Os 50 Melhores Discos Nacionais de 2017 [10-01]

/ Por: Cleber Facchi 19/12/2017

 

Hip-Hop, pop, R&B, rock, samba e pitadas de música eletrônica abastecem a nossa seleção com Os 50 Melhores Discos Nacionais de 2017. São trabalhos lançados entre janeiro e dezembro deste ano que deixaram sua marca na produção brasileira. Um resumo detalhado de tudo aquilo que foi explorado por diferentes representantes da cena nacional, veteranos ou mesmo novatos da nossa música atuantes nos mais variados estados. Aproveite para ver outras listas do nosso especial de final de ano com Os Melhores de 2017.

 

#10. Linn da Quebrada
Pajubá (Independente)

Ser bicha não é só dar o cu / É também poder resistir“. Ainda que protegida sob um manto de comicidade, difícil ouvir os versos da atmosférica Talento, faixa de abertura do primeiro álbum em carreira solo de Linn Da Quebrada, Pajubá, e não perceber o aspecto contestador que sutilmente invade essa e outras composições. Trata-se de uma obra de enfrentamento. Um espaço onde putas, bichas, travestis, negros, mulheres e outros grupos marginalizados ganham destaque (e voz) a todo instante, crescendo em meio ao ambiente dominado pela forte erotização detalhada na poesia urbana da rapper. Perfeita combinação entre humor e crítica social, Pajubá — “linguagem de resistência, construída a partir da inserção de palavras e expressões de origem africanas ocidentais” e adotada pela comunidade LGBT —, nasce como uma clara continuação do material apresentado há poucos meses durante o lançamento de músicas como Bixa Preta e Mulher. Composições que se aprofundam no debate sobre gênero (Bixa Travesty), questionam a fragilidade masculina (Transudo), exploram preconceito e religiosidade (Submissa do 7° Dia), além de mergulhar e temas próprios do universo gay (Coytada, Enviadescer). Leia o texto completo.

 

#09. Giovani Cidreira
Japanese Food (Blaclava Records / Natura Musical)

É necessário tempo até absorver o primeiro álbum de estúdio do cantor e compositor baiano Giovani Cidreira. Na contramão de outros registros próximos, o músico, ex-integrante do grupo Velotroz, faz de cada instante dentro da estreia em carreira solo um curioso experimento. Ideias que passeiam pela obra do Clube da Esquina, mergulham no pós-punk de artistas como The Fall e The Smiths, passeiam pelo pop rock de grupos como Legião Urbana e ainda crescem de forma a dialogar com o mesmo rock confessional de novatos como Mac DeMarco e outros compositores recentes. De essência curiosa, Japanese Food flutua entre o passado e o presente de forma a bagunçar a interpretação do ouvinte. Se em instantes as guitarras e distorções de Movimento da Espada aproximam o ouvinte de algum lugar no começo dos anos 1980, bastam os arranjos melódicos e a voz forte de Um Capoeira para mergulhar o público em um universo completamente distinto, por vezes íntimo da mesma psicodelia que alimentou a obra de Milton Nascimento em grande parte dos anos 1970. Leia o texto completo.

 

#08. Kiko Dinucci
Cortes Curtos (Independente)

Ele é mais filme do que disco, ouça numa tacada só, ouça em volume alto se for possível”, escreveu Kiko Dinucci no texto de lançamento de Cortes Curtos. Produzido em um intervalo de apenas quatro dias, em setembro do último ano, o primeiro registro em carreira solo do cantor e compositor paulistano cresce como um imenso bloco de ruídos, gritos, histórias e personagens. Uma versão caótica, naturalmente punk, do mesmo universo conceitual que Dinucci vem desbravando em projetos como Metá Metá e demais registros colaborativos na última década. Pensado sob a ótica de uma película cinematográfica, Cortes Curtos se revela como uma verdadeira coleção de imagens sonoras. Fragmentos visuais, narrativos e acústicos que observam diferentes aspectos da cidade de São Paulo, seus habitantes e toda uma sequência de acontecimentos mundanos. Personagens como a musa romantizada em A Morena do Facebook (“Ela é mais bonita que a foto do perfil / Enquanto se aproxima / Com seu andar macio”), ou mesmo o conflito preconceituoso que explode na descritiva Uma Hora da Manhã (“O que você tá falando de nordestino? Sou nordestina sim, com muito orgulho”). Leia o texto completo.

