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Crítica

Atalhos

: "A Tentação do Fracasso"

Ano: 2022

Selo: Costa Futuro

Gênero: Rock, Dream Pop

Para quem gosta de: Apeles e Terno Rei

Ouça: A Tentação do Fracasso e Te Encontrei em SP

7.8
7.8

Atalhos: “A Tentação do Fracasso”

Ano: 2022

Selo: Costa Futuro

Gênero: Rock, Dream Pop

Para quem gosta de: Apeles e Terno Rei

Ouça: A Tentação do Fracasso e Te Encontrei em SP

/ Por: Cleber Facchi 31/03/2022

A pergunta levantada por Gabriel Soares nos minutos iniciais de Monica Vitti, penúltima composição de A Tentação do Fracasso (2022, Costa Futuro), diz muito sobre a postura sóbria, por vezes pessimista, adotada pelos integrantes da Atalhos durante toda a execução do material. “Será que traz algum alívio / Saber que acaba mal pra todo mundo?“, questiona o vocalista. Na contramão de outros nomes da cena paulistana, consumidos pelo amor romântico e conflitos típicos de jovens adultos, a banda, completa pelo músico Conrado Passarelli, convence pelo domínio técnico e esforço claro em incorporar diferentes temáticas.

Parte desse resultado vem do longo processo de amadurecimento vivido pela banda ao longo dos anos. Com mais de uma década de carreira, o duo sustenta no peso da memória, encontros e desencontros o estímulo para a formação de um repertório que se revela ao público em uma medida própria de tempo. Não por acaso, a banda fez da própria faixa-título uma das primeiras músicas a serem apresentadas ao público. Enquanto guitarras e batidas rápidas se entrelaçam de forma ritmada, camadas de sintetizadores, ruídos e texturas soturnas garantem maior profundidade à canção que trata de forma delicada sobre morte e libertação. “Finalmente não pensava em você / Eu caía, eu voava / A leveza me bastava“, canta.

Essa mesma interpretação realista sobre as relações humanas fica ainda mais evidente em Te Encontrei em SP, parceria com a cantora e compositora argentina Delfina Campos. “Eu posso até mudar / Mas não vale a pena / Você pode se apaixonar / E nós dois de novo não seria bom“, reflete. Claro que isso não interfere na produções de faixas marcadas pelo lirismo esperançoso, entrega e momentos de maior vulnerabilidade, contrastando com o restante da obra. “Quero entorpecer os sentidos / E tirar todo esse peso do meu peito / Quero entorpecer o que eu sinto / E aprender a ver as coisas de outro jeito“, detalha na crescente Teoría del Cuerpo Enamorado, bem-sucedida colaboração com o músico Mariano di Cesare (El Príncipe Idiota).

Sobrevive justamente nessa combinação de sentimentos, dores e experiências pessoais o estímulo para o fortalecimento da obra. Partindo de uma linguagem acessível, cada composição do disco parece pensada para estreitar a relação com o ouvinte, efeito direto do lirismo confessional que embala o desenvolvimento do trabalho até a música de encerramento, Ushuaia. A própria economia do repertório, com apenas oito faixas, torna tudo ainda mais interessante. Pouco menos de 40 minutos em que a dupla se distancia de possíveis excessos de forma a potencializar a construção dos versos e fina tapeçaria instrumental.

Outro aspecto bastante curioso diz respeito ao esforço da dupla em ampliar os limites da própria obra e estabelecer pequenas conexões com diferentes nomes da produção latino-americana. Além de Campos e Cesare, nas já citadas Te Encontrei em SP e Teoría del Cuerpo Enamorado, a banda paulistana contou com a interferência direta de Ives Sepúlveda, produtor do disco e uma das metades da banda chilena The Holydrug Couple. O resultado desse processo está na entrega de um registro que preserva traços da identidade criativa da Atalhos, porém, transporta o som produzido pelo duo para um novo território.

Essa mesma busca por novas possibilidades respinga na base instrumental que serve de sustento ao disco. Diferente do trabalho que o antecede, Animais Feridos(2017), marcado pelo uso de ambientações acústicas, A Tentação do Fracasso chama a atenção pelo uso atmosférico dos sintetizadores, evidente dinamismo da bateria e guitarras sempre carregadas de efeitos. Instantes em que a dupla esbarra na obra de artistas como The War On Drugs, diminuindo a sensação de ineditismo e originalidade do material, porém, preservando a potência dos versos que conduzem a experiência do ouvinte até os minutos finais.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.