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Crítica

Mitski

: "The Land Is Inhospitable and So Are We"

Ano: 2023

Selo: Dead Oceans

Gênero: Indie, Pop de Câmara

Para quem gosta de: PJ Harvey e Fiona Apple

Ouça: My Love Mine All Mine, I'm Your Man e Star

8.5
8.5

Mitski: “The Land Is Inhospitable and So Are We”

Ano: 2023

Selo: Dead Oceans

Gênero: Indie, Pop de Câmara

Para quem gosta de: PJ Harvey e Fiona Apple

Ouça: My Love Mine All Mine, I'm Your Man e Star

/ Por: Cleber Facchi 22/09/2023

The Land Is Inhospitable and So Are We (2023, Dead Oceans) é uma evidência incontestável do talento de Mitski. Longe dos sintetizadores eufóricos que marcam o registro anterior, Laurel Hell (2022), e livre de canções minimamente acessíveis, como Nobody e todo o repertório de Be The Cowboy (2018), obra que apresentou o trabalho da nipo-americana à uma parcela ainda maior de ouvintes, a cantora se concentra agora na entrega de um material marcado pelo reducionismo dos elementos. São canções em que limita a construção dos arranjos, porém, estabelece na força dos sentimentos o principal componente criativo.

Composição de abertura do trabalho, Bug Like an Angel sintetiza de forma bastante eficiente tudo aquilo que a cantora busca desenvolver ao longo da obra. Enquanto a guitarra econômico do produtor Patrick Hyland avança em uma captação crua, versos que alternam entre a embriaguez e a sobriedade refletem sobre vícios e as pequenas maldições que herdamos de nossos pais. “À medida em que fui crescendo, aprendi que bebo / Às vezes, uma bebida parece uma família“, confessa Mitski em tom entristecido, mas que em nenhum momento tende ao melodrama, indicativo do completo domínio e equilíbrio da musicista.

São canções que parecem geradas em noites de solidão e momentos de maior vulnerabilidade vividos pela artista, direcionamento que tem sido incorporado desde o introdutório Lush (2012), aprimorado em Puberty 2 (2016), mas que alcança melhor resultado no repertório de The Land Is Inhospitable and So Are We. A diferença em relação a outros trabalhos de Mitski, por vezes centrados em temas existenciais e reflexões sobre o conceito de feminino, diz respeito ao foco em um componente principal: o amor. É como se a musicista explorasse todos os aspectos, sejam eles positivos ou negativos, em torno do sentimento.

O resultado desse processo está na entrega de um repertório essencialmente amplo e ao mesmo tempo contido dentro dele mesmo. São canções que tratam sobre amores desfeitos, confessam sentimentos e detalham uma fragilidade poucas vezes antes vista mesmo dentro de uma obra marcada pela completa vulnerabilidade da compositora. “Meu amor aqui na terra / Me mostrou quanto valia meu coração / Então, quando chegar a minha vez / Você poderia iluminar aqui para ele?“, confessa em My Love Mine All Mine, música em que clama à Lua para que seu amor retorne à Terra em forma de luz mesmo após sua partida.

Interessante notar que mesmo ancorado em um único objeto temático, The Land Is Inhospitable and So Are We em nenhum momento soa como uma obra repetitiva. Parte desse resultado vem não apenas do esforço da artista em mesclar diferentes elementos metafóricos, como na sutileza cósmica explícita nos versos de Star, mas em explorar as múltiplas interpretações sobre o amor. “Você acredita em mim como um deus / Eu te traio como um homem“, canta em I’m Your Man, música em que brinca com a inversão de papéis dentro de uma relação, estrutura potencializada pela fina tapeçaria instrumental, captações de campo e latidos de cães que levam o trabalho para uma outra direção, ampliando consideravelmente os rumos do material.

Vem justamente desses momentos de maior ebulição, como uma fuga do reducionismo talvez excessivo que orienta o trabalho, a real força de The Land Is Inhospitable and So Are We. Da bateria ascendente que ganha forma em The Deal, passando pelos arranjos de cordas e coro de vozes de When Memories Snow, tudo muda em um intervalo de poucos segundos, rompendo com a serenidade indicada pela cantora logo na introdutória Bug Like an Angel. É como se Mitski jogasse com a completa imprevisibilidade das próprias emoções. Um misto de calmaria e caos que traduz em forma de música a força avassaladora do amor.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.