 

#07. Djonga
Heresia (Ceia Ent.)

Respire fundo. Tome fôlego. Você vai precisar. Em avalanche de rimas tortas, batidas secas, ataques que não poupam ninguém e reflexões sóbrias sobre o cotidiano de qualquer grande cidade, o mineiro Djonga faz do novo álbum em carreira solo, Heresia, uma obra necessária. Letras que atravessam a periferia, discutem racismo, drogas, sexo e criminalidade sem necessariamente tropeçar no óbvio. Uma extensão madura de tudo aquilo que o rapper vem produzindo desde a estreia com O Bom Maluco ou mesmo em parceria com o coletivo DV Tribo. Urgente, o trabalho de dez faixas se revela logo nos primeiros minutos. Da hipocrisia e corrupção pessoal escancarada nos versos de Corre nas Notas (“Esses manos são de dar dó / Mais falsos que Fábio Assunção parar de cheirar pó / Mais falsos que broxar pela primeira vez“), passando pela poesia caótica de Entre o Código da Espada e o Perfume da Rosa (“Sigo frio tipo a noite no Saara ó / A vida é um filme de terror / Sem diretor, sem tempo pra ensaiar / Eu tô num filme de terror“), Djonga passeia por diferentes histórias, cenas e personagens sem necessariamente manter o foco em um tema específico. Leia o texto completo.

 

#06. Letrux
Letrux Em Noite de Climão (Joia Moderna)

Que engraçado / Sobrou tão pouco / Que tragédia / Foi tudo tanto / Que engraçado / Cê não tá louco / Que tragédia / Eu tô um pouco”. A soturna introdução de Vai Render, faixa de abertura de Letrux Em Noite de Climão, pinta um curioso (e dramático) quadro do universo romântico, dançante e entristecido que abastece o primeiro álbum de Letícia Novaes em carreira solo. Entre sorrisos falsos, versos marcados pela libertação, ironia e sussurros eróticos, um convite a mergulhar nas pistas de dança. Primeiro registro de inéditas da cantora desde o doloroso Estilhaça (2015), último trabalho como integrante do Letuce – projeto montado em parceria com o ex-marido, o músico Lucas Vasconcellos –, o álbum de melodias sintetizadas e forte diálogo com a década de 1980 olha para o passado sem necessariamente parecer datado ou pouco inventivo. Canções de amor, tormentos e personagens que se cruzam em um cenário montado especialmente para a voz e o canto versátil de Novaes. Leia o texto completo.

 

#05. Rincon Sapiência
Galanga Livre (Boia Fria Produções)

Estranho pensar em Galanga Livre como o primeiro trabalho de estúdio do paulistano Rincon Sapiência. Basta voltar os ouvidos para a última década e perceber nuances da poesia urbana do artista em diferentes projetos. Da participação no brilhante Non Ducor Duco (2008), de Kamau, passando pela colaboração em obras abertas ao grande público, caso de Projeto Paralelo (2010), do grupo paulistano NX Zero, ou mesmo o recente Oceano (2016), de Nego E, não faltam obras que contam com a forte interferência do rapper. Desse universo de experiências acumuladas e pequenas colaborações nasce o primeiro registro oficial do artista. Trata-se de uma obra “ancorada” no conto Ambrósio, trabalho que narra história de Galanga, escravo responsável pelo assassinato de um senhor de engenho. Um criativo ponto de partida para a formação de histórias marcadas pelo empoderamento da comunidade negra, debates sobre racismo, libertação, conquistas e relacionamentos que abastecem o trabalho do primeiro ao último verso. Leia o texto completo.

 

#04. Mallu Magalhães
Vem (Sony Music)

Os últimos seis anos foram bastante produtivos (e corridos) para Mallu Magalhães. Passado o lançamento do maduro Pitanga, trabalho entregue ao público em setembro de 2011, a cantora e compositora paulistana acabou mudando-se para a capital Lisboa, em Portugal. Nesse processo, casou-se com o parceiro de longa data, o músico Marcelo Camelo (Los Hermanos), com quem produziu o primeiro álbum como parte do trio Banda do Mar, projeto completo pelo baterista Fred Ferreira, e ainda viu florescer a própria maternidade com o nascimento da primeira filha, a pequena Luísa, de um ano e maio. Com a chegada de Vem, primeiro registro autoral em seis anos, Magalhães atravessa o Atlântico e parece redescobrir com naturalidade a música brasileira. São 12 composições que passeiam por elementos do samba (Você Não Presta), bossa nova (Casa Pronta) e referências à Jovem Guarda, vide o soul-rock que cresce em Será Que Um Dia, música que poderia facilmente ter sido gravada por Roberto Carlos no final dos anos 1960. Um colorido nacional que se reflete na quase totalidade dos versos em português e pequenos refúgios poéticos que apontam para a formação de paisagens reais (Guanabara, São Paulo). Leia o texto completo.

 

#03. Xênia França
Xenia (Independente)

Entre tambores e ambientações tribais que conversam com a música produzida em território africano, versos marcados pela forte religiosidade, flertes com o jazz, diálogos com a cultura Iorubá e confissões intimistas, Xênia França abre as portas do primeiro álbum em carreira solo. Cinco ou mais décadas de referências musicais (e históricas) que se dobram de forma a atender à poesia minuciosa da cantora baiana, como uma madura extensão de tudo aquilo que vem sendo explorado pela artista nos últimos trabalhos como integrante do coletivo paulistano Aláfia. Obra de enfrentamento,  Xenia carrega nos versos da inaugural Pra Que Me Chamas? um profundo debate sobre apropriação cultural, detalhando parte do território poético desbravado pela cantora ao longo do disco. “De vez em quando / Um abre a boca / Sem ser oriundo / Para tomar pra si / O estandarte / Da beleza, a luta e o dom / Com um papo / Tão infundo“, canta enquanto a percussão forte ocupa todas as brechas da faixa, transportando França para o mesmo universo de outros representantes do Afro Pop – sejam eles nacionais ou estrangeiros. Leia o texto completo.

 

#02. Baco Exu do Blues
Esú (Independente)

Caos urbano, religiosidade, tormentos e conflitos pessoais. É necessário tempo até perceber (e absorver) todas as nuances, referências vindas de diferentes campos culturais, credos e experiências intimistas que marcam o primeiro álbum do baiano Diogo Moncorvo como Baco Exu do Blues, Esú(2017, Independente). Uma obra montada a partir de pequenos excessos e delírios pessoais, como uma representação particular da figura mitológica que o rapper original de Salvador, Bahia, sustenta como parte da própria identidade criativa. Nascido de pequenas conexões que passam por elementos cultura Iorubá, esbarram na música negra de Chico Science e Nação Zumbi, Tim Maia e Racionais MC’s, detalham citações literárias (Jorge Amado) e cinematográficas (Pedro Almodóvar), o trabalho de essência anárquica cresce como uma obra muito maior do o mero conjunto de dez faixas parece resumir. O próprio título da obra – um provocativo jogo de palavras entre “Jesus” e “Exu” –, indica o propositado escárnio e versatilidade de Moncorvo, postura reforçada durante toda a execução da obra. Leia o texto completo.

 

#01. Tim Bernardes
Recomeçar (Risco)

Eu quis mudar / E isso implicava em deixar para trás / Meu chão, meu conforto, o certo, a paz / Eu fui a procura de mais“. Ainda que existam diferentes formas de interpretar e encaixar a poesia libertadora de Quis Mudar, terceira faixa do primeiro álbum em carreira solo de Tim Bernardes, Recomeçar (2017, Risco), não há como negar que sobrevive ali um perfeito resumo do novo posicionamento do cantor e compositor paulistano. Uma ruptura sutil, como um breve distanciamento do material que vem sendo explorado pelo artista na curta discografia d’O Terno, projeto em que atua como guitarrista/vocalista desde o início da presente década. Para além de possíveis burburinhos, o trabalho como integrante da banda paulistana segue sem interrupções, ainda embalado pelo maduro acabamento do recente Melhor Do Que Parece (2016), terceiro registro de inéditas do grupo. Trata-se de apenas de uma curva leve na carreira de Bernardes, como um convite a explorar as angústias e conflitos particulares do cantor, dificilmente externadas em um projeto coletivo. Versos dotados de uma poesia grandiosa, mesmo na delicada tapeçaria instrumental que amarra cada composição. Leia o texto completo.

 

     

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.