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Crítica

Destroyer

: "Have We Met"

Ano: 2020

Selo: Merge / Dead Oceans

Gênero: Indie, Synthpop, Soft Rock

Para quem gosta de: Broken Social Scene e Bon Iver

Ouça: Cue Synthesizer e It Just Doesn’t Happen

8.5
8.5

Destroyer: “Have We Met”

Ano: 2020

Selo: Merge / Dead Oceans

Gênero: Indie, Synthpop, Soft Rock

Para quem gosta de: Broken Social Scene e Bon Iver

Ouça: Cue Synthesizer e It Just Doesn’t Happen

/ Por: Cleber Facchi 04/02/2020

Difícil olhar para a extensa produção de Dan Bejar na última década e não entender toda a seleção de obras apresentadas pelo artista canadense como parte de um único registro. Do amadurecimento instrumental e poético que embala as canções do atmosférico Kaputt (2011), passando pelo espírito decadente de Poison Season (2015), trabalho em que busca inspiração em grandes musicais da Broadway, elementos do jazz clássico e até nos livros de Clarice Lispector (1920 – 1977), cada fragmento criativo se entrelaça de forma complementar. Composições marcadas pela melancolia dos temas e permanente sensação de isolamento vivida pelo eu lírico, estrutura que ganha ainda mais destaque no soturno Have We Met (2020, Merge / Dead Oceans).

Sequência ao material entregue no também referencial Ken (2017), registro inspirado pelas canções de Morrissey, The Cure e outros nomes de destaque da década de 1980, Have We Met é, parta todo os efeitos, um resgate conceitual de tudo aquilo que foi produzido para o Destroyer nos últimos dez anos. Concebido de forma caseira, em meio a captações noturnas na cozinha de Bejar, o álbum encontrou na produção minuciosa de John Collins (The New Pornographers, Tegan and Sara), parceiro de longa data do artista, um importante componente criativo para o fortalecimento da obra. Em um intervalo de mais de três meses, Collins se dedicou a inserir camadas instrumentais, ruídos e pequenas variações melódicas extraídas de sessões descartadas dos antigos trabalhos da banda, como o uso de metais detalhados em Kaput e arranjos de cordas em Poison Season.

O resultado desse forte comprometimento estético está na entrega de uma obra que exige ser desvendada. Do momento em que tem início, na atmosférica Crimsom Tide, até alcançar a derradeira Foolssong, com suas camadas de sintetizadores e versos enigmáticos, tudo parece pensado para captura a atenção do ouvinte, convidado a se perder em um universo de pequenas ambientações lisérgicas e formas delirantes. Exemplo disso está em The Television Music Supervisor, composição que parte das inquietações de um personagem em seu leito de morte para mergulhar em uma nuvem de sons fantasmagóricos e vozes carregadas de efeitos. São texturas abafadas, ruídos e vozes tratadas como instrumentos, conceito que se reflete durante toda a execução do álbum, como em University Hill e na própria faixa-título do disco.

Entretanto, é justamente quando rompe com qualquer traço de morosidade, como em It Just Doesn’t Happen, que Have We Met de fato diz a que veio. “Você está bem, apesar da luz / E o ar e a hora da noite / Eles tocam sua música favorita … Você lança um olhar venenoso em direção ao Sol / Você sabe que isso simplesmente não acontece com ninguém“, canta enquanto sintetizadores destacados, guitarras e batidas firmes fazem lembrar de veteranos como Soft Cell e Orchestral Manoeuvres in the Dark. Instantes em que Bejar costura passado e presente para revelar a imagem de uma musa imaginária, sempre misteriosa, proposta que embala os trabalhos do músico norte-americano há mais de duas décadas, vide obras como City of Daughters (1998) e Destroyer’s Rubies (2006).

O mesmo direcionamento conceitual e força criativa acaba se refletindo em outros momentos no decorrer da obra. São faixas como Cue Synthesizer e The Raven, canções em que Bejar e seus parceiros de banda, entre eles, o guitarrista Nicolas Bragg, parecem jogar com os instantes, revelando intrincadas camadas de sintetizadores, guitarras carregadas de efeitos e melodias picotadas, como um permanente resgate de tudo aquilo que o Destroyer tem produzido desde a extensa Bay of Pigs (2009), canção que prepara o terreno para o material apresentado em Kaputt.

Fortemente influenciado pela trilha sonora de clássicos dos anos 1980, como O Sol da Meia-Noite (1985) e A Garota de Rosa Shocking (1986), Have We Met parte de uma atmosfera nostálgica como forma de dialogar com o ouvinte. Da inserção das guitarras ao resgate de melodias empoeiradas, do minimalismo da percussão ao uso de versos semi-declamados, lembrando o trabalho de Leonard Cohen, em I’m Your Man (1988) e You Want It Darker (2016), poucas vezes antes Dan Bejar pareceu exercer tanto domínio sobre a própria obra quanto no presente disco. São composições que se espalham em uma trama de pequenos detalhes e retalhos conceituais extraídos de diferentes décadas e tendências, estrutura que faz de Have We Met um novo e delicado exercício de apresentação por parte do grupo canadense.


Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.