Disco: “Free Your Mind”, Cut Copy

/ Por: Cleber Facchi 04/11/2013

Cut Copy
Electronic/Dance/Alternative
http://www.cutcopy.net/

Cut Copy

Liberte a sua mente. Essa é a premissa para embarcar nas batidas, sintetizadores e na coleção de vozes melódicas que os australianos do Cut Copy reservam para Free Your Mind (2013, Modular). Quarto registro em estúdio do grupo de Melbourne, o trabalho assume um desmembramento autoral da estética oitentista, imposta desde a estreia com Bright Like Neon Love, em 2004. Íntimo da produção musical sustentada no começo da década de 1990, o novo disco olha com atenção para a lisergia de Madchester como para o cardápio sintético de Chicago, amarrando as duas pontas da House music em um retrato tão honesto e natural, que mais parece ter atravessado o tempo para sustentar esse resultado.

Menos extenso e até econômico em relação ao jogo de experiências impostas na construção de In Ghost Colours (2008) e Zonoscope (2011), Free Your Mind assume em um efeito de posição experimental sua maior transformação. Longe da plasticidade “pop” que esculpia com leveza os registros anteriores, o presente álbum abre espaço para que pequenas interferências musicais dancem em uma medida isolada do grande público. São faixas como In Memory Capsule e Meet Me In The House Of Love, que flutuam abertamente entre a eletrônica Lo-Fi recente e as experiências tortas da produção nos anos 1990. Um detalhamento menos óbvio, mas que está longe de esquivar os australianos de um catálogo de faixas “vendáveis”.

Diferente do resultado imediato exposto em Need You Now, Lights and Music ou qualquer outro hit previamente exposto pelo grupo, dentro da nova proposta musical do Cut Copy, a atenção nos detalhes é estabelecida como uma ferramenta essencial. Ainda que a base de sintetizadores e o exercício que movimenta os vocais seja o mesmo dos discos anteriores, faixa, após faixa o ouvinte acaba arrastado para um jogo de sobreposições pouco convencionais, quase climáticas. São vozes que se espalham em uma arquitetura instrumental (Let Me Show You Love), arranjos fragmentados em pequenos atos (Footsteps) ou mesmo típicas canções pop que pulam da eletrônica para um cenário ambiental típico da década de 1970 (We are Explorers).

Mais do que fugir do cenário previamente exposto pela banda, Free Your Mind é uma obra em que o Cut Copy parece interessado em testar os próprios limites. É como se todas as canções apresentadas no disco passado fossem resgatadas e lentamente desconstruídas. Basta observar o quanto músicas como Let Me Show You Love ou mesmo a própria faixa-título mantém uma forte relação com os trabalhos anteriores, apenas alimentadas por uma composição menos próxima do synthpop e mais da estética House, o que autoriza o grupo a firmar pequenas viagens por todo o disco. Dentro desse jogo de experiências ampliadas, tocar a psicodelia em Take Me Higher se transforma em uma experiência natural, aproximando com naturalidade os australianos de tudo aquilo que o Primal Scream conquistou no clássico Screamadelica (1991).

Com um efeito de oposição aos discos anteriores, em que vozes e sintetizadores eram apresentadas como a base musical para todo trabalho, com o presente disco o destaque está explícito nas batidas. Ainda que a faixa-título assuma esse resultado com visível acerto, é na construção de músicas como Footsteps que o álbum realmente cresce. Enquanto canções à exemplo de Meet Me In The House Of Love e Let Me Show You Love apostam na composição sintética dos beats, outras como Take Me Higher usam de um catálogo ponderado de percussão orgânica, pontuando o registro com uma dose evidente de ineditismo. Há ainda músicas aos moldes de We are Explorers, que cruzam esses dois princípios em um só composto, o que torna o disco uma obra aberta ao jogo atento de pequenas experiências.

Abastecido por pequenos diálogos e interlúdios – Into The Dessert, Above The City e The Waves -, Free Your Mind ecoa como uma possível abertura para um novo cenário dentro da obra dos australianos. Exemplo claro disso está na construção de Walking In The Sky e Mantra, as duas últimas faixas do disco. Enquanto a primeira abraça a psicodelia em uma forte relação com os anos 1960, a segunda mergulha em um jogo de sons aglutinados, densos, mas que acima de tudo reforçam o misticismo em torno do tema “Liberte a sua mente”. Sem tempo para assumir um resultado óbvio e em um ponto cada vez mais explícito de separação das pistas, o Cut Copy parece ter encontrado a resposta para a sobrevivência da própria obra, exercício que o presente álbum reforça como um mero recomeço ou possível abertura para um projeto ainda maior.

 

Free Your Mind

Free Your Mind (2013, Modular)

Nota: 7.6
Para quem gosta de: Miami Horror, Holy Ghost! e Primal Scream
Ouça: Free Your Mind, Let Me Show You Love e We are Explorers

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.