Os 50 Melhores Discos Internacionais de 2019 [20-11]

/ Por: Cleber Facchi 02/01/2020

Do pop de câmara de Weyes Blood ao lirismo confessional de Lana Del Rey, do pop nostálgico de Carly Rae Jepsen e Clairo, ao experimentalismo de FKA Twigs e Holly Herndon, é hora de relembrar alguns dos principais trabalhos lançados no último ano. Nos comentários, compartilhe com a gente: qual é o seu disco favorito de 2019?


#20. Jessica Pratt
Quiet Signs
(2019, Mexican Summer / City Slang)

Em uma primeira audição, Quiet Signs (2019, Mexican Summer / City Slang) talvez seja apenas mais um em meio a tantos outros registros embriagados pelo cancioneiro norte-americano dos anos 1970. Da composição dos arranjos ao uso delicado da voz, sempre econômica, cada elemento do terceiro e mais recente álbum de estúdio de Jessica Pratt parece seguir a trilha de veteranas do gênero, como Joni Mitchell, Karen Dalton ou mesmo a britânica Vashti Bunyan. Um emular de velhas possibilidades e melodias que vem sendo aprimorado sem pressa, desde o homônimo debute da cantora e compositora californiana. A principal diferença em relação ao presente disco e toda a sequência de obras entregues por Pratt nos últimos anos, principalmente o antecessor On Your Own Love Again (2015), está na forma como a artista de São Francisco parece brincar com os espaços dentro de cada canção. De fato, o silêncio é parte substancial do som produzido em Quiet Sings. Do momento em que tem início, na instrumental Opening Night, perceba como a musicista estabelece pequenas brechas e respiros pontuais, arrastando o ouvinte para dentro de um trabalho marcado pela minúcia, esmero que força uma audição atenta até o último instante do álbum, em Aeroplane. Leia o texto completo.

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#19. James Blake
Assume Form
 (2019, Polydor)

“Você está apaixonado?”, pergunta James Blake em um dos momentos de maior entrega e confissão romântica em Assume Form (2019, Polydor). Ainda que o questionamento pareça dialogar com os sentimentos e experiências do próprio ouvinte, do momento em que tem início, na autointitulada música de abertura (“Quando você me toca, eu me pergunto: ‘o que você quer comigo?’“), até alcançar a derradeira Lullaby For My Insomniac (“Vou ficar acordado também / Eu prefiro ver tudo como um borrão amanhã“), declarada homenagem à namorada Jameela Jamil, atriz em The Good Place, cada elemento do presente álbum se relaciona diretamente com as principais emoções e vivências recentes do produtor britânico. A principal diferença em relação aos últimos trabalhos do cantor, principalmente o extenso The Colour in Anything (2016), está no sutil distanciamento da poesia melancólica que há tempos parecia orientar as canções do músico inglês. “Eu pensei que poderia estar melhor morto, mas eu estava errado / Eu pensei que tudo poderia desaparecer, mas eu estava errado / Eu pensei que nunca encontraria o meu lugar, mas eu estava errado … Vamos para casa falar merda sobre todo mundo / Vamos para casa, finalmente“, canta de forma libertadora em Power On, composição que celebra a força transformadora de um novo relacionamento de forma positiva, quase sorridente. Leia o texto completo.

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#18. Beyoncé
Homecoming: The Live Album
(2019, Parkwood / Columbia)

Homecoming: The Live Album (2019, Parkwood / Columbia) está longe de ser encarado como um simples produto da elogiada performance de Beyoncé durante o Coachella de 2018. Trata-se de um verdadeiro fenômeno. Um registro documental, sonoro e estético daquela que é a maior artista viva do nosso tempo. Concebido em um intervalo de oito meses, com metade desse período dedicado exclusivamente ao ensaio das coreografias, composição dos arranjos e formação da identidade visual, o trabalho reflete não apenas o completo refinamento artístico da cantora, como assume a função de um importante fragmento cultural para a comunidade negra dos Estados Unidos. Inspirado de maneira confessa nas apresentações de fanfarras organizados pelas Faculdades e Universidades Historicamente Negras – no original, Historically Black Colleges and Universities –, Homecoming sintetiza o desejo da artista em conceber um espetáculo a partir do encontro entre jovens negros vindos de diferentes campos do país. São bailarinos, uma orquestra de metais, percussionistas e uma banda de apoio formada apenas por mulheres. Um precioso (e necessário) exercício de representatividade que amplia tudo aquilo que a cantora havia explorado durante o lançamento de seu último álbum de estúdio, o excelente Lemonade (2016). Leia o texto completo.

