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Crítica

Tuyo

: "Chegamos Sozinhos Em Casa"

Ano: 2021

Selo: Independente

Gênero: R&B, Soul, Pop

Para quem gosta de: Mahmundi e Bruna Mendez

Ouça: O Jeito é Ir Embora, Sem Mentir e Pra Curar

8.0
8.0

Tuyo: “Chegamos Sozinhos Em Casa”

Ano: 2021

Selo: Independente

Gênero: R&B, Soul, Pop

Para quem gosta de: Mahmundi e Bruna Mendez

Ouça: O Jeito é Ir Embora, Sem Mentir e Pra Curar

/ Por: Cleber Facchi 07/06/2021

Poucos artistas souberam como aproveitar tão bem a atenção que lhes foi dada quanto os membros da Tuyo. Passado o lançamento do primeiro trabalho de estúdio, Pra Curar (2018), a banda composta pelas irmãs Lio e Lay Soares e Jean Machado decidiu mergulhar em uma série de colaborações com diferentes representantes da cena brasileira. São nomes como Baleia, Bruna Mendez, 1LUM3, Luiza Brina, Terno Rei e tantos outros artistas que encontraram nas vozes do trio curitibano um importante componente criativo. Entre as brechas dessas colaborações, um minucioso processo de composição e imersão com o conterrâneo Gianlucca Azevedo (Fresno, Jean Tassy), parceiro de longa data do grupo e co-produtor do fino repertório que embala as canções de Chegamos Sozinhos Em Casa (2021).

Evidente ponto de amadurecimento na carreira do trio, o registro de nove faixas nasce como um acumulo natural de tudo aquilo que a banda paranaense tem incorporado nos últimos anos. São fragmentos que preservam a mesma melancolia e base reducionista que acompanha a Tuyo desde o introdutório Pra Doer EP (2017), porém, partindo de um refinamento lírico e instrumental que se estende até a derradeira Toda Vez Que Eu Chego Em Casa, brilhante encontro com o pianista carioca Jonathan Ferr. Um misto de passado e presente, dor e libertação, produto direto das angústias e conflitos sentimentais vividos por cada integrante, mas que em nenhum momento deixa de dialogar com o ouvinte, indicativo do completo domínio do grupo em relação ao próprio trabalho.

A principal diferença em relação aos antigos registros da banda, em essência consumidos por uma esperança quase cega – “Te esperando / Feito cachorro / Com esperança de reencontrar o dono / Que morreu atropelado na porta do terminal” –, sobrevive no evidente desejo de mudança. São canções que falam sobre a necessidade de seguir em frente e permanente busca por libertação, exorcizando demônios de um passado ainda recente. Exemplo disso acontece no que talvez seja uma das principais faixas do disco, O Jeito É Ir Embora. “Então o jeito é ir embora / Pegar as coisas e ir embora / Me despedir e ir embora / Te abraçar e ir embora“, cresce a letra da canção que oscila entre momentos de maior melancolia e versos sóbrios, talvez inimagináveis no contexto de Pra Curar.

A própria música de abertura do disco, Vitória Vila Velha, sustenta uma poesia contemplativa e madura, indicando parte do caminho percorrido pela banda ao longo da obra. “Passei pela ponte e vi por cima dela / O que quase ninguém viu … Cheguei no meu lugar / Todo mar que passa ali é diferente“, reflete. São letras marcadas pela temática do autoconhecimento, como um passo além em relação aos temas sentimentais e angústias vividas no disco anterior. Mesmo quando tende à melancolia, como na já conhecida Sem Mentir, sobrevive na construção dos versos uma clareza calejada, típica de um adulto sofredor. “Eu cheguei pra te explicar / Que a vida é um emburrecer / E a culpa é da gente“, canta. Instantes em que a Tuyo preserva e perverte a própria essência.

Claro que essa maior sobriedade na construção dos versos não interfere na produção de músicas marcadas pelo uso de temas românticos, medos e antigas desilusões. E isso fica bastante evidente em Sonho de Lay. Completa pela participação de Luccas Carlos, a canção ganha forma em meio a sentimentos e temas oníricos, estrutura potencializada pelo uso fragmentado das vozes e batidas tortas que mudam de direção a todo instante. O mesmo direcionamento criativo, porém, partindo de uma abordagem ainda mais dolorosa, acaba se refletindo na também colaborativa Pra Curar, parceria com Jaloo. “Nenhuma dor dura pra sempre mas essa chegou pra me desafiar“, cresce o jogo de vozes dobradas que ainda referencia os antigos trabalhos da banda – “Nenhuma dor é pra curar“.

São justamente esses pontos de conexão com o material entregue em Pra Curar que tornam a experiência de ouvir Chegamos Sozinhos Em Casa bastante satisfatória. Uma combinação de conforto e sutil agitação criativa, como se o trio, mesmo imerso em um ambiente particular, fosse capaz de aportar em novos territórios e estreitar a relação com diferentes colaboradores, como Lucas Silveira, da Fresno, em Pronta Pra Cair. Claro que isso não exime a banda de pequenos tropeços, como na anêmica O Que Você Diria Agora, música que parece ofuscada pelo som minucioso que invade o restante da obra, sufocando a voz de Machado, dono de Terminal, uma das principais faixas do disco anterior. Oscilações salientes, mas que em nenhum momento diminuem o alcance e força do registro, capaz de dialogar com o que há de mais doloroso nas experiências vividas por qualquer indivíduo.


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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.