem a João Gilberto – um apaixonado por boxe e lutas, afirmou Veloso em entrevista – abre passagem para a sucessão de acordes soturnos e firmes que tanto definem o novo álbum. A preferência instrumental assumida por Pedro Sá contribui para que Caetano se entregue tanto ao desenvolvimento de compostos melancólicos, como a surpreendente Estou Triste, assim como faixas de acabamento volumoso, bem expressa na homenagem à Carlos Marighella em Um Comunista. Uma proposta que rompe de forma consciente com o fluxo acelerado e cru em demasia do disco de estreia do projeto Cê.

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Íntimo dos dois álbuns que o precedem, em Abraçaço Caetano e os companheiros de banda se permitem arriscar mais, tanto nos versos rápidos como na sonoridade. Ao encontrar apoio nos ritmos regionais expressos em faixas como O Império da Lei (homenagem a Dorothy Stang) e Parabéns, o compositor se aproxima da leveza incorporada na década de 1970, esbarrando vez ou outra na proposta de discos como Qualquer Coisa (1975) e Cinema Transcendental (1979). Nenhuma transformação, entretanto, é tão latente quanto a que direciona a curiosa Funk Melódico, canção que funciona como uma extensão melhor resolvida do “funk cult” Miami Maculele, em Recanto (2011) de Gal Costa. A medida rompe com o rock frio à la The Strokes – uma das marcas de Cê -, separando a conexão com o álbum Transa (1972) e preparando o ouvinte para o que pode a ser recuperado em um futuro próximo, quando o trabalho em conjunto com o quarteto for desmantelado.

Capaz de romper com as especificidades do disco passado – excessivamente hermético em relação ao delineamento formalizado em -, com o presente álbum Caetano se entrega à naturalidade dos versos, que vez ou outra se escoram artifícios de forte apelo comercial – já anunciado na capa assinada por Fernando Young. Seja pelas redundâncias acolhedoras em Estou Triste (“Eu me sinto vazio/ E ainda assim farto/ Estou triste, tão triste/ E o lugar mais frio do Rio é o meu quarto”), ou os versos fáceis da canção inaugural – “A Bossa Nova é Foda!” -, tudo contribui de forma a aproximar o músico do grande público, principalmente os mais jovens.

Embora representado como o fechamento de um pequeno ciclo – acompanhado em breve por um provável registro ao vivo -, Abraçaço e o título forte que ecoa despedida delimita o ponto máximo de um recomeço. Ao serem observados como uma obra única, os três registros emanam um resultado que se orienta em etapas, sendo o primeiro um escarro, o segundo um respiro e o terceiro o grito final do compositor. Mesmo que as expectativas se mantenham em alta é difícil prever a construção de uma obra tão grandiosa e intensa quanto a alicerçada nos últimos seis anos. Logo, o presente álbum se anuncia como o último grande disco de Veloso, que já puxa de maneira involuntária um sincero e nitidamente agradecido “muito obrigado” do público.

Caetano Veloso

Abraçaço (2012, Universal)

Nota: 9.0
Para quem gosta de: Gal Costa, Los Hermanos e +2
Ouça: A Bossa Nova é Foda, Estou Triste e Funk Melódico

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.