Disco: “Psychic”, Darkside

/ Por: Cleber Facchi 09/10/2013

Darkside
Experimental/Electronic/Alternative
http://www.darksideusa.com/

Por: Cleber Facchi

Poucos artistas parecem ter aproveitado tão bem os últimos anos quanto Nicolas Jaar. Quem acreditava que o lançamento de Space Is Only Noise (2011) seria apenas a abertura para mais um estranho nome da eletrônica norte-americana, encontrou na sequência de lançamentos do produtor um catálogo de experiências ainda maiores e inventivas. Seja na construção do selo Clown & Sunset ou no lançamento do Other People, na chegada da coletânea Don’t Break My Love (2012), ou na turnê que levou o artista aos pontos mais distantes do globo, por onde passa, Jaar parece sustentar a construção de um universo excêntrico, musicalmente desafiador e que se amplia ainda mais com a chegada do primeiro álbum do Darkside.

Formado por Jaar e o multi-instrumentista Dave Harrington, o projeto trouxe logo no autointitulado primeiro EP, de 2011, a base para o que identifica toda a estranha composição do recém-lançado Psychic (2013, Matador/Other People). Sujo, perturbador e até erótico, o álbum mais parece um agregado de informações tortas, mas que lentamente vão assentando dentro dos limites impostos pela dupla. Do sombreado minimalista que cresce no primeiro disco solo de Jaar, pouco parece ter sobrevivido, talvez apenas os ruídos, o que manifesta em Harrington toda a corrente que impulsiona a obra.

Com mais de onze minutos de duração, Golden Arrow, faixa de abertura do álbum, talvez seja a chave para “entender” todo o tabuleiro instrumental que o duo promove ao longo do disco. Naturalmente climática, a composição exige tempo, fracionando todos os componentes que a caracterizam em uma medida ora sensual, ora excêntrica, dividindo constantemente a compreensão do ouvinte. Vozes inteligíveis, guitarras aplicadas em um plano de fundo erótico e todo um jogo de atos crescentes obrigam o espectador a se embrenhar na mata densa imposta com parcimônia. O tempo está longe de ser um aliado, é apenas mais um componente para o jogo de provocações que a dupla desenvolve pelo trabalho.

Filtro conceitual ou não, a extensa música de abertura é uma passagem direta para o ambiente ainda mais estimulante (ou seria confuso?) que chega logo em sequência. Ainda que músicas como Heart e Paper Trails sejam capazes de hipnotizar mediante o detalhamento das harmonias e vozes, quanto mais Jaar e Harrington mergulham no disco, mais os rumos se alteram sensorialmente. Não estranhe se em diversos momentos você perceber que uma linha de baixo surgiu aqui ou uma voz desapareceu acolá. Projetado para brincar com as percepções do ouvinte, cada bloco instrumental do álbum se abre como um imenso labirinto de texturas e sensações, indo de instantes de pura melancolia, em Greek Light, até a abertura de portas acessíveis, com Freak, Go Home.

Há poucos meses, quando o duo apresentou o curioso Daftside, álbum-remix de Random Access Memories (2013) do Daft Punk, a sensibilidade nostálgica da dupla francesa parecia totalmente desarticulada. Era como se o princípio instrumental da década de 1970 fosse posicionado em um arranjo intencionalmente desconexo, efeito que os norte-americanos voltam a assumir de forma ainda mais instável em Psychic. Basta um passeio pelas guitarras “funkeadas” de The Only Shrine I’ve Seen ou o baixo volumoso de Paper Trails para perceber essa (des)construção. A sensação é a de que Harrington parece ter preparado um ardiloso jogo de referências e sons, deixando aos encargos do parceiro o exercício de encaixar essas mesmas bases em uma ordem inexata. Dessa forma, Deep House e Dance Music esbarram em uma parede de sintetizadores sujos, ao mesmo tempo em que nada disso parece próximo do estágio original. Apenas confusão.

Sem que haja qualquer percurso simplificado aparente, Psychic é uma obra para quem gosta de ser provocado. Enquanto Space Is Only Noise, ou mesmo o primeiro EP do Darkside é uma disco entregue ao jogo minucioso dos efeitos, o presente exemplar se manifesta como uma obra focada na ruptura. Tudo e nada se esbarram em um ambiente em que mesmo a menor das composições se manifesta como uma discografia costurada de forma aleatória. Uma imensa colcha de retalhos sujos, desconexos. Chegar ao final do disco não é uma garantia de respostas, mas o efeito de satisfação é tão claro quanto se elas existissem.

 

Darkside

Psychic (2013, Matador/Other People)

Nota: 9.0
Para quem gosta de: Nicolas Jaar, Forest Sword e The Haxan Cloak
Ouça: Golden Arrow, Heart e Paper Trails

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.