Quem esperava que o breve período de calmaria em Promises (2021), delicada parceria com o saxofonista Pharoah Sanders (1940 – 2022), pudesse suavizar o trabalho de Sam Shepherd como Floating Points, vai se surpreender com o repertório entregue pelo produtor britânico em Cascade (2024, Ninja Tune). Sequência ao material apresentado em Crush (2019), o registro segue de onde Shepherd parou há cinco anos, contudo estabelece na maior aceleração e reforço aplicado às batidas um poderosíssimo componente de renovação.

Feito para as pistas, Cascade diz a que veio logo na matadora sequência formada por Vocoder [Club Mix], Key103 e Birth4000. São pouco menos de 20 minutos em que o produtor brinca com a fragmentação das vozes e destaca o uso de texturas sintéticas, mas que em nenhum momento se sobrepõem ao impacto das batidas. É como uma interpretação ainda mais frenética em relação ao disco anterior. Golpes rápidos que alternam entre a house e o techno, porém preservando o habitual experimentalismo que orienta a IDM.

Claro que essa necessidade em capturar pelo impacto imediato tem seus motivos. Com exceção de Key103, que foi justamente a canção escolhida para anunciar a chegada do disco, todo restante dessa sequência de abertura é formado por músicas que há muito habitam o repertório de Shepherd, diminuindo a sensação de ineditismo em torno do trabalho. A própria Vocoder, mesmo sutilmente remodelada, já contabiliza mais de dois anos de lançamento, inaugurando o registro como uma escolha preguiçosa por parte do produtor.

Ainda assim, é quando todas essas peças se encaixam, sejam elas antigas ou recentes, que a real beleza da obra de Shepherd se manifesta. Sem tempo para descanso, o produtor britânico emenda uma canção na outra, evitando que o ouvinte tenha qualquer chance de escapatória. A própria Del Oro, mesmo entregue ao público meses antes do anúncio do trabalho, ganha novo significado quando interpretada como parte do álbum, surgindo como uma extensão natural do som intenso de Birth4000, principal música do disco.

Embora utiliza de uma abordagem essencialmente frenética, Cascade estabelece pequenos respiros que destacam a sensibilidade e riqueza de ideias que move as criações de Shepherd. Exemplo disso pode ser percebido em Ocotillo. São pouco menos de nove minutos em que o produtor parte de uma ambientação cósmica e traz de volta os experimentos testados em Elaenia (2015) e Reflections – Mojave Desert (2017), porém encerra a canção de maneira consistente com o restante da obra, destacando a força das batidas.

O resultado desse processo está na entrega de um registro não apenas equilibrado, mas que funciona como uma síntese conceitual de tudo aquilo que Shepherd tem desenvolvido ao longo da última década. Durante toda a execução do material, perceba como o produtor utiliza de ecos dos antigos trabalhos como forma de potencializar e ampliar os limites da própria criação. Canções que partem de espalhamentos ocasionais, mas que a todo momento abrem passagem para um território completamente novo para Floating Points.

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