Disco: “Motel”, Banda Uó

/ Por: Cleber Facchi 05/09/2012

Banda Uó
Brazilian/Electronic/Pop
https://www.facebook.com/BandaUO

Por: Cleber Facchi

Carlos Nascimento em um furtivo lance de pura (e confusa) opinião cunhou a máxima: “nós já fomos mais inteligentes”. Prefiro acreditar que nunca fomos tão humorados. Em um cenário cada vez mais comandado pela instantaneidade das redes sociais, em que cada post surge temperado por uma dose de bom humor, ironia ou simples manifestação de melancolias pessoais – diga-se “dor de corno” -, a presença da tríade goiana Banda Uó surge de maneira necessária para a produção da trilha sonora que define o período. Esqueça o preconceito de quem se prende a um único gênero ou sonoridade, assim como o cardápio plural de sons que escorre ao longo do disco Motel (2012, Deck), primeiro álbum do grupo, diversas são as tendências que pintam e definem o cenário recente, sejam elas passageiras ou constantes.

Aproveitando enquanto todos os holofotes seguem apontados para o trio, Davi Sabbag, Mateus Carrilho e Candy Mel prosseguem com a construção do mesmo som que definiu o EP Me Emoldurei De Presente Pra Te Ter, registro que ao ser lançado no último ano se transformou em um verdadeiro fenômeno de público e crítica – um efeito cada vez mais raro hoje. Parcialmente afastados das tradicionais versões que tanto trouxeram destaque ao trabalho do grupo (e criavam uma relação com o que de fato define parte da cultura do electrobrega), o trio aposta na construção de músicas próprias. Uma preferência que inicialmente causa desconforto a quem estava acostumado com os anteriores e cômicos reinventos da banda, mas uma transformação de fato necessária para o resultado final do disco e as visíveis evoluções dos três componentes.

Cada vez mais distantes da roupagem voltada ao electrobrega que tanto definiu os primeiros lançamentos da banda, em Motel o acerto do trio (e da produção de Rodrigo Gorky e Pedro D’Eyrot do Bonde do Rolê) está na capacidade de olhar com bom humor para uma série de outras referências “conceituais” que flutuam na música nacional. Do sertanejo universitário que se manifesta em Cowboy e Chorei ao axé-pop que explode com Búzios do Coração, o que garante dinamismo e sustento ao disco se baseia na miscelânea de fórmulas e preferências instrumentais humoradas, trazendo nos teclados vintage que preenchem o registro uma constante relação com as premissas do trabalho anterior.

[youtube:http://www.youtube.com/watch?v=JCThfoKkX20?rol=0]

[youtube:http://www.youtube.com/watch?v=kiukAdOOkrg?rol=0]

Ao ouvir o disco esqueça a geração de bandas que se formaram apoiadas nos ensinamentos (e no culto) ao trabalho do quarteto Los Hermanos ou ainda no rock indie de grupos como The Strokes. Na estreia da Banda Uó os preceitos são obviamente outros, muito mais lascivos, descarados e por sua vez brasileiros. Do romantismo sacana que preenche a obra (e o bigode) do cantor Latino no ápice da década de 1990, ao toque sensual e dançante que acompanhou o trabalho de grupos como É o Tchan até princípios da década passada, tudo se movimenta de forma quente e estritamente comercial, reflexo que preenche a quase totalidade do álbum. Até quando o exagero é visível, como em Malandro (uma bela tradução dos campeonatos de som automotivo que acontecem no interior país), tudo conta com um sentido próprio e necessário para a execução do disco.

Todavia, o maior êxito da banda não está em simplesmente brincar de forma irônica com uma variedade de preferências nostálgicas ou recentes, mas em aproximar toda uma geração habituada ao tom cinza dos versos de Marcelo Camelo a uma nova e também riquíssima sonoridade. O trio praticamente nos ensina a gostar daquilo que Michel Teló e tantos outros insistem proclamar, nos treinando para deixar de lado o banal sentimento de vergonha e se entregar de vez à dança. Mesmo com o acabamento forçado de algumas canções, em poucos instantes o trio estabelece uma trama de soluções musicais que grudam no cérebro, impregnando o trabalho (e o próprio público) com exposições musicalmente eróticas e amarguradamente cômicas, manifestações típicas dos frequentadores de motéis baratos e uma clara resposta ao título que define o disco.

Quem pensava que com o lançamento do EP no último ano a banda seria incapaz de acrescentar qualquer novidade ao trabalho, talvez acabe surpreso com a maneira como o presente disco se orienta. Da velha conexão com a música paraense na ótima (e incrivelmente madura) Castelo de Areias aos diálogos estabelecidos com o Synthpop em Cavalo de Fogo, Motel não traz apenas uma extensão do que a banda propunha há um ano, mas uma clara evolução. Talvez a Banda Uó seja de fato uma piada momentânea, um novo meme ou um fenômeno passageiro que em alguns meses perca toda a graça – efeito típico de grupos que lidam com o humor -, entretanto, enquanto a piada ainda surte efeito, não replica-la é um simplesmente um erro. Sim, provavelmente já fomos mais inteligentes, mas nunca tão humorados e ainda capazes de dançar.

Motel (2012, Deck)

Nota: 7.6
Para quem gosta de: Bonde do Rolê, Gaby Amarantos e Gang do Electro
Ouça: Cavalo de Fogo, Búzios do Coração e Castelo de Areia

[soundcloud url=”http://api.soundcloud.com/playlists/2439005″ height=”200″ iframe=”true” /]

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.