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Crítica

Letieres Leite / Orkestra Rumpilezz

: "Moacir de Todos os Santos"

Ano: 2022

Selo: Rocinante

Gênero: Jazz

Para quem gosta de: Thiago França e Amaro Freitas

Ouça: Coisa Nº 4 e Coisa nº 5 – Nanã

8.0
8.0

Letieres Leite & Orkestra Rumpilezz: “Moacir de Todos os Santos”

Ano: 2022

Selo: Rocinante

Gênero: Jazz

Para quem gosta de: Thiago França e Amaro Freitas

Ouça: Coisa Nº 4 e Coisa nº 5 – Nanã

/ Por: Cleber Facchi 08/06/2022

De Gilberto Gil à Ivete Sangalo, de Larissa Luz a Zé Manoel, não foram poucos os artistas com quem o compositor e arranjador baiano Letieres Leite (1959 – 2021) estreitou relações e contribuiu diretamente em um intervalo de mais de quatro décadas de carreira. Somente no último ano, por exemplo, o músico soteropolitano esteve envolvido em duas importantes obras da cena brasileira. De um lado, o aguardado retorno de Caetano Veloso, com Meu Coco (2021), no outro, a sofisticação de Noturno (2021), último álbum de estúdio de Maria Bethânia, com quem já havia colaborado anteriormente em diferentes espetáculos.

Morto em outubro do último ano, em decorrência de uma insuficiência respiratória causada pela Covid-19, o arranjador passou as semanas que antecedem a própria morte imerso na finalização de uma de suas maiores criações, Moacir de Todos os Santos (2022, Rocinante). Mais uma vez acompanhado pela Orkestra Rumpilezz, banda criada pelo músico em 2006, Leite adapta sete das dez composições que integram o cultuado Coisas (1965), obra-prima do também arranjador, compositor, maestro e multi-instrumentista pernambucano Moacir Santos, uma das principais referências criativas do artista soteropolitano.

Coproduzido em parceria com Sylvio Fraga e Pepê Monnerat, Moacir de Todos os Santos, assim como o repertório original apresentado há cinco décadas pelo artista pernambucano, parte de uma numeração totalmente irregular na distribuição das faixas, jogando com a imprevisibilidade dos elementos. Trata-se de uma colorida combinação de ideias, ritmos e referências, estrutura que vai da produção cubana à herança dos ritmos africanos, do diálogo com o jazz estadunidense à música brasileira. Instantes em que Leite, sempre acompanhado por um seleto time de instrumentistas, parece brincar com as possibilidades.

E isso fica bem representado na própria faixa de abertura, Coisa Nº 4. São pouco mais de seis minutos em que a percussão ritualística encolhe e cresce a todo instante, orientando a sobreposição dos metais e breve participação do trombonista Raul de Souza, que também veio a falecer no último ano. Minutos à frente é a vez de Coisa Nº 8, música que parte de uma base atmosférica, destacando a presença do saxofonista Joander Cruz, mas que ganha novas tonalidades a cada movimento. É como um delicado exercício criativo que ainda abre passagem para a canção seguinte, Coisa Nº 9, uma das grandes composições do registro.

Com a chegada de Coisa Nº 1, o ritmo acelera consideravelmente, os metais ganham novas tonalidades e Leite abre passagem para a segunda metade do disco. O destaque acaba ficando por conta da já conhecida releitura de Coisa Nº 5 – Nanã, música que tem os versos, cantados em inglês, assumidos por Caetano Velosos. Nada que diminua o impacto de faixas como Coisa Nº 7, composição que valoriza o uso da percussão, proporcionando novo fôlego ao material. É como uma extensão natural, por vezes de tudo aquilo que o compositor havia testado há seis anos, no também colaborativo A Saga da Travessia (2016).

Essa mesma sobreposição de elementos fica ainda mais evidente com a chegada de Coisa Nº 2. Escolhida para o fechamento do trabalho, a releitura de Leite segue uma abordagem completamente distinta em relação ao material apresentado por Santos. Da fluidez da percussão ao uso dos metais, tudo se projeta de maneira grandiosa, como se pensada para as apresentações ao vivo da Orkestra Rumpilezz. Instantes em que o compositor baiano aponta de forma bastante decidida para o passado, porém, preservando a própria identidade, refinamento que embala com naturalidade a experiência do ouvinte até a última nota do disco.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.