Cozinhando Discografias: Pavement

/ Por: Cleber Facchi 09/06/2014

Por: Cleber Facchi

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A seção Cozinhando Discografias consiste basicamente em falar de todos os álbuns de um artista, ignorando a ordem cronológica dos lançamentos. E qual o critério usado então? A resposta é simples, mas o método não: a qualidade. Dentro desse parâmetro temos uma série de fatores determinantes envolvidos, que vão da recepção crítica do disco no mercado fonográfico, além, claro, dentro da própria trajetória do grupo e seus anteriores projetos. Vale ressaltar que além da equipe do Miojo Indie, outros blogs parceiros foram convidados para suas específicas opiniões sobre cada um dos trabalhos, tornando o resultado da lista muito mais democrático e pontual.

Formado ao final dos anos 1980 e atuante até o fim da década seguinte, o grupo californiano Pavement talvez seja a melhor representação do rock (alternativo) nos anos 1990. Adepta de gravações caseiras, arranjos sujos e versos marcados pela subjetividade, a banda comandada por Stephen Malkmus e Scott Kannberg fez da curta produção de cinco discos, o princípio para uma das discografias mais apreciadas e influentes do período. Da estreia com Slanted and Enchanted (1992), até o derradeiro Terror Twilight (1999), colocamos toda obra do grupo em ordem, do pior para o melhor disco em mais uma edição do nosso especial.

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#05. Brighten the Corners
(1997, Matador)

O completo desapego da banda, além do uso abusivo de drogas durante a produção de Wowee Zowee forçou um maior controle do selo Matador em Brighten the Corners. Quarto trabalho em estúdio do Pavement, o disco soa como um regresso evidente aos conceitos assumidos em Crooked Rain, Crooked Rain, de 1994, aspecto ressaltado nos arranjos coesos e melodias de vozes (quase) sempre harmônicas. Ainda que conduzido pelos ouvidos atentos e regras do próprios selo, o disco de 1997 está longe de parecer menor ou pouco autêntico dentro da curta obra do grupo. Tendo na inaugural Stereo um componente de forte comunicação com o público médio, Malkmus e Kannberg se dividem na formação de uma obra guiada pelo equilíbrio. Livre dos prováveis exageros de seu antecessor, é possível encontrar desde faixas íntimas dos primeiros álbuns (Passat Dream), até canções ambientadas nessa “nova fase” (Date With IKEA). A constante mudança de direção dos versos ainda serve de estímulo para a banda, que mesmo guiada comercialmente, consegue evitar o nascimento de um disco plastificado.

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#04. Terror Twilight
(1999, Matador)

Segundo informações da banda, Terror Twilight – em português, Terror do Crepúsculo – é o momento do dia entre o por do sol e o começo da noite em que metade dos carros andam com os faróis acesos e outra metade não. Um instante crítico, perfeito para que acidentes aconteçam a qualquer momento. Com o relacionamento dos integrantes cada vez mais instável, não poderia existir um título mais exato para o quinto e último registro em estúdio do Pavement. Ainda que os interesses de Stephen Malkmus e Scott Kannberg, líderes do grupo, estivessem apontados para fora da banda, a construção do último álbum se revela de forma assertiva, como toda a produção prévia do Pavement. Responsável por manter a chama do público acesa, Terror Twilight equilibra composições excêntricas (Cream of Gold) e faixas essencialmente melódicas, caso de Spit on a Stranger e Major Leagues, responsáveis por apresentar o trabalho do grupo para toda uma nova geração de ouvintes. Ato final do grupo, o álbum evidencia o completo amadurecimento do coletivo, consciente das próprias possibilidades conquistadas em estúdio, bem como no uso dos arranjos e letras versáteis. A década de 1990 acaba aqui.

