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Crítica

Fred Again..

: "Actual Life (April 14 – December 17 2020)"

Ano: 2021

Selo: Again.. Records

Gênero: Eletrônica, UK Garage, R&B

Para quem gosta de: Jamie XX, The 1975 e Jai Paul

Ouça: Me (Heavy) e Big Hen (Steal My Joy)

7.8
7.8

Fred Again..: “Actual Life (April 14 – December 17 2020)”

Ano: 2021

Selo: Again.. Records

Gênero: Eletrônica, UK Garage, R&B

Para quem gosta de: Jamie XX, The 1975 e Jai Paul

Ouça: Me (Heavy) e Big Hen (Steal My Joy)

/ Por: Cleber Facchi 11/05/2021

Nos últimos meses, não foram poucos os artistas que buscaram encapsular as angústias vividas durante o período de isolamento social em seus trabalhos. Do enclausuramento temático proposto por Charli XCX, em How I’m Feeling Now (2020), passando pela atmosfera densa de Great Spans of Muddy Time (2021), de William Doyle, sobram registros que propõe discussões importantes sobre o impacto da Covid-19 nas relações pessoais, dores, romances e experiências vividas por indivíduos espalhados pelos quatro cantos do planeta. Entretanto, mesmo nesse cenário tão prolífico, poucos parecem ter explorado essa mesma temática com tamanha naturalidade quanto o produtor britânico Fred Again.. nas canções de Actual Life (April 14 – December 17 2020) (2021, Again.. Records).

Conhecido pelas criações em parceria com nomes importantes da cena inglesa, como Stormzy e Ed Sheeran, Fred John Philip Gibson, verdadeiro nome do produtor que lançou há poucos meses o colaborativo Gang (2020), trabalho com Headie One que ainda contou com FKA Twigs, Sampha e Jamie XX, faz do presente álbum uma espécie de diário do caos vivido desde o último ano. São canções produzidas a partir de mensagens de áudio enviadas pelo celular, cenas do cotidiano e experiências pessoais registradas pelo artista desde que a Inglaterra se fechou para conter o avanço da pandemia. Um exercício puramente pessoal, direcionamento que vai da selfie que ilustra a imagem da capa ao tratamento dado às batidas, melodias e fragmentos de vozes que recheiam o disco.

Entretanto, longe de sufocar pela melancolia dos tempos sombrios em que vivemos, Fred Again.. utiliza do álbum como uma obra esperançosa. “Esse é um dos melhores dias da minha vida, meu cara, o que tenho a dizer? Nós vamos passar“, diz a voz sorridente que inaugura o disco, em April 14th 2020, apontando a direção seguida pelo produtor ao longo da obra. São retalhos confessionais, ruídos e captações caseiras que falam sobre saudade e a necessidade de se reencontrar, conceito que tinge com sorrisos tímidos parte expressiva do trabalho. “Mal posso esperar para ver seu rosto de novo“, repete em Yasminah (See Your Face Again), música que parte do uso calculado das batidas para se transformar mantra efusivo, como uma fuga temporária da realidade e permanente busca por afeto.

Claro que isso não interfere na produção de faixas essencialmente sóbrias, por vezes consumidas pela melancolia do período em que o trabalho foi produzido. Exemplo disso no que talvez seja a principal música do disco, Me (Heavy). “Não vai demorar muito / E eu sei que você está segurando / Estou tão cansada de ser forte“, confessa em meio a sintetizadores submersos, ruídos e captações caseiras, proposta que naturalmente aponta para as criações de conterrâneos como Jai Paul e Tirzah, porém, preservando o uso fragmentado das ideias e elementos que parecem apontar para o experimental 22, a Million (2016), de Bon Iver. O próprio músico norte-americano é citado pelo produtor inglês minutos à frente, em December 17th 2020, composição que utiliza de trechos de 22 (OVER S∞∞N).

Mesmo quando se entrega ao uso de temas dançantes, Fred Again.. parece alcançar um ponto de equilíbrio entre a construção sorumbática dos versos e o dinamismo proposto nas batidas. É o caso de Kyle (I Found You), logo na abertura do disco. Partindo de uma respiração ofegante, o produtor incorpora trechos de Love in the Time of Undeath, do poeta Guante, porém, estabelece no uso destacado dos sintetizadores e micro-ambientações um importante componente de ruptura criativa. Esse mesmo resultado acaba se refletindo em outros momentos ao longo do trabalho. Canções como Big Hen (Steal My Joy) e Sabrina (I Am A Party) em que o produtor convida o ouvinte a dançar, mesmo preservando a essência melancólica que serve de sustento ao restante do álbum.

Não por acaso, Fred Again.. decidiu encerrar o disco com a já conhecida Marea (We’ve Lost Dancing). Composta em parceria com a produtora The Blessed Madonna, a canção nasce como uma reflexão agridoce e política sobre o período longe das pistas, porém, funciona como um precioso elemento de fuga da realidade, transportando a mente do ouvinte para um cenário de luzes estroboscópicas e momentos de maior euforia. É justamente essa dualidade que torna a experiência de ouvir o trabalho tão satisfatória. Composições que vão das angústias vividas durante o período de isolamento social à permanente busca por libertação, proposta que não apenas dialoga, como potencializa de maneira sensível tudo aquilo que grande parte dos indivíduos têm vivido desde o último ano.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.