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Crítica

Beyoncé

: "Renaissance"

Ano: 2022

Selo: Parkwood / Columbia

Gênero: R&B, Pop, Dance

Para quem gosta de: Solange e Chloe X Halle

Ouça: Break My Soul e Alien Superstar

9.0
9.0

Beyoncé: “Renaissance”

Ano: 2022

Selo: Parkwood / Columbia

Gênero: R&B, Pop, Dance

Para quem gosta de: Solange e Chloe X Halle

Ouça: Break My Soul e Alien Superstar

/ Por: Cleber Facchi 03/08/2022

Em 2019, quando subiu ao palco do GLAAD Awards, para receber um prêmio pela contribuição na luta pela comunidade LGBTQIA+, Beyoncé, acompanhada pelo marido, o rapper Jay-Z, se mostrou bastante emocionada durante a fala em que agradecia ao “tio Johnny”, um sobrinho de sua mãe, Tina Knowles, que veio a falecer em decorrência de HIV. “Quero dedicar este prêmio ao meu tio Johnny, o gay mais fabuloso que já conheci, que ajudou a criar a mim e minha irmã”, disse a cantora. Há poucos dias, às vésperas do lançamento Renaissance (2022, Parkwood / Columbia), sétimo álbum em carreira solo, a memória de Johnny mais uma vez foi citada no texto de apresentação do material. “Ele foi minha madrinha e a primeira pessoa a me expor a muita música e cultura que servem de inspiração para esse trabalho“, escreveu.

É partindo desse olhar melancólico para um passado ainda recente, porém, exaltando as histórias, ritmos e vivências de indivíduos marginalizados, que Beyoncé abre passagem para um novo e delicado capítulo dentro da própria discografia. Deliciosamente nostálgico, ainda que atual, Renaissance segue uma trilha particular em relação a tantos outros registros marcados pelo aspecto revivalista, como em What’s Your Pleasure? (2020), de Jessie Ware, e Róisín Machine (2020), de Roisín Murphy. Mais do que emular a estética de um período específico, a artista faz de cada composição um objeto de estudo e delicada homenagem.

São fragmentos de vozes, interpolações, trechos de registros icônicos para a comunidade LGBTQIA+ e pequenos retalhos instrumentais que exigem uma audição atenta durante toda a execução do material. Instantes em que Beyoncé atravessa as pistas ao som de Big Freedia, Robin S. e Donna Summer, essa última, exaltada na releitura de I Feel Love, base para Summer Renaissance, porém, preservando a própria identidade criativa. Um misto de resgate e reinterpretação, estrutura que vai da construção das batidas, sempre calcadas nas raízes negras da música eletrônica, à fotografia de capa que evoca a imagem de Bianca Jagger montando um cavalo no Studio 54 ou mesmo a tela de Lady Godiva pintada por John Collier.

Embora imersa nesse cenário marcado pelo permanente atravessamento de informações e criativo diálogo com novos colaboradores, como Honey Dijon, BloodPop e A. G. Cook, interessante perceber o equilíbrio de Beyoncé durante toda a execução do material. São composições em que estreita a relação com as pistas, como a já conhecida Break My Soul e Virgo’s Groove, porém, sempre acompanhadas de canções que remetem de forma atualizada aos antigos trabalhos da artista. É o caso de America Has a Problem e Church Girl, canções que parecem saídas do repertório apresentado no disco anterior, o político Lemonade (2016).

Sobrevive justamente nesse cruzamento de informações que costura passado e presente da artista o estímulo para algumas das composições mais interessantes do trabalho. Terceira faixa do disco, Alien Superstar funciona como uma boa representação desse resultado. Enquanto os versos refletem o lirismo provocativo de Beyoncé, batidas e ambientações sintéticas vão do R&B denso que marca as criações da cantora no homônimo disco de 2013 ao universo do ball culture. Surgem ainda acertos como Move, canção que destaca a potência das rimas e se abre para a chegada da nigeriana Tems e a icônica Grace Jones.

Produto final de um lento processo de amadurecimento que teve início há mais de uma década, quando assumiu o controle da própria obra e deu vida ao transitório 4 (2011), Renaissance mostra que Beyoncé parece longe de qualquer traço de conforto. Mesmo que pequenos excessos e músicas deslocadas sejam percebidas ao longo do álbum, como Plastic off the Sofa e All Up in Your Mind, prevalece o esmero e capacidade da artista em surpreender o ouvinte. É como um convite a se perder pelas pistas de dança e um exercício de renascimento artístico que evidencia o que há de mais sensível no trabalho da cantora.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.