Disco: “El Pintor”, Interpol

/ Por: Cleber Facchi 11/09/2014

Interpol
Post-Punk/Rock/Alternative
http://interpolnyc.com/

Por: Cleber Facchi

De todas as habilidades conquistadas pelo Interpol ao longo dos anos, a do “esquecimento” talvez seja a mais expressiva. Explico: desde que o coletivo nova-iorquino alcançou um som ainda mais comercial em Antics, todo o esforço do grupo comandado por Paul Banks se concentra em replicar a mesma massa de arranjos e temas da obra de 2004, falseando “originalidade”. Um eterno reciclar de experiências refletido de maneira copiosa nos dois último álbuns de estúdio – Our Love to Admire (2007), Interpol (2010) -, reforçado no interior de El Pintor (2014, Matador), mas que sempre passa despercebido pela massa cega (ou surda) que acompanha a banda – encantada com tamanha “novidade” a cada lançamento.

Há quem defenda: “mas esta é a ‘identidade’ da banda. É ‘Pós-Punk‘, impossível fazer algo diferente disso”. Discordo. Existe uma diferença enorme em evoluir a partir de uma mesma estrutura musical e se acomodar de forma preguiçosa dentro dela. Um exemplo? Que tal o The National. Há mais de uma década o grupo de Matt Berninger permanece confortável na mesma base de sons cinzentos e temas “alcóolicos” do primeiro disco, postura renovada (e ampliada) com sutileza a cada álbum de estúdio – vide a evidente separação entre Boxer (2007) e o ainda recente Trouble Will Find Me (2013).

O mesmo acontece com as novatas Cult of Youth e Iceage, bandas inclinadas ao trabalhar contínuo da mesma estrutura musical e responsáveis por projetos muito mais significativos do que os registros lançamentos do Interpol na última meia década. É possível ainda citar a veterana do pós-punk nova-iorquino Swans, tão ativa e mutável hoje quanto há três décadas – vide To Be Kind (2014) -, mas aí seria humilhação.

Todavia, o grande erro do Interpol em El Pintor não está no reciclar de uma antiga essência, mas em plagiar de forma cômoda o próprio trabalho. Como já havia comentado durante o lançamento de Ancient Ways, toda a estrutura do presente álbum se baseia em faixas já apresentadas pela banda. Exagero? Ouça os minutos iniciais de My Blue Supreme e depois volte para Pioneer To The Falls, faixa de abertura de Our Love to Admire (2007). Mais? Ancient Ways e Barricade. São os mesmos riffs, bases e melodias. Os mesmos temas tristes e solos plásticos. A mesma concepção. É fácil ser seduzido por El Pintor, afinal, quem não foi hipnotizado por Antics, a grande “matéria-prima” da presente obra.

Quando digo que a capacidade do “esquecimento” é a mais importante do Interpol, não me refiro apenas ao apagar de memória entre um álbum repetitivo e outro, mas em esquecer do refinamento alcançado pelo coletivo ainda no primeiro álbum de estúdio, Turn on the Bright Lights (2002). Bastam os 3:57 minutos da inicial Untitled para derrubar toda a estrutura fria/previsível do novo disco. Perceba como as guitarras crescem detalhistas e climáticas, a voz de Paul Banks é lentamente trabalhada como um instrumento e a poesia da canção se esquiva com naturalidade de um matemático verso + refrão + verso + refrão + refrão que rege toda a estrutura de El Pintor. O tempo é um componente fundamental dentro do álbum de estreia da banda, postura substituída por um material fabricado, por vezes cru, dentro do repertório do novo disco.

Outro aspecto que diminui ainda mais a expressividade do álbum está na ausência de Carlos D. Mesmo que a presença do ex-baixista já fosse limitada no último trabalho de estúdio da banda, de 2010, é evidente hoje como a linha de baixo projetada pelo instrumentista serviria de barreira para o pop desajustado proposto por Banks e o parceiro Daniel Kessler. Por falar em Kessler, note como o guitarrista corre durante todo o disco, espalhando riffs soltos e solos aleatórios de forma a preencher (sem efeito) as lacunas deixadas pelo antigo parceiro de banda – a repetitiva Same Town, New Story talvez seja o melhor exemplo disso.

Com a chegada de El Pintor, fica comprovado o que já era evidente desde o disco anterior: das bandas que ocuparam Nova York no começo dos anos 2000, o Interpol é a que menos evoluiu e a que mais se acomodou. Questionável é o synthpop “afetado” do The Strokes em Angles (2011), ou mesmo a instabilidade do Yeah Yeah Yeahs pós-It’s Blitz (2009), entretanto, nenhum destes grupos, hoje veteranos, se entregou ao descaso criativo que ocupa a recente obra de Paul Banks e seus companheiros. Tingido de falsa novidade, El Pintor é apenas uma segunda mão de tinta em cima de todas as canções lançadas pelo grupo na última década. Parece algo novo, mas não é.

 

El Pintor (2014, Matador)

Nota: 5.0
Para quem gosta de: Paul Banks, Kings Of Leon e Foster The People
Ouça: Breaker 1

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.