Cozinhando Discografias: Outkast

/ Por: Cleber Facchi 05/06/2024

A trajetória do Outkast pode até ser bastante curta, mas o impacto da obra de André 3000 e Big Boi continua reverberando até hoje. De Frank Ocean a Kendrick Lamar, de Pharrell Williams à Beyoncé, não são poucos os artistas que encontraram no som da dupla de Atlanta uma inesgotável fonte de inspiração. Formado no início da década de 1990, o projeto foi um dos responsáveis por alavancar o rap na região Sul dos Estados Unidos, além de levar o estilo para outras direções, efeito direto do olhar curioso dos dois artistas e criativo resgate do soul, funk e rock psicodélico produzido por músicos negros naos anos 1960 e 1970. Para celebrar a obra da dupla estadunidense, que segue em hiato de estúdio desde 2007, trago uma seleção organizando do pior para o melhor lançamento cada um dos discos do Outkast em mais uma edição do Cozinhando Discografias.


#6. Idlewild
(2006, LaFace)

O interesse de André 3000 e Big Boi em se aventurar musicalmente pelo cinema já era bastante antigo, porém, só se consolidou na segunda metade dos anos 2000, quando a dupla foi convidada a estrelar e assumir parte dos números musicais no filme Idlewild (2006), do diretor Bryan Barber. Como complemento ao material, os dois artistas produziram um disco de mesmo nome em que seguem de onde haviam parado em Speakerboxxx/The Love Below (2003). São canções como Morris Brown, Mighty “O” e Hollywood Divorce, completa pela participação de Lil Wayne e Snoop Dogg, porém, incapazes de alcançar o mesmo refinamento estético dos registros que o antecedem. Não por acaso, passado o lançamento do material, Big Boi anunciou que já estava em produção do primeiro álbum em carreira solo, Sir Lucious Left Foot: The Son of Chico Dusty (2010), deixando o Outkast em hiato até o ano de 2014, quando a dupla voltaria para uma série de apresentações ao vivo, porém, livre de qualquer perspectiva para uma nova empreitada em estúdio.


#5. Southern-playalisticadillacmuzik
(1994, Arista / LaFace)

André 3000 e Big Boi tinham apenas 18 anos quando entraram em estúdio para dar vida ao primeiro álbum do Outkast, Southernplayalisticadillacmuzik (1994). Contudo, a sensação que temos ao ouvir o disco hoje, três décadas depois de lançado, é a de que estamos de posse de uma obra feita por indivíduos muito mais experientes. Da rima consciente que contrasta com os excessos detalhados pelo gangsta rap no mesmo período, passando pela colorida combinação de estilos que vai do funk ao rock psicodélico, sobram momentos em que a dupla de Atlanta demonstra todo seu poderio. Alavancado por conta do sucesso de Player’s Ball, música que levou o duo ao topo da Billboard na categoria Hot Rap Songs, o trabalho ainda conta com acertos como Ain’t No Thang, Git Up, Git Out e demais composições que não apenas serviram para apresentar o som produzido pelos dois artistas, como pareciam antecipar uma série de elementos poéticos, rítmicos e instrumentais que seriam melhor detalhados nos registros seguintes. Que estreia!


#4. Speakerboxxx/The Love Below
(2003, Arista / LaFace)

Com o lançamento de Stankonia (2000), já havia ficado bastante claro o interesse dos membros do Outkast em seguir caminhos separados. Não por acaso, André 3000, que vinha se arriscando na carreira como ator, começou a trabalhar na produção de um disco solo totalmente voltado ao soul, jazz e funk, contrastando com Big Boi, que também vinha desenvolvendo canções totalmente voltadas ao rap. No meio desse processo criativo, os dois artistas uniram forças e decidiram fazer do quinto trabalho de estúdio do Outkast um álbum duplo, porém, com cada integrante assumindo uma das metades. Enquanto a primeira porção, Speakerboxxx, destaca o domínio criativo de Big Boi, traz canções como GhettoMusick e The Way You Move, além de parcerias com Jay-Z, Killer Mike e Cee-Lo Green, no bloco seguinte, The Love Below, André 3000 se aprofunda na construção de faixas altamente melódicas. São sucessos como Roses, Hey Ya! e Prototype, além de encontros com Norah Jones, Kelis e Rosario Dawson. Uma deliciosa combinação de estilos que não apenas fez com que a dupla se transformasse em um fenômeno global, alcançando o topo das principais paradas de sucesso em diferentes países, como garantiria ao disco o título de Álbum do Ano e Melhor Álbum de Rap no Grammy do ano seguinte. Era a consolidação da dupla norte-americana e, ao mesmo tempo, o princípio do fim.