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Pavement

#03. Wowee Zowee
(1995, Matador)

Se você analisar os versos de cada música do Pavement, não é difícil perceber que pouco do que é explorado por Stephen Malkmus faz realmente sentido. Contudo, mesmo dentro desse cenário guiado pelo nonsense, ao apresentar o terceiro álbum de estúdio em 1995, a banda conseguiu ultrapassar os limites da própria excentricidade. Contrariando a estrutura melódica e a variedade de hits alcançados no álbum anterior, Crooked Rain, Crooked Rain (1994), Wowee Zowee cresce como uma representação dos exageros lisérgicos de seus criadores. Encoberto por uma densa nuvem de maconha, o registro de 18 faixas mais parece uma coleção de ideias avulsas lançadas por um indivíduo chapado – o que não deixa de ser verdade. Mesmo que a essência do disco seja a mesma dos primeiros trabalhos da banda, o descompromisso das canções gera uma obra de proposital incoerência, exigindo tempo do ouvinte até ser “compreendida”. Não por acaso, Wowee Zowee foi ignorado pelo público e atacado pela imprensa na época do seu lançamento, sendo redescoberto anos mais tarde e eleito como uma das obras-primas do grupo.

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Pavement

#02. Slanted and Enchanted
(1992, Matador)

Com Nevermind (1991), o aclamado álbum do Nirvana, no topo das paradas de sucesso, imprensa e público não tardaram a voltar os ouvidos para a cena alternativa que crescia de forma copiosa nos Estados Unidos. Todavia, longe das redundâncias e em um sentido contrário ao que ocupava parte da musica da época – principalmente em Seattle -, Stephen Malkmus, Scott Kannberg e Gary Young transformaram a estreia do estreia do Pavement em um recorte tão hermético, que beira a esquizofrenia. Letras guiadas por temas nonsense, melodias sujas e inexatidão, do momento em que tem início até o último ato, Slanted and Enchanted é a passagem para um universo (talvez) desvendado apenas por seus criadores. O isolamento estético e lírico do álbum, entretanto, não dificultou a aceitação do trabalho por parte do público da época. Gravado em apenas sete dias na garagem de Young e inicialmente distribuído em fitas cassete, o álbum logo foi anexado ao selo Matador que se encarregou da distribuição da obra. Duas décadas depois de lançado, Slanted and Enchanted mantém na própria capa a beleza de seu significado: você não vai entender, mas vai gostar do mesmo jeito.

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Pavement

#01. Crooked Rain, Crooked Rain
(1994, Matador)

Enquanto Slanted and Enchanted revelou toda a complexidade (e estranheza) assumida pelo Pavement, Crooked Rain, Crooked Rain reforçou o oposto. Obra responsável por apresentar a banda ao “grande” público, o segundo álbum do recém-formado quinteto é um registro de possibilidades. Musicalmente polido em relação ao debut caseiro, o álbum ultrapassa os limites da crueza inicialmente sustentada pela banda, agora capaz de brincar com o Jazz – como em 5-4=Unity, homenagem ao pianista Dave Brubeck -, além de focar em melodias aprazíveis. Casa de algumas das canções mais conhecidas do grupo – como Unfair, Range Life, Cut Your Hair e Gold Soundz -, o trabalho gravado em menos de um mês é a prova de que uma banda não precisa romper com a própria essência para soar acessível.

Enquanto as guitarras de Scott Kannberg reforçam a estrutura do disco, Stephen Malkmus esbanja bom humor na assinatura dos versos, guiando com ironia grande parte das canções. Aproveitando do isolamento da banda em relação ao cenário musical da época, o compositor se diverte ao atacar grupos como Smashing Pumpkins e Stone Temple Pilots, postura que forçou inimizades, mas agradou em cheio o público da banda. Ora intenso (Unfair), ora sustentado pela leveza (Heven Is a Truck), Crooked Rain é uma obra marcada pela colagem de referências – Jazz, Pós-Punk, Country -, mas que em nenhum momento exclui a identidade excêntrica da própria banda.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.