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Crítica

Black Country, New Road

: "For the First Time"

Ano: 2021

Selo: Ninja Tune

Gênero: Pós-Punk, Art Rock, Pós-Rock

Para quem gosta de: Black Midi e King Krule

Ouça: Track X e Sunglasses

8.0
8.0

Black Country, New Road: “For the First Time”

Ano: 2021

Selo: Ninja Tune

Gênero: Pós-Punk, Art Rock, Pós-Rock

Para quem gosta de: Black Midi e King Krule

Ouça: Track X e Sunglasses

/ Por: Cleber Facchi 10/02/2021

De tempos em tempos, a cena britânica oferece ao público algum novo exemplar que preserva a essência de outros registros próximos, mas que parece seguir por uma trilha pouco convencional. Foi assim com Go Tell Fire to the Mountain (2011), do Wu Lyf, The Ooz (2017), do King Krule e, mais recentemente, Schlagenheim (2019), do Black Midi. Trabalhos que apontam para a obra de veteranos como Public Image Ltd. e Wire, porém, utilizam de uma linguagem completamente anárquica, conceito que acaba se refletindo com bastante naturalidade no primeiro álbum de estúdio do coletivo Black Country, New Road, For the First Time (2021, Ninja Tune).

Hoje formado por Isaac Wood (voz, guitarras), Tyler Hyde (baixo), Lewis Evans (saxofone), Georgia Ellery (violino), May Kershaw (teclados), Charlie Wayne (bateria) e Luke Mark (guitarras), o grupo londrino lançou há dois anos a extensa Sunglasses, faixa que não apenas reflete parte da identidade criativa da banda inglesa, como orienta a experiência do ouvinte durante toda a execução da presente obra. São canções que se espalham em uma medida própria de tempo, sem pressa, estrutura que oferece ao coletivo a chance de brincar com as possibilidades dentro de estúdio e fazer de cada composição a passagem para um ambiente deliciosamente torto e imprevisível.

Nesse cenário onde tudo e nada pode acontecer, cada composição se transforma em um objeto de destaque. E isso pode ser percebido logo nos primeiros minutos do trabalho, em Athens, France. Passada a instrumental e talvez deslocada música de abertura, Wood e seus parceiros de banda se concentram na produção de um repertório que presta homenagem aos clássicos e ainda brinca com a fragmentação constante das ideias. São ambientações jazzísticas, versos declamados e a linha de baixo que evoca veteranos como Slint e The Dismemberment Plan, mas que a todo momento regressa a um território particular do coletivo britânico.

Parte desse resultado vem da forma como Wood utiliza dos versos como passagem esse domínio próprio. São letras descritivas, cenas e acontecimentos que incorporam vivências reais, porém, a todo momento mergulham em uma espiral de temas delirantes que se conectam diretamente à base instrumental do disco. Exemplo disso acontece na principal faixa do álbum, Science Fair. Pouco mais de seis minutos em que somos confrontados por relacionamentos instáveis (“E você acabou queimando / Eu sinto muito / Eu sempre fui uma mentiroso“), conflitos intimistas (“Ainda moro com minha mãe / Conforme passo de um microinfluenciador para outro“) e a visão amarga do vocalista sobre a nossa sociedade (“E nada a perder, nasci para correr / É um país escuro lá fora“).

Mesmo nos momentos de maior leveza da obra, como na confessional Track X, o grupo mantém firme um lirismo bastante similar. “Eu tentei o meu melhor para me manter à tona / Depois que eu fiz o sacrifício em seu nome / Na mesma sala onde transamos quando crianças / Com Abraham e Isaac e todos os meus maiores sucessos“, canta em meio a experimentações sutis e melodias atmosféricas que apontam para a obra de Arthur Russell. A própria música de encerramento do álbum, Opus, parte de uma base contida, porém, cresce na costura dos elementos, ruídos e quebras conceituais que ampliam tudo aquilo que foi apresentado em Sunglasses e Science Fair.

Produto da criativa sobreposição de ideias, referências e escolhas criativas compartilhadas de cada integrante da banda, For the First Time utiliza do acabamento torto dado às canções como precioso elemento de amarra conceitual durante toda a execução da obra. São canções que partem da poesia desconcertante de Wood, porém, crescem na lenta combinação de metais, arranjos de cordas, camadas de sintetizadores e outros pequenos acréscimos que potencializam o trabalho do Black Country, New Road. Um atravessamento constante de informações e busca por novas possibilidades, proposta que define a essência do grupo britânico e ainda deixa o caminho aberto para os futuros lançamentos do coletivo.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.