Domenico
Brazilian/Experimental/Alternative
Por: Cleber Facchi
Quase uma década separa Domenico Lancellotti de “seu” primeiro disco de estúdio, Sincerely Hot. Lançado em 2003 (ainda em parceria com Kassin e Moreno Veloso através do projeto +2), o álbum curvou para ele boa parte dos olhares da crítica e do público, que encontraram naquele registro “realmente quente” um tipo de som novo, marcado pela malandragem e que dava ao samba ou a música popular brasileira uma roupagem moderna, repleta de interferências eletrônicas. Oito anos depois, o carioca mostra que sua mente ainda segue na mesma intensidade, soltando um registro de dez faixas que se divertem com experimentações e crescem por seus detalhamentos.
Entre o primeiro álbum e esse Cine Privê (2011), Lancellotti não se aquietou em nenhum momento. Incursionou ao lado da Orquestra Imperial, que em 2007 lançou seu primeiro disco de estúdio (o elogiado Carnaval Só Ano Que Vem), deu vida ao projeto Os Ritimistas em parceria com Stephane San Juan e Dany Roland e seguiu tocando bateria nas apresentações ao vivo do Adriana Calcanhotto. Além, é claro, de mais um álbum ao lado dos comparsas do +2 (Futurismo, lançado em 2006). Todas essas passagens em diferentes projetos acabam visíveis dentro desse novo álbum, dando a ele um caráter plural, fazendo com que o músico não esteja de fato sozinho.
Gravado ao longo de três anos – a quantidade de trabalhos paralelos justifica isso – Cine Privê entrega não apenas elementos de todas essas parcerias vindas dos diversos projetos em que Domenico excursionou, mas traz também uma quantidade significativa de sons vindos de sua antiga banda, a Mulheres Q Dizem Sim. Fundado em meados dos anos 90, o grupo – que conta com apenas um disco homônimo – é ao lado do Acabou La Tequila um dos responsáveis por influenciar toda a geração de bandas cariocas dos anos 2000, como o Los Hermanos, Canastra e demais projetos. A mistura de ritmos, uma das marcas da banda é o que permeia boa parte do atual disco de Lancellotti, fazendo o samba soar eletrônico e o rock de maneira suingada.
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Mesmo que o álbum traga uma série de subsídios característicos e siga um direcionamento bem similar ao que foi explorado em Sincerely Hot, falta um elemento fundamental a esse novo disco: a malícia. Toda a malandragem expressa em faixas como Te Convidei Pro Samba, Comigo ou mesmo a canção autointitulada abrem uma lacuna dentro do presente registro. Entretanto, a construção de músicas que despontam uma faceta romanceada do músico deixam que tais elementos sejam aos poucos esquecidos, fazendo com que o ouvinte acabe de vez mergulhado dentro de sons como 5 Sentidos ou Sua Beleza, essa última (por conta de sua instrumentação) com um pouco da climatização quente de outrora.
Lancellotti cria desde canções marcadas pelo uso de sintetizadores e uma sonoridade semi-futurística, como em Receita (com os vocais lembrando Chico Buarque em alguns momentos) até faixas que se destacam pelo instrumental variado e o aplicado uso de texturas ou mínimos acréscimos sonoros, como Os Pinguinhos (detalhe para o belo uso do contrabaixo). Quando quer, o músico até brinca de fazer música pop, fácil e descontraída, a exemplo de Su Di Ti, um achado doce e todo cantado em italiano, que exala o pop dos anos 60.
Feito para ser ouvido com fones de ouvido, evitando que qualquer mínimo detalhe possa escapar, Cine Privê se orienta como um trabalho não conceitual, mas bem definido. Todas as canções estão amarradas em uma formatação exata, como se fosse impossível visualizar o disco de forma diferente da que nos é entregue. Sereno, Domenico nos guia através de um trabalho, que embora demonstre em determinados momentos certos toques de solidão jamais cai no melancólico ou no sentimentalismo exagerado. Tudo flui de maneira que o presente disco se mostre como um dos mais interessantes lançados até agora em 2011, não desmerecendo em nada o álbum anterior do artista.
Cine Privê (2011)
Nota: 8.3
Para quem gosta de: Os Ritmistas, Orquestra Imperial e +2
Ouça: Receita
Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.
Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.