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#17. Brittany Howard
Jaime
(2019, ATO)

Brittany Howard sempre tratou dos próprios sentimentos como um estímulo natural para a composição de cada novo trabalho de estúdio. Seja como integrante do Alabama Shakes, com quem lançou dois ótimos álbuns de inéditas — Boys & Girls (2012) e Sound & Color (2015) —, ou na crueza de Thunderbitch (2015), primeiro registro da banda de mesmo nome que aporta em novos territórios criativos, tudo que se relaciona com a obra da cantora e compositora norte-americana utiliza de experiências particulares como um componente central para a formação dos versos. Melancolia e libertação, dor e entrega romântica, proposta que ganha ainda mais destaque nas canções de Jaime (2019, ATO). Primeiro álbum de Howard em carreira solo, o registro que conta com produção, versos e arranjos assinadas inteiramente pela artista, encontra em memórias da infância e inquietações existencialistas a base para cada uma das canções que recheiam o trabalho. Com título e parte das letras inspiradas pela irmã da cantora, morta ainda na adolescência,  Jaime estabelece em cada criação um exercício de profunda entrega sentimental. É possível sentir a dor e a alegria da compositora a cada novo fragmento do disco, como um versão ampliada de tudo aquilo que a musicista havia testado em Sound & Color. Leia o texto completo.

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#16. Nilüfer Yanya
Miss Universe
(2019, ATO)

Ansiedade, depressão, medo e abandono. Esses são alguns dos principais temas que vem sendo explorados pela cantora e compositora Nilüfer Yanya desde o início da carreira. São reflexões melancólicas sobre a vida adulta que sutilmente apontam para diferentes campos da música, estrutura evidente no refinamento instrumental e poético de algumas das principais criações da artista inglesa, como Baby Luv e, principalmente, Thanks 4 Nothing. Um doloroso exercício de libertação, detalhamento lírico e exposição sentimental, estrutura que serve de base para o primeiro álbum de estúdio da cantora, Miss Universe (2019, ATO). Concebido em um intervalo de poucos meses, o trabalho que conta com co-produção de Will Archer (Jessie Ware, Vondelpark) utiliza de uma estrutura conceitual para explorar algumas das principais inquietações e conflitos particulares de Yanya. Como indicado logo na abertura do disco, parte expressiva da obra se passa em uma central de atendimento da WWAY HEALTH TM, clínica fictícia para o tratamento de transtornos mentais. “Estamos aqui por você. Nos importamos com você. Você não precisa se preocupar: a gente se preocupa por você“, reforça a voz da atendente que parece confortar o ouvinte. Leia o texto completo.

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#15. Bon Iver
i, i
 (2019, Jagjaguwar)

Com a boa repercussão em torno do primeiro álbum de estúdio da carreira, For Emma, Forever Ago (2007), Justin Vernon poderia facilmente se perder em uma espiral de autoplágio, brincando com as ideias em uma permanente reciclagem de versos entristecidos e melodias acústicas, direcionamento adotado por Iron & Wine, The Tallest Man on Earth e outros tantos personagens que surgiram no mesmo período. Entretanto, como indicado durante a produção de Blood Bank EP (2009), cada novo registro de inéditas entregue pelo cantor e compositor estadunidense parecia transportar o ouvinte para um novo e sempre inusitado território criativo. Em i, i (2019, Jagjaguwar), quarto e mais recente álbum de estúdio do músico como Bon Iver, não poderia ser diferente. Fim do ciclo temático que teve início do inverno de For Emma, Forever Ago, passa pela primavera do autointitulado registro de 2011, e cresce no verão delirante de 22, A Million (2016), o trabalho co-produzido em parceria com Chris Messina e Brad Cook encontra na lenta desconstrução das ideias a base para um registro que muda de forma a cada nova audição. São fragmentos de vozes, arranjos atmosféricos e orquestrações pontuais que encolhem e crescem a todo instante, como uma versão remodelada e deliciosamente estranha de tudo aquilo que o músico norte-americano vem experimentando desde o início da carreira. Leia o texto completo.

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#14. Caroline Polachek
Pang
 (2019, Perpetual Novice)

Desejo e melancolia, dor e libertação. Em Pang (2019, Perpetual Novice), primeiro álbum de Caroline Polachek em carreira solo, cada fragmento do disco encontra em memórias e experiências particulares da artista nova-iorquina um natural estímulo para a composição dos versos. “Você tem um jeito de olhar quando me deseja / É como uma bela faca, posicionada exatamente onde o medo deveria estar“, confessa logo nos primeiros minutos do trabalho, na canção que dá título a obra. Uma seleção de poemas provocativos, sempre intimistas, como se do material entregue pela cantora em sua antiga banda, o Chairlift, Polachek fosse além, cuidado que se reflete até a faixa de encerramento do disco, a sensível Parachute. Sequência ao material entregue em Arcadia (2014), primeiro álbum com o pseudônimo de Ramona Lisa, além, claro, do atmosférico Drawing the Target Around the Arrow (2017), lançado sob o título de CEP, Pang nasce como um evidente ponto de equilíbrio entre o experimentalismo anteriormente testado pela artista e o pop nostálgico que marca a curta discografia do Chairlift. Canções que bebem do som empoeirado da década de 1980, vide a forte similaridade com a obra de Madonna e Stevie Nicks, em So Hot You’re Hurting My Feelings, porém, sempre apontando para o presente, como um diálogo involuntário com a obra de Carly Rae Jepsen, Charli XCX e outros nomes de destaque do gênero. Leia o texto completo.

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#13. Tyler, The Creator
IGOR
 (2019, Columbia)

Você pode esperar por qualquer coisa de Tyler, The Creator, menos o óbvio. Prova disso está nas canções de IGOR (2019, Columbia), sexto e mais recente álbum de estúdio do rapper californiano. De essência conceitual, como tudo aquilo que vem sendo produzido pelo artista desde a estreia com Bastard (2009), o trabalho centrado em um conjunto específico de personagens parte da descoberta do amor para mergulhar em um relacionamento obsessivo e doentio, narrativa que segue até o último instante da obra, quando o eu lírico precisa se conformar com o fato que deixou de ser amado, restando apenas a amizade e o inevitável distanciamento entre os indivíduos. Não por acaso, o rapper decidiu lançar o trabalho na íntegra, evitando a divulgação de músicas isoladas, direcionamento que naturalmente força uma audição atenta por parte do ouvinte, do primeiro ao último instante da obra. “Não espere por um álbum de rap. Não espere qualquer álbum. Apenas vá, se jogue nele. Eu acredito que a primeira audição funciona melhor de forma ininterrupta, sem pulos. De frente para trás“, explicou em um texto de lançamento sobre o registro, no Twitter. É como se o artista revelasse ao público uma narrativa quase cinematográfica, conceito reforçado logo na imagem de capa do disco, com uma estética típica de clássicos do horror nos anos 1960 e 1970 e a assinatura formal, como a de um diretor – “todas as canções escritas, produzidas e arranjadas por Tyler Okonma“. Leia o texto completo.

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#12. Nick Cave & The Bad Seeds
Ghosteen
 (2019, Bad Seed)

Imersa em melodias atmosféricas e arranjos sempre precisos, a poesia de Nick Cave sutilmente oculta uma força descomunal. Em Ghosteen (2019, Bad Seed), terceiro e último capítulo da melancólica trilogia iniciada em Push the Sky Away (2013), cada fragmento do disco parece pensado para se relacionar com o que há de mais doloroso nas experiências particulares e conflitos sentimentais de qualquer indivíduo. São frações poéticas que discutem a efemeridade da vida, desilusões amorosas e, principalmente, nossa relação com a morte, conceito que tem sido explorado pelo cantor e compositor australiano desde o material entregue no antecessor Skeleton Tree (2016), obra fortemente influenciada pela morte precoce de um de seus filhos. “Todo mundo está perdendo alguém / É um longo caminho para alcançar a paz de espírito / E eu estou apenas esperando agora, pela minha hora / E eu estou apenas esperando agora, pela paz que está por vir“, confessa na derradeira Hollywood, canção em que utiliza de referências a um conto budista para discutir não apenas a morte do próprio filho, mas a de outras pessoas próximas, como o músico Conway Savage (1960 – 2017), integrante do The Bad Seeds com quem vinha colaborando desde o início dos anos 1990. Um lento desvendar de ideias e experiências sentimentais que machuca e conforta na mesma proporção, experiência que reflete durante toda a execução da obra.

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#11. Jamila Woods
Legacy! Legacy!
(2019, Jagjguwar)

Seja como integrante do coletivo The Social Experiment, com quem lançou o ótimo Surf (2015); em colaborações com Chance The Rapper, vide o encontro em Coloring Book (2016) ou mesmo em registros autorais, caso do excelente Heavn (2016), Jamila Woods sempre soube como condensar algumas de suas principais referências de forma particular, como um complemento direto à composição dos arranjos e versos. Nada que se compare ao material entregue no segundo álbum de estúdio da artista de Chicago, Legacy! Legacy! (2019, Jagjguwar), uma colorida colcha de retalhos conceituais que aponta para diferentes campos das artes e personagens que influenciaram criativamente o trabalho da cantora. A principal diferença em relação a tantos outros registros que parecem dançar pelo tempo, coletando ideias e referências pontuais, está na forma como Woods utiliza de elementos do passado, citações e obras específicas para dialogar com o presente. Exemplo disso está em Zora. Inspirada pela obra da escritora e poetisa afro-americana Zora Neale-Hurston (1891 – 1960), a canção utiliza de elementos da obra How It Feels To Be Colored Me (1928) para discutir o privilégio branco e a repressão sofrida diariamente pela população preta. “Nenhum de nós é livre, mas alguns de nós são corajosos / Eu posso ser pequeno, eu posso falar suave, mas você pode ver a mudança na água / Você nunca saberá tudo, tudo / Eu nunca saberei tudo, tudo“, reflete em um misto de canto e rima, estrutura que naturalmente faz lembrar o trabalho de veteranas como Erykah Badu e Ms. Lauryn Hill. Leia o texto completo.

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Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.

Jornalista, criador do Música Instantânea e integrante do podcast Vamos Falar Sobre Música. Já passou por diferentes publicações de Editora Abril, foi editor de Cultura e Entretenimento no Huffington Post Brasil, colaborou com a Folha de S. Paulo e trabalhou com Brand Experience e Creative Copywriter em marcas como Itaú e QuintoAndar. Pai do Pudim, “ataca de DJ” nas horas vagas e adora ganhar discos de vinil de presente.