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Crítica

Arca

: "KiCk iiii"

Ano: 2021

Selo: XL

Gênero: Experimental, Pop, Eletrônica

Para quem gosta de: SOPHIE, Björk, Lotic

Ouça: Queer, Boquifloja e Xenomorphgirl

8.0
8.0

Arca: “KiCk iiii”

Ano: 2021

Selo: XL

Gênero: Experimental, Pop, Eletrônica

Para quem gosta de: SOPHIE, Björk, Lotic

Ouça: Queer, Boquifloja e Xenomorphgirl

/ Por: Cleber Facchi 09/12/2021

Desde que deu início à série KiCk, ainda no último ano, Alejandra Ghersi, a Arca, tem feito de cada novo lançamento um precioso exercício criativo. Enquanto o registro inicial parecia aberto ao diálogo com diferentes colaboradoras, caso de Björk, Rosalía e SOPHIE, com a chegada de KiCk ii (2021), há poucos dias, a produtora venezuelana decidiu investir na combinação de ritmos e elementos da cultura latina, marca de músicas como Rakata e Prada. Nada que se compare ao completo experimentalismo de KiCk iii (2021), com suas batidas inexatas, ruídos e quebras bruscas, base para composições como Incendio e Electra Rex.

Em KiCk iiii (2021, XL), quarto e mais recente registro da série, a artista venezuelana segue de onde parou no lançamento anterior, porém, livre de qualquer traço de urgência. Como indicado logo na música de abertura do trabalho, a atmosférica Whoresong, parte expressiva do álbum se revela ao público em uma medida própria de tempo. São pianos sempre carregados de efeitos, texturas e vozes granuladas que tensionam a experiência do ouvinte na mesma proporção em que geram uma estranha sensação de acolhimento, estrutura que orienta o processo de construção do disco até a música de encerramento, Paw.

E isso fica bastante evidente na delicada Boquifloja. Composição mais extensa do disco, a faixa preserva uma série de elementos bastante característicos da obra de Arca, como as vozes sempre carregadas de efeitos e ruídos metálicos, porém, partindo de uma abordagem completamente distinta. São guitarras atmosféricas e versos que se distanciam do habitual encaixe rítmico adotado pela cantora, vide o material entregue no registro anterior. Instantes em que a produtora se despe de possíveis excessos para estreitar a relação com o ouvinte, conceito que acaba se refletindo em diversos outros momentos ao longo do álbum.

Exemplo disso acontece em Lost Woman Found. Próxima ao encerramento do disco, a canção parte de uma reflexão sobre o processo de transição de gênero da artista venezuelana, mas acaba esbarrando em outros conceitos e temas existencialistas. “E menina, estou procurando um milagre / Eu tenho caminhado tanto tempo / A primeira vez que senti o sol na minha pele / É meu agora“, detalha. Mesmo quando estreita a relação com Shirley Manson, vocalista do Garbage, em Alien Inside, Arca mantém firme o mesmo direcionamento estético e atmosfera melancólica que vai da construção dos arranjos ao uso das vozes.

Nada que prejudique a construção de faixas ainda íntimas dos antigos trabalhos de Arca. É o caso da já conhecida Queer. Completa pela participação da produtora, cantora e compositora inglesa Planningtorock, a música ganha forma em meio a sobreposições contrastantes e quebras que pervertem o pop tradicional. A própria Xenomorphgirl, entregue minutos antes, cresce em meio a captações etéreas e ambientações labirínticas que convidam o ouvinte a se perder em um ambiente de estruturas inexatas, proposta que dialoga de maneira particular com a obra de artistas como Clams Casino e Oneohtrix Point Never.

É justamente essa capacidade de Arca em se distanciar dos últimos lançamentos, porém, preservando traços da própria identidade, que torna a experiência de ouvir KiCk iiii tão satisfatória. Como indicado nos minutos iniciais do registro, trata-se de uma obra totalmente imersiva, feita para ser desvendada e lentamente absorvida pelo ouvinte. Composições que transitam por diferentes estilos e colaboradores, como o compositor Oliver Coates, em Esuna, mas que em nenhum momento se distanciam do universo particular que tem sido detalhado pela cantora e produtora venezuelana desde o início da carreira.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.