Projota
Brazilian/Hip-Hop/Rap
https://www.facebook.com/McProjota
Por: Cleber Facchi
Desde a estreia com a mixtape Projeção (2010), os trabalhos do paulistano Projota se dividem em dois grupos de faixas abastecidos por sentimentos bem específicos: Medo e esperança. Enquanto o primeiro bloco de canções auxilia na arquitetura de cenários descritivos e que circundam o cotidiano do rapper com desigualdade, racismo, além dos próprios medos, a segunda porção vem como um instrumento de equilíbrio. São músicas que detalham textos de superação, fé e batalhas constantes, como se o MC rimasse para o povo da comunidade de onde veio ao mesmo tempo em que transforma cada verso em um composto que se orienta em uma linguagem universal. Uma ponte que o rapper trilha com segurança e passos ainda mais firmes com a chegada do terceiro registro da carreira, Muita Luz (2013, Independente).
Habitante do mesmo cenário dicotômico que contrasta luz e escuridão a cada nova música, Projota estende de forma sóbria a proposta alicerçada no trabalho anterior, Não Há Lugar Melhor No Mundo Que O Nosso Lugar (2011), fazendo do novo disco um exercício apurado de tudo o que construiu previamente. Menos íntimo da sonoridade “comercial” que impulsiona Mais do que Pegadas, Rap do Ônibus e outras faixas importantes do último disco, o rapper faz do presente álbum um transito cinza pelo cotidiano das periferias. Logo, quem esperava por uma aproximação melódica com as mesmas exaltações à MPB de Criolo ou a produção “gringa” de Emicida, encontrará no novo álbum do paulistano um tratado de difícil acesso, mas de recompensa aos que ultrapassam seus limites.
“Foco, Força e Fé”, os três pilares que sustentam o trabalho do rapper desde a estreia se mantém tão ativos quanto nos lançamentos anteriores. A diferença, lógica, está no acréscimo de um quarto elemento: a luz. Clamada da faixa de abertura até os últimos instantes do disco, o elemento – físico e metafórico – serve como um instrumento de sustento e ao mesmo tempo de apreensão. Uma “luz” que liberta, doutrina e salva, mas ao mesmo tempo indica o percurso final para a alma, o disparo de um revólver ou a apreensão de um giroflex. Diferentes luzes que auxiliam (por vezes de forma quase imperceptível) a construção de cada uma das 19 faixas que recheiam o disco, mais uma vez, sustentadas e versos que primam inteiramente pelo medo e a esperança.
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Seguindo por um catálogo de temas muito próximos dos testados no disco passado, Projota usa do presente álbum para discutir referências inéditas ou talvez pouco exploradas nas mixtapes anteriores. Da valorização constante do Rap Nacional (em Vocês Vão Ter Que Engolir) ao bem sucedido R&B em Mulher (lado mais acessível da obra), cada espaço do registro é pensado com o intuito de romper com tramas possivelmente redundantes ou desgastadas dentro do gênero. Até a valorização de elementos da cultura pop em Fogo (“Alma inflama, Genki Dama, Força, Super Saiyajin”) surgem como um ponto de transformação no trabalho do rapper. Entretanto, o melhor exemplar de todas as experimentações líricas do disco está em Fatality. Rimada em cima de palavras que começam com “F”, a canção se sustenta em quase dois minutos de puro dinamismo, um ponto curioso dentro do regime demasiado amargo do registro.
Embora conte com a presença Skeeter, DJ Max, Laudz e outros produtores ativos do rap paulistano, é no encontro com o velho colaborador, DJ Caíque, que o rapper estabelece a principal formação sonora do álbum. Apoiado em samples que tendem ao Gospel e bases esquecidas da música negra brasileira, o produtor deixa escorrer um som amargo, capaz de corroer toda a extensão da obra. O composto acinzentado influencia por diversas vezes os percursos líricos do MC, direção nítida no eixo final da obra, quando Mataram Um Amigo Meu e Silêncio afundam as rimas em uma dor infinita. É preciso notar que muitas das faixas de Caíque parecem fluir como uma extensão do que o produtor testou no último ano nas bases de Que Assim Seja, do rapper Rashid e uma espécie de trabalho irmão da atual obra de Projota.
Se posicionando como um corte seco no que alimenta boa parte dos trabalhos recentes do rap tupiniquim, Muita Luz não samba e nem chama para as pistas quem ouve as batidas que o conduzem. Trata-se de um trabalho alimentado de forma involuntária pelo que diversas obras do Hip-Hop brasileiro alcançaram na década de 1990 até o começo dos anos 2000. Da amargura dos Racionais MC’s, até os encaixes cotidianos de Sabotage em Rap é Compromisso! (2000), tudo se apresenta como anos de audição continua transformada em um trabalho de propósito claro e identidade resolvida. Se lá fora Kendrick Lamar e outros artistas próximos parecem assumir o mesmo percurso dentro do Rap norte-americano, desculpem, mas aqui Projota e seus parceiros assumem tal reforço há muito mais tempo e talvez com uma crueza muito maior.
Muita Luz (2013, Independente)
Nota: 8.5
Para quem gosta de: Rashid, Emicida e Kamau
Ouça: Muita Luz, Fogo e Silêncio
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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.
Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.