Resenha: “The Bride”, Bat For Lashes

/ Por: Cleber Facchi 05/07/2016

Artista: Bat For Lashes
Gênero: Baroque Pop, Dream Pop, Alternative
Acesse: http://www.batforlashes.com/

 

Prescilla e Sarah em Fur and Gold (2006), o romantismo pueril de Daniel no delicado Two Suns (2009), a completa melancolia de Laura em The Haunted Man (2012). Reais ou metafóricos, diferentes personagens e histórias sempre povoaram a obra de Natasha Khan dentro da discografia do Bat For Lashes. Delírios românticos, confissões amarguradas, tormentos e versos marcados pela subjetividade, proposta que ressurge de maneira ampliada dentro do quarto álbum de estúdio da cantora e compositora britânica, o conceitual The Bride (2016, Parlophone).

Centrado no melancólico relato de uma jovem noiva que vê o futuro marido (“Joe”) morrer a caminho da igreja e decide partir sozinha para a lua de mel, o álbum produzido em parceria com Ben Christophers, Dan Carey e Simon Felice Head talvez seja o registro em que Khan mais se distancia de uma possível zona de conforto. Trata-se de uma obra fechada, capítulos de uma pequena narrativa musical em que a cantora não apenas interpreta cenas e acontecimentos da sofredora personagem, como se aprofunda em diferentes debates sentimentais.

Liricamente orquestrado por um roteiro quase cinematográfico, The Bride nasce da profunda exposição do amor logo na faixa de abertura do disco, I Do. Um efusivo (e apaixonante) grito de “eu aceito”, ponto de partida para o arco dramático que tem início na terceira faixa do disco, In God’s House – “Através deste véu eles não podem ver / A névoa da morte me envolveu”. A partir desse ponto, Khan se entrega ao completo sofrimento do eu lírico, abraça a solidão em Honeymooning Alone, e segue até a libertação na delicada I Will Love Again – “Um dia desses / Eu amarei novamente”.

Muito além dos versos, a própria base instrumental montada para o trabalho parece dialogar com a temática de um casamento. São ambientações marcadas pelo uso constante de pianos, harpas, sinos e vozes em coro, como se a música de uma celebração religiosa fosse lentamente desconstruída. À medida que o álbum avança, faixas como Never Forgive the Angels e Close Encounters indicam a construção de um som cada vez mais denso, por vezes sufocante. Uma coleção de ruídos acinzentados, estímulo para a triste narrativa composta por Khan.

Entretanto, a real beleza do trabalho não está na linearidade de suas canções, mas na forma como pequenas discussões brotam com naturalidade entre os versos ao longo da obra. Ainda mais amplo é o significado do registro quando observamos a morte de Joe não como um acontecimento, mas um ato metafórico. Quantos são os “noivos” que morrem diariamente em nossas vidas? Personagens e suas histórias que simplesmente desaparecem às vésperas de uma importante evento? Mais do que um doloroso caso de amor, The Bride reflete o abandono de cada indivíduo.

Perturbador e sensível na mesma medida, o trabalho acaba encantando pela pluralidade de temas que Natasha Khan desenvolve até o último verso. Ainda que o peso de faixas como If I Knew e In Your Bed seja evidente, fazendo com que o disco perca parte do dinamismo que movimenta o primeiro grupo de canções, difícil escapar da sequência de lamúrias e relatos confessionais que orientam a obra até a construção da derradeira Clouds. Um doloroso exercício criativo em que Khan se revela como autora e também personagem.

 

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The Bride (2016, Parlophone)

Nota: 8.0
Para quem gosta de: Fiona Apple, Björk e Lykke Li
Ouça: I Do, In God’s House e I Will Love Again

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.