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Crítica

Lorde

: "Solar Power"

Ano: 2021

Selo: Universal

Gênero: Pop

Para quem gosta de: Lana Del Rey e Clairo

Ouça: Mood Ring e Solar Power

6.0
6.0

Lorde: “Solar Power”

Ano: 2021

Selo: Universal

Gênero: Pop

Para quem gosta de: Lana Del Rey e Clairo

Ouça: Mood Ring e Solar Power

/ Por: Cleber Facchi 24/08/2021

Existem artistas com carreiras inteiras que jamais alcançaram o que Lorde conquistou com apenas dois trabalhos de estúdio. Antes mesmo do primeiro disco ser apresentado ao público, o soturno Pure Heroine (2013), a cantora e compositora neozelandesa ocupou uma posição de destaque no topo das principais paradas de sucesso, arrancou elogios da crítica e conquistou uma multidão de ouvintes, tudo isso partindo de uma linguagem essencialmente torta, talvez comparável ao material entregue nos primeiros anos de outras garotas prodígio, como Fiona Apple. E essa euforia em torno do som produzido pela jovem de Auckland foi potencializada no registro seguinte, Melodrama (2017), obra em que testa os próprios limites, reflete sobre o peso da fama e encontra na produção atenta de Jack Antonoff, sempre fragmentada, retorcida, um importante componente de fortalecimento criativo.

Mesmo que cada disco mereça ser observado individualmente, analisando letras e elementos empregados pelo artista, difícil esbarrar nas canções de Solar Power (2021, Universal), terceiro e mais recente trabalho de estúdio de Lorde, e não estabelecer uma série de comparações/conexões, apagando o que foi apresentado nos discos que o antecedem. Afinal, é por causa deles que mergulhamos no novo álbum com tamanho interesse. Porém, longe do lirismo provocativo e sonoridade irregular que marca o repertório de Pure Heroine e Melodrama, a cantora, mais uma vez acompanhada de Antonoff, segue uma trilha totalmente linear, encontrando na atmosfera ensolarada do verão, temas litorâneos e momentos de puro escapismo a base para grande parte das faixas.

Eu odeio o inverno, não aguento o frio / Tenho tendência a cancelar todos os planos / Mas quando chega o calor, algo toma conta“, confessa na já conhecida faixa-título, música que aponta para nomes como George Michael e Primal Scream, e ainda funciona uma síntese clara do material que a cantora busca desenvolver ao longo da obra. O problema é que essa promessa de um dia de Sol em um cenário paradisíaco aos poucos se converte em uma tarde nublada em uma piscina infantil. Do momento em que tem início, em The Path, até alcançar a derradeira Oceanic Feeling, Solar Power pouco avança criativamente, dando voltas em torno de um repertório tedioso e exaustivo.

Enquanto as letras refletem o complemento distanciamento da realidade, marca de músicas como Stoned At The Nail Salon e Dominoes, em que ignora qualquer fato político recente ou mesmo o caótico cenário pandêmico, musicalmente, Solar Power sufoca pela produção previsível e totalmente reciclada de Antonoff. Ainda que Lorde tenha se enfurecido em uma série de entrevistas recentes ao ser questionada sobre o papel do produtor ao longo do trabalho, inegável é o domínio criativo do músico que assume parte expressiva dos instrumentos e arranjos em cada composição. O resultado desse processo está na entrega de um material que parece feito sob encomenda para a cantora, mas que resgata elementos originalmente testados em uma série de obras recentes em que o artista esteve diretamente envolvido, como Chemtrails Over The Country Club (2021), de Lana Del Rey.

São arranjos acústicos e temas reducionistas que inegavelmente transportam o trabalho de Lorde para um novo território criativo, porém, carecem de ritmo, tornando a experiência de ouvir o disco cada vez mais arrastada. Mesmo a voz da cantora, sempre impactante, forte, parece prejudicada, se perdendo em meio a captações enevoadas que parecem típicas do último álbum de Clairo, Sling (2021), também produzido por Antonoff. Falta contraste ao registro e momentos de maior imprevisibilidade, como as constantes quebras explícitas nas canções de Pure Heroine ou as batidas destacadas de Perfect Places, Supercut e todo o fino repertório apresentado em Melodrama.

Não por acaso, dos poucos momentos em que perverte essa estrutura, Lorde revela algumas das melhores composições do disco. É o caso de Secrets from a Girl (Who’s Seen it All), faixa em que reflete sobre o próprio amadurecimento, prova de novas possibilidades e ainda estreita a relação com Robyn, dona das vozes que ecoam nos minutos finais da canção. O mesmo acontece com Mood Ring, música em que evoca Natalie Imbruglia, fala sobre pseudo-espiritualidade e falso bem-estar, e ainda conta com coros de vozes de Phoebe Bridgers e Clairo, colaboradoras em outras criações ao longo da obra. São momentos de maior euforia e evidente ruptura criativa, mas que parecem incapazes de romper com a forte morosidade e ritmo arrastado que pouco a pouco consome o disco.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.