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Crítica

Kaatayra

: "Inpariquipê"

Ano: 2021

Selo: Independente

Gênero: Experimental, Black Metal, Folk

Para quem gosta de: Papangu e Bríi

Ouça: Inpariquipê e Dundararaiê

8.0
8.0

Kaatayra: “Inpariquipê”

Ano: 2021

Selo: Independente

Gênero: Experimental, Black Metal, Folk

Para quem gosta de: Papangu e Bríi

Ouça: Inpariquipê e Dundararaiê

/ Por: Cleber Facchi 06/12/2021

A trilha bucólica apontada por Caio Lemos na imagem de capa de Toda História pela Frente (2020), último trabalho de estúdio do multi-instrumentista brasiliense como Kaatayra, está longe de chegar ao fim. Pouco mais de um ano após o lançamento do registro que revelou preciosidades como O Castigo Vem a Cavalo e Miséria da Sabedoria, o músico se reinventa por completo nas cinco composições que abastecem o experimental Inpariquipê (2021, Independente), obra que preserva a essência exploratória do material entregue há poucos meses, mas que utiliza de uma abordagem essencialmente ritualística e hipnótica.

Síntese desse resultado fica bastante evidente na introdutória Tiquindê. Assim como em Toda História Pela Frente, Lemos parte de uma base acústica, mas não menos detalhista. São movimentos espiralados que se completam pela percussão sempre destacada e crescente, como um complemento direto ao minimalismo dos arranjos que se engrandecem pelo canto de pássaros, sintetizadores e sobreposições que evocam o caráter transcendental das composições de Steve Reich. É como a passagem para um mundo mágico e misterioso, marca de boa parte das criações do artista que também se apresenta como Bríi e Vauruvã.

É dentro desse mesmo território criativo, porém, partindo de uma interpretação ainda mais intensa e detalhista que Lemos revela ao público a própria faixa-título do disco. Inaugurada pela constrastaste sobreposição entre a base de sintetizadores e a bateria furiosa do instrumentista, a canção rapidamente se espalha em um labirinto de formas pouco usuais e entalhes percussivos que manipulam a interpretação do ouvinte. Pouco mais de dez minutos em que somos convidados a mergulhar em um ambiente de formas inexatas, vozes e quebras que potencializam tudo aquilo que o músico havia testado anteriormente.

Passada a turbulência de Inpariquipê, Lemos transporta o ouvinte para um cenário completamente novo com a chegada de Ãráiãsaiê. Regida pelo uso da percussão tribal e vozes cíclicas, como um mantra, a faixa de essência delirante mais uma vez reflete a capacidade do artista em lidar com a construção de músicas sempre labirínticas e imprevisíveis. São sintetizadores, ruídos e atravessamentos rítmicos que encolhem e crescem a todo instante. Fragmentos instrumentais que se espalham em meio a estruturas disformes, muitas vezes contrastantes, porém, estranhamente conectadas pelo compositor brasiliense.

E isso fica ainda mais evidente na insana Dundararaiê. Do momento em que tem início, nas vozes guturais de Lemos, passando pelo encaixe das batidas e uso inusitado dos arranjos, cada fragmento da canção vai de um canto a outro sem necessariamente perder a própria consistência. O mais interessante talvez seja perceber a quantidade de elementos que se escondem por entre as brechas da composição. São vozes submersas, captações de campo, sons animalescos e efeitos que garantem maior profundidade ao material. “Pela primeira vez raciocino sobre toda a composição ao invés de criar as músicas por instinto. Por isso o mais trabalhoso e também especial para mim“, comentou o artista no texto de apresentação do registro.

Não por acaso, passada a criativa colisão de ideias que orienta a construção da faixa, Iasá, música de encerramento do álbum, evidencia a capacidade do artista em testar os próprios limites e apontar a direção para um universo de novas possibilidades. São componentes de música de vanguarda que se destacam em relação ao já esperado diálogo do multi-instrumentista com o black metal atmosférico. Instantes em que Lemos utiliza de uma série de elementos rítmicos e melódicos espalhados durante toda a execução do material, porém, enquadrados de forma ainda mais instigante e totalmente inesperada, como um indicativo curioso do que pode vir a orientar os futuros registros produzidos pelo Kaatayra .

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.