#3. ATLiens
(1996, Arista / LaFace)

Depois de vagar poeticamente pelas ruas de Atlanta com o primeiro álbum de estúdio, André 3000 e Big Boi buscavam por novas direções no segundo disco de inéditas do Outkast. Com maior liberdade criativa e investimento por parte da gravadora, a dupla levou mais de um ano até finalizar o registro que se destaca pelo uso de temas místicos e personagens futuristas que levariam o projeto em direção ao cosmos, conceito reforçado durante toda a execução de ATLiens (1996). São pouco menos de 60 minutos em que os dois rappers não apenas rompem com o que vinha sendo produzido no hip-hop da Costa Leste e Costa Oeste dos Estados Unidos, como consolidam a própria identidade artística e fazem da cidade de origem o epicentro da música produzida na região Sul do país. Comercialmente bem-sucedido, o trabalho mais uma vez contou com produção assinada pelos membros do Organized Noize, porém, possibilitou aos duo a chance de assinar integralmente suas primeiras criações, caso de Elevators (Me & You) e Jazzy Belle, que tiveram ótimo desempenho nas paradas de sucesso. Era o princípio de um dos períodos criativos mais férteis na carreira do Outkast.       


#2. Stankonia
(2000, Arista / LaFace)

Em 1998, entre os intervalos das sessões que deram origem ao álbum Aquemini, os membros do Outkast aproveitaram para montar o próprio estúdio. Batizado de Stankonia, uma palavra criada a partir de uma gíria para funk (“stank“) e um planeta fictício (“Plutonia“) em um pôster de André 3000, o título parecia indicar a direção retrofuturista seguida pelos dois artistas. Sem a pressão do tempo e com maior liberdade em estúdio, Big Boi se aprofundou na construção das rimas, porém, teve de se adaptar ao novo estilo do parceiro de criação que, desencantado com o rap, voltou ainda mais seus esforços para uma sonoridade melódica que incorporava elementos de soul, funk e da música psicodélica dos anos 1970. Vem justamente dessa abordagem contrastante o estímulo para a formação de um repertório que inclui o sucesso Ms. Jackson, a parceria com Killer Mike, em Snappin’ & Trappin, So Fresh, So Clean e a insana B.O.B, composição que mais uma vez levou o som produzido pelo Outkast para outras direções. Um exercício puramente experimental, mas que mais uma vez caiu nas graças do público e mais uma vez reforçou a imagem da dupla de Atlanta como uma das mais importantes e influentes do gênero.


#1. Aquemini
(1998, Arista / LaFace)

No final da década de 1990, o rap se encaminhava para um modelo de produção cada vez mais enxuto, com artistas e produtores se aglomerando em frente a telas de computadores. Não era o caso de André 3000 e Big Boi. Com a boa repercussão em torno de ATLiens (1996), a dupla teve ainda mais liberdade criativa, tempo e dinheiro para investir no terceiro álbum de inéditas do Outkast. O resultado desse processo está na entrega de Aquemini (1998), trabalho que não apenas destaca o papel dos dois artistas como produtores, assumindo parte expressiva do repertório em estúdio, como ainda abre passagem para um seleto time de instrumentistas, longas sessões de improvisos e diálogos com nomes importantes como George Clinton, Cee Lo Green, Raekwon e Erykah Badu. Com título inspirado pela combinação entre os signos dos dois rappers, aquário (Big Boi) e gêmeos (André 3000), o álbum continua a se aventurar pelos temas cósmicos do disco anterior, porém, estabelece nessa dualidade e vivências de cada realizador o estímulo para a formação de músicas como ​​Rosa Parks, SpottieOttieDopaliscious, Skew It on the Bar-B e demais composições que levariam a dupla a vender mais de três milhões de cópias do disco somente nos Estados Unidos. Um delirante e meticuloso exercício criativo que vai da construção das rimas a cada mínimo fragmento instrumental.   

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.