Disco: “Tyranny”, Julian Casablancas + The Voidz

/ Por: Cleber Facchi 03/10/2014

Julian Casablancas + The Voidz
Alternative/Indie/Synthpop
http://juliancasablancas.com/

Por: Cleber Facchi

“It’s hard to write good lyrics that are meaningful. It’s hard to not write bad lyrics and fake it and have a meaningless thing that sounds cool. That move you on a deep level and have a deep meaning but just sound good and you can enjoy lightly.”

Poucas vezes Julian Casablancas me pareceu tão sóbrio quanto no diálogo travestido de entrevista para a Time Out. Ao lado de Karen O, que na ocasião divulgava o recém-lançado Crush Songs (2014), o vocalista do Strokes ressaltou a dificuldade em escrever boas composições – “It’s the hardest thing” -, discutiu Thom Yorke e Radiohead, comentou de forma nostálgica a cena de Nova York nos anos 2000 e, acima de tudo, conseguiu transmitir ao público a própria maturidade – postura talvez esquecida pelo “rosto de bebê” que o músico ostenta desde a estreia de Is This It, há 13 anos.

Maturidade. Difícil não fazer uso de tal palavra quando falamos sobre o trabalho de Casablancas na última década e meia. Ataquem ou defendam seus favoritos, mas músico é autor (ou participante ativo) de pelo menos duas obras clássicas – Is This It (2001) e Room On Fire (2003) -, um bem resolvido trabalho solo – Phrazes for the Young (2009) -, três registro medianos – First Impressions of Earth (2006), Angles (2011) e Comedown Machine (2013) -, além de uma série de faixas em parceria – de Daft Punk a Sparklehorse. Nada que pareça “detestável” ou “inaudível” como tantos já foram capazes de revelar em um mesmo período de tempo.

Ma-tu-ri-da-de. Com tantos atributos positivos, vasta experiência em estúdio, apresentações nos quatro cantos do globo, contatos e a capacidade de esculpir a frase tocante que abre texto, pergunto: Qual o propósito de Julian Casblancas com Tyranny?

Em uma observação atenta sobre o primeiro trabalho do cantor ao lado dos parceiros do The Voidz, talvez a resposta mais urgente seja: “provocar”. Entretanto, não há nada no disco que realmente consiga alcançar este objetivo, afinal, Tyranny está longe de ser um disco experimental ou minimamente provocador. Apenas um ruído inofensivo. Em uma segunda e ainda mais atenta observação, talvez voltasse ao mesmo discurso de quando analisei Human Sadness, no começo de setembro: “Casablancas quer testar os limites do próprio público”. Porém, ele já fez isso quando lançou One Way Trigger, há dois anos, provando que mesmo “brincalhão” ou “testando novas fórmulas” sempre terá o público aos próprios pés.

Mas então, qual é o propósito de Julian Casblancas com Tyranny? Ora, não há propósito algum.

Talvez um defensor de Casablancas aponte: “Idiota, não percebe que Tyranny é uma obra que brinca com os clichês, referências e exageros da década de 1980?”. Desculpe, mas Before Today (2010) do Ariel Pink’s Haunted Graffiti chegou quatro anos antes, se esquivou de tamanho exagero e ainda entregou ao público uma das melhores músicas da década – Round and Round. Mesmo os dois últimos trabalhos do Strokes parecem atingir o mesmo “propósito” do presente disco de forma muito mais satisfatória. Se ouvir o álbum com atenção, não é difícil perceber que músicas como Business Dog e Crunch Punch não passam de versões descartadas do material apresentado em Comedown Machine.

Por falar em Crunch Punch, talvez a canção seja o maior exemplo do quanto Julian se esforçou para estragar Tyranny – sim, estragar. Perceba como em todo o trabalho assertivos gracejos melódicos – como as vozes em Human Sadness -, guitarras bem solucionadas – Where No Eagles Fly e Business Dog – e toda uma série de elementos favoráveis são propositadamente esmagados, fazendo do disco a melhor aula de como destruir uma boa canção. De fato, há um pacote cheio de ótimas faixas ao longo do disco. Todas prontas para serem abortadas.

Antes que alguém defenda Tyranny como um disco “descompromissado”, vale lembrar que “descompromissadas” eram as guitarras de The Modern Age, a voz bêbada em Someday e até a letra de Last Night. O que o artista assume com o presente disco é apenas um material preguiçoso, um ato poser, como se debochasse do próprio ouvinte. Pergunto: se não fosse pelo nome de “Julian Casablancas” e o título de “vocalista dos Strokes”, será que alguém daria tanta importância para Tyranny?

Entenda, ninguém precisa de um novo Is This It. Seria um erro ver o músico regressar ao mesmo som de Room Of Fire, First Impressions of Earth ou mesmo do próprio Phrazes for the Young. O problema está em falsear experimento e “complexidade” com um trabalho visivelmente preguiçoso.

Quer 62 minutos de ruídos aleatórios, sintetizadores sujos e vozes fora de ritmo? Ora, vá ao ensaio da banda de garagem do seu vizinho. Com U$ 3,87 (preço do disco) você ainda compra instrumentos de plásticos e se diverte vendo seu primo mais novo “tocar”. Não esqueça: você está na internet, o lugar onde pode ouvir, comprar ou baixar de graça Suicide, Lou Reed, The Modern Lovers, Sonic Youth e todos os artistas que este disco tenta emular. Ficou encantado(a) com o “som estranho” do trabalho? Ora, busque por mais – comece pelos artistas citados ao longo do texto. Em Tyranny, Julian Casablancas é apenas o floco de neve sob um imenso iceberg de obras realmente capazes de bagunçar a cabeça do ouvinte.

 

Tyranny (2014, Cult)

Nota: 0.0
Para quem gosta de: The Strokes, MGMT e The Killers
Ouça: todos as bandas linkadas no texto

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.