Disco: “Lenhador”, Marcelo Perdido

/ Por: Cleber Facchi 25/03/2014

Marcelo Perdido
Indie/Folk/Alternative
http://marceloperdido.com.br/

Por: Cleber Facchi

Marcelo Perdido

Mais do que ser apresentado como um artista, Marcelo Perdido deve ser observado como um trabalhador. Tendo nas experiências musicais um complemento ao esforço cotidiano – que está longe de se relacionar exclusivamente com a música -, o músico “paulistano” encontra no uso de pequenas melodias e versos brandos um refúgio. Não por acaso a busca por uma clareira criativa parece dar título e movimento lírico ao primeiro invento solo do músico, Lenhador (2014, Independente). Um registro pontuado pela singeleza dos arranjos, mas alimentado em essência pelo esforço dos sentimentos, temas e toques amargurados de desamor.

Em um sentido de oposição e ao mesmo tempo proximidade ao trabalho anunciado em sua antiga banda, a falecida Hidrocor, Perdido usa do presente álbum como um objeto de experimento. Ainda que as melodias doces e vozes tímidas sejam capazes de se comunicar naturalmente com o som exposto há dois anos – em Edifício Bambi (2012) -, cada música do presente álbum abraça a descoberta como uma ferramenta de sofisticação. Um cenário dividido entre a limpidez e o artesanal, dualidades que estimulam ainda mais um mergulho involuntário no isolamento do próprio autor.

Perturbado sem deixar de convencer musicalmente, o presente disco se acomoda em meio a um conjunto de temas sempre subjetivos e versáteis. São canções capazes de brincar com personagens (Vincent, William e José), cenários (Paquetá) e sentimentos (Aritimética) ao mesmo tempo em que reforçam as particularidades do cantor – direcionamento exposto logo na inaugural faixa-título. Assim como no exercício testado em Edifício Bambi, Perdido continua a cantar sobre si próprio e o universo que o rodeia, esforço que em nenhum instante esbarra no hermetismo típico de obras do gênero.

Enquanto trilha um catálogo de faixas propositalmente simples, vide Meu maravilhoso amigo meu ou a encantadora Sacolé (parceria com Laura Lavieri), Perdido esculpe com parcimônia um detalhista infinito particular. São histórias ambientadas em um cenário urbano, movido por temas recentes e que aos poucos firmam nessa desenvoltura um abrigo inevitável para confortar o visitante. A poesia que abastece as faixas não dá voltas, pelo contrário, simplifica, fala sobre amor, sobre tomar sorvete ou apenas caminhar na rua com naturalidade. Sim, Perdido canta sobre ele, mas isso não quer dizer que o ouvinte acabe de fora desse cenário.

Contrariando a lógica tímida e parcialmente límpida dos violões que fizeram nascer faixas como Listras e Xadrez, do trabalho passado, Perdido derrama sobre o presente álbum um oceano de pequenos ruídos. A estratégia, que em alguns momentos remete aos inventos mais artesanais de Phil Elvrum (com o The Microphones) e Daniel Johnston, amplia com leveza a sensibilidade do disco. É como se tudo não passasse de um imenso rascunho torto na mente do cantor, uma ideia (ou melodia) que exige ser transformada em música.

Longe de se perder em um agregado de experiências rasas ou sujas, Lenhador aos poucos ganha formas bem definidas nas mãos do músico Felipa Parra, velho colaborador de Perdido. Extraindo o que há de mais delicado e musicalmente acessível nos inventos do musico, o produtor (em parceria com um grupo de instrumentistas) finaliza uma obra em natural crescimento. É evidente como cada composição se acomoda em um estágio entre a timidez e a estabilidade, o que faz do registro um pequeno conjunto de (novas) regras para o trabalho de Perdido – algumas, prontamente consolidadas, já outras, em delicada formação.

Marcelo Perdido

Lenhador (2014, Independente)

Nota: 8.2
Para quem gosta de: Hidrocor, Cícero e Lulina
Ouça: Aritimética, Sacolé e Creme Brulée

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.