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Crítica

Godspeed You! Black Emperor

: "G d's Pee at State's End!"

Ano: 2021

Selo: Constellation

Gênero: Pós-Rock, Experimental, Instrumental

Para quem gosta de: Silver Mt. Zion e Mogwai

Ouça: Job's Lament e Government Came

8.0
8.0

Godspeed You! Black Emperor: “G d’s Pee at State’s End!”

Ano: 2021

Selo: Constellation

Gênero: Pós-Rock, Experimental, Instrumental

Para quem gosta de: Silver Mt. Zion e Mogwai

Ouça: Job's Lament e Government Came

/ Por: Cleber Facchi 09/04/2021

Mesmo na completa ausência de palavras, a música produzida pelo Godspeed You! Black Emperor sempre foi encarada como um importante componente de enfrentamento político. Desde a fundação do coletivo canadense, no início dos anos 1990, os músicos Efrim Menuck, Mike Moya e Mauro Pezzente mantiveram o forte discurso anti-imperialista, defesa a grupos marginalizados e imigrantes no material de lançamento de cada trabalho, direcionamento reforçado no uso estratégico de captações de campo, cânticos e inserções pontuais que surgem e desaparecem em parte expressiva das canções apresentadas pelo coletivo de Montreal. Um turbulento e sempre necessário exercício criativo que ganha novo resultado com a chegada de G d’s Pee at State’s End! (2021, Constellation).

Sétimo e mais recente trabalho de estúdio do grupo norte-americano, o sucessor de Luciferian Towers (2017), de onde vieram músicas como Anthem for No State e Fam/Famine, traz de volta parte da atmosfera densa que marca os primeiros registros autorais da banda, principalmente o cultuado F♯ A♯ ∞ (1997). São incontáveis camadas de guitarras e texturas que se revelam ao público em uma medida própria de tempo, estrutura que se completa pelo uso de interferências ruidosas, vozes extraídas de transmissões de rádio e momentos de maior contemplação. É como passear em um ambiente pós-apocalíptico, porém, repleto de escombros e formas que estranhamente fazem lembrar de uma antiga civilização, conceito anteriormente testado em Allelujah! Don’t Bend! Ascend! (2012).

Conceitualmente dividido em quatro blocos específicos de canções, G d’s Pee at State’s End! estabelece em temas como o fim das prisões, a retirada do poder policial e a taxação dos ricos um estímulo para cada novo movimento do coletivo canadense. E isso se reflete nos mais de 20 minutos que costuram A Military Alphabet (five eyes all blind) (4521.0kHz 6730.0kHz 4109.09kHz), Job’s Lament, First of the Last Glaciers e Where we break how we shine (Rockets for Mary). São guitarras ascendentes, disparos de tiros e pregações religiosas que se espalham de forma sempre inexata, torta, como uma representação estética e instrumental do caos político vivido nos últimos anos. Instantes em que a banda traz de volta a essência dos antigos trabalhos, porém, utilizando de uma força e brutalidade poucas vezes antes vista em toda a sequência de obras produzidas pelo GY!BE.

Não por acaso, o ato seguinte, representado pela solitária Fire at Static Valley, funciona como um respiro em relação ao bloco inicial do disco. Com o exceção dos sons de sirenes, explícitos logo nos minutos iniciais da composição, tudo soa como uma parcial fuga do restante da obra, lembrando os temas melódicos de Lift Your Skinny Fists Like Antennas to Heaven (2000) e Yanqui U.X.O. (2002). Entretanto, mais do que uma quebra conceitual, a canção estabelece nas cordas de Sophie Trudeau, responsável pelos temas orquestrais do trabalho, uma passagem para o movimento seguinte do registro, sequência que se completa pelo experimentalismo de Government Came (9980.0kHz 3617.1kHz 4521.0 kHz) e Cliffs Gaze / cliffs’ gaze at empty waters’ rise / Ashes to Sea or Nearer to Thee.

São pouco menos de 20 minutos em que o coletivo canadense mais uma vez brinca com a fragmentação das ideias e criativa sobreposição dos elementos que resulta em um ato de forte comoção criativa. Entre blocos imensos de ruídos, distorções e captações de campo que evocam a base conceitual do disco, os percussionistas Aidan Girt e Timothy Herzog surgem como responsáveis pala marcação rítmica do álbum, conduzindo o movimento fluido das guitarras compartilhadas entre Menuck, Bryant e Moya. O resultado desse processo está na formação de uma experiência essencialmente catártica. Um verdadeiro turbilhão instrumental, conceito reforçado nos instantes finais de Ashes to Sea or Nearer to Thee, quando o ecoar de sinos garante ao registro um tratamento quase transcendental.

Passada a colisão de formas instrumentais que movimenta o bloco central de G d’s Pee at State’s End!, Our Side Has to Win (for D.H.), assim como Fire at Static Valley, busca confortar o ouvinte. Entre camadas de guitarras e ambientações melancólicas que parecem saídas de algum disco do Sigur Rós, cada elemento da canção funciona como precioso componente de despedida. É como um aceno breve passada turbulência que alimenta parte expressiva da obra. Instantes em que o coletivo traz de volta as mesmas texturas e ambientações testadas em registros como F♯ A♯ ∞, preserva parte da sonoridade que envolve o presente álbum e regressa ao minimalismo da introdutória A Military Alphabet, garantindo ao público a produção de um trabalho cíclico, que naturalmente exige ser revisitada.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.