Resenha: “Skeleton Tree”, Nick Cave and The Bad Seeds

/ Por: Cleber Facchi 16/09/2016

Artista: Nick Cave and the Bad Seeds
Gênero: Alternativa, Pós-Punk, Experimental
Acesse: http://www.nickcave.com/

 

A dor sempre foi encarada como uma peça fundamental dentro de qualquer trabalho produzido por Nick Cave. Seja no romantismo amargo de Let Love In (1994), ou nos versos sangrentos que escorrem pelas canções de Murder Ballads (1996), basta um ouvido atento para perceber como o músico sempre dialogou de forma explícita com um universo de temas consumidos pela melancolia. Confissões, tormentos, medos e delírios angustiados que assumem um enquadramento ainda mais tocante em Skeleton Tree (2016, Bad Seed Ltd.), 16º registro da parceria com os integrantes do Bad Seeds e um fino retrato da poesia sorumbática que há décadas corrompe a discografia do cantor e compositor australiano.

Produzido em um intervalo de dois anos e gravado em diferentes estúdios, o sucessor do elogiado Push the Sky Away (2013) mostra a busca de Cave por som alimentado pelo uso de referências e temas eletrônicos. Sintetizadores, encaixes minimalistas e ruídos abafados, como uma extensão do material originalmente testado por Brian Eno em obras como Before and After Science (1977) e até mesmo por David Bowie no recente Blackstar (2016). Musicalmente, um registro silencioso, porém, turbulento e essencialmente doloroso em cada fragmento de voz.

Mergulhado em temas que falam sobre a morte, separação, saudade, culpa e aceitação, Skeleton Tree reflete com naturalidade a tristeza que tomou conta de Cave logo após o enterro do filho Arthur Cave, de 15 anos, morto após a queda de um penhasco no meio das gravações do trabalho. Ainda que parte expressiva das composições tenha sido finalizada antes do incidente, ainda em estúdio, Cave decidiu alterar os versos de determinadas canções, reforçando o caráter melancólico que sustenta o trabalho desde a abertura, com Jesus Alone, até a derradeira faixa-título.

Eu preciso de você / Em meu coração, eu preciso de você … Apenas respire, apenas respire”, desaba o compositor em I Need You. Sexta canção do disco, a faixa abastecida pelo uso de sintetizadores densos e batidas lentas funciona como uma perfeita representação de todo o material presente no interior do trabalho. Uma arrastada sequência de versos em que o músico australiano não apenas lamenta a morte precoce do próprio filho, como visita uma série de memórias nostálgicas, diferentes personagens e cenas entristecidas que dialogam com o sofrimento de qualquer indivíduo.

Em Jesus Alone, faixa de abertura do disco, a mesma atmosfera densa e poesia sufocante de Cave. Embora escrita em 2014, um ano antes do incidente envolvendo Arthur, lentamente a morte se apodera de cada verso da composição. “Você caiu do céu / Bateu e pousou em um campo … Você é um jovem em vigília / Coberto pelo sangue que não é seu”, lamenta Cave de forma quase profética. O mesmo conceito angustiado acaba se repetindo em outras composições do disco. Músicas como Girl in Amber, escrita para a esposa do cantor, Susie Bick, além de Distant Sky, faixa que conta com a participação da soprano dinamarquesa Else Torp.

Consumido pela dor, o trabalho de apenas oito faixas assume uma merecida posição de destaque dentro da extensa discografia de Cave. Em pouco menos de 40 minutos, tempo de duração do álbum, o cantor e compositor australiano conforta, perturba, acolhe e questiona o ouvinte a todo instante. Um doloroso e sensível tratado sobre a morte que se estende para além do domínio das composições, ponto de partida para as imagens de One More Time with Feeling (2016), documentário dirigido por Andrew Dominik e uma espécie de complemento visual para as músicas de Skeleton Tree.

 

Skeleton Tree (2016, Bad Seed Ltd.)

Nota: 9.0
Para quem gosta de: Tom Waits, Leonard Cohen e Swans
Ouça: I Need You, Distant Sky e Jesus Alone

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.