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Crítica

Indigo de Souza

: "Any Shape You Take"

Ano: 2021

Selo: Saddle Creek

Gênero: Indie Rock

Para quem gosta de: Nilüfer Yanya e Miya Folik

Ouça: Real Pain e Kill Me

8.6
8.6

Indigo de Souza: “Any Shape You Take”

Ano: 2021

Selo: Saddle Creek

Gênero: Indie Rock

Para quem gosta de: Nilüfer Yanya e Miya Folik

Ouça: Real Pain e Kill Me

/ Por: Cleber Facchi 07/09/2021

Classificar o som produzido por Indigo de Souza está longe de parecer uma tarefa simples. Mesmo guiada pela potência das guitarras, a cantora e compositora norte-americana tem feito de cada novo registro de inéditas um precioso exercício criativo. São canções ancoradas em temas existencialistas e conflitos sentimentais, porém, sempre adornadas pela colorida sobreposição de ritmos, uso inusitado dos arranjos e elementos que passeiam por diferentes campos da música. Um vasto catálogo de ideias que parece bem-resolvido no introdutório I Love My Mom (2018), mas que ganha ainda mais destaque no fino repertório que embala o melancólico Any Shape You Take (2021, Saddle Creek).

Menos urgente em relação ao trabalho que o antecede, o registro de dez faixas estabelece no uso calculado de cada de cada elemento um valioso alicerce conceitual para os versos e sentimentos expressos pela artista original de Asheville, na Carolina do Norte. “Querida, se você precisar de mim / Eu estarei bem aqui / Eu vim para te resgatar“, detalha na introdutória 17, música em que resgata memórias de um passado recente, dialoga com uma versão mais jovem de si mesma e ainda estreita a relação com o ouvinte. É como uma reinterpretação consciente das angustias vividas em I Love My Mom, porém, partindo de um ponto de vista totalmente reformulado e maduro da compositora.

Se você quiser mudar / Eu estarei aqui para segurar você durante a dor“, canta na acolhedora Way Out, composição que se espalha em meio a camadas de guitarras, batidas irregulares e ruídos, porém, preservando o lirismo reconfortante que surge em momentos estratégicos da obra. Claro que isso não impede a artista de mergulhar em uma série de faixas consumidas pelo sofrimento. Exemplo disso acontece na derradeira Kill Me, música em que se despede de um antigo amor. “Me mate, me mate, ninguém me perguntou / Para sentir isso, fodeu tudo / Mas eu estou aqui, fodida“, desaba emocionalmente e ainda repete: “Eu sei que você vai seguir / Eu sei que você vai seguir“.

Nada que se compare ao material entregue na turbulenta Real Pain. Enquanto os versos refletem o lirismo doloroso que consome o disco – “Quando a dor é real / Você não pode correr / Você pode se cobrir / Mas será desfeito” –, guitarras inexatas encolhem e crescem a todo instante, reforçando a sensação de desamparo vivida pela artista. E isso fica ainda mais evidente na segunda metade da canção, quando Souza reaparece em meio a gritos de dor e ruídos desconcertantes. “Eu quero chutar, quero gritar / Eu quero saber que não é minha culpa“, clama. É como se diferentes experiências sentimentais, memórias e vivências fossem resgatadas e condensadas dentro de cada composição.

Vem justamente desse exercício de aglutinação e permanente sobreposição de ideias o estímulo para o título da obra. É como se a cantora desse forma a toda e qualquer experiência sentimental, proposta que vai da construção dos versos ao inusitado uso dos arranjos e formas instrumentais. “O título do álbum é uma referência às muitas formas que assumo musicalmente. Não sinto que incorporo totalmente qualquer gênero em particular. Toda a música simplesmente vem do universo que é meu cérebro/coração/mundo em constante mudança”, comentou Souza no texto de apresentação do registro que vai do R&B ao rock, do pop ao soul de maneira sempre mutável.

Nesse sentido, Souza se une ao time de outras garotas não brancas, como Miya Folick, Japanese Breakfast e Black Belt Eagle Scout, que vêm ressignificando o rock norte-americano a partir de uma criativa colagem rítmica, diferentes abordagens e vivências. São canções que orbitam um universo bastante particular, mas que em nenhum momento de deixam de dialogar com o ouvinte. E isso se reflete durante toda a execução do trabalho. Do lirismo sorridente que toma conta de Hold U (“Você é a melhor coisa, e eu tenho isso, eu tenho você“) à melancolia de Die/Cry (“Bem, eu prefiro morrer do que ver você chorar“), difícil não se identificar com as histórias e sentimentos detalhados pela artista.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.