Disco: “Mountain Tops”, Câmera

/ Por: Cleber Facchi 07/11/2014

Câmera
Indie/Alternative/Post-Rock
http://www.cameracamera.net/

Por: Cleber Facchi

Guitarras tecidas delicadamente, vocal sutil e bateria encaixada com precisão. De fato, não é difícil se perder pelas melodias e arranjos hipnóticos de Mountain Tops (2014, Balaclava). Álbum de estreia da banda mineira Câmara, o brando registro cresce como nítida sequência ao trabalho iniciado pelo grupo com os primeiros EPs, Invisible Houses e Not Tourist, ambos de 2011. Uma coleção melancólica de texturas instrumentais, sussurros românticos e composições que refletem acolhimento.

Mesclando timidez e descoberta, o grupo formado por André Travassos, Bruno Faleiro, Matheus Fleming e Henrique Cunha resume logo em Random, instrumental faixa de abertura, toda a estrutura que rege o disco. Aqui não há pressa, exagero ou qualquer traço de grandiosidade. Em um ambiente sereno e convidativo, guitarras abrem espaço para os vocais, ruídos encontram conforto ao fundo das batidas e confissões são detalhadas lentamente. Se Mountain Tops é um lugar, como o título e a capa do trabalho indicam, cada faixa funciona como uma minuciosa descrição desse cenário.

Embora íntimo do mesmo arsenal de referências e temas compactos explorados nos dois primeiros EPs, basta um rápido mergulho em faixas como Lost Cause, I Surrender! e Hypnosis para perceber a nova sonoridade incorporada pelo quarteto. Salve exceções, caso da enérgica Time Will em Invisible Houses, grande parte do acervo inicial do grupo parecia sufocar pelo controle abusivo dos instrumentos e vozes, implodindo em meio a atos atmosféricos quase claustrofóbicos. A julgar pelo abrigo criado em House of the Holy Sins, talvez a banda estivesse mesmo em busca de isolamento.

Amplo, Mountain Tops revela o oposto. Ainda que a serenidade ocupe e oriente cada instante do registro, vozes limpas, solos ascendentes e toda uma variedade de experimentos se espalham de forma curiosa, ocupando a mente do espectador. Os limites ainda são evidentes, porém, uma vez dentro do espaço montado para o disco, sobram montanhas, corredeiras e campos imensos a serem explorados. Com leveza, um fino traço de identidade começa a se formar, reduzindo a herança de grupos como Slint, Mogwai e Pavement a um espaço meramente referencial.

Como típica peça do Pós-Rock, a estreia do Câmera está longe de ser encarado como um trabalho de respostas imediatas e canções emergenciais. Trata-se de um disco que merece ser explorado com plena atenção pelo ouvinte – talvez imersão. Desenvolvido ao longo de (absurdos) 36 meses de produção, gravações em estúdio e polimento, o álbum esconde em cada faixa um universo imenso de texturas, ruídos e mínimos farelos instrumentais.

Entre versos doces (cantados em inglês) e bases espaçadas, é fácil tropeçar em uma coleção de tesouros musicais (quase) ocultos. O solo lento ao fundo de Astronaut Adrift, um dedilhado brando em Travel Musings e a essência de Kevin Shields (My Bloody Valentine) na linha distorcida que corta Whatever Works. De certa forma, a constante sensação de conhecer um novo grupo a cada nova audição do trabalho.

Em preto e branco, a xilogravura que ocupa a capa do registro talvez seja o único “erro grave” cometido pela banda. Fria e excessivamente simples, a imagem de contornos sóbrios parece incapaz de resumir ou apresentar ao ouvinte toda a diversidade de cores, sentimentos e sutilezas deliciosamente espalhados pelo disco. Dessa forma, aos que passam desatentos, talvez seja bom alertar: uma vez entregue ao contexto de Mountain Tops, mergulhado no ambiente da obra, sair talvez seja a última opção.

Mountain Tops (2014, Balaclava)

Nota: 8.6
Para quem gosta de: Cambriana, Kalouv e Single Parents
Ouça: Whatever Works, Lost Cause, I Surrender! e Travel Musings